Reportagens inesquecíveis
Pedro
J. Bondaczuk
Uma das ramificações
literárias que mais aprecio é a das chamadas “livros-reportagens”. Ou seja,
quando bem escritos, são misto de jornalismo e de literatura. A lógica indica
que esse tipo de obra compete a jornalistas. Nem sempre, contudo, é o que
acontece.
Muitas vezes, pessoas
que não exercem e nunca exerceram essa nobre profissão (desculpem a falta de
modéstia) e que nem mesmo são escritoras, produzem livros-reportagens
magníficos. Descobrem, ao longo do processo de produção, que sabem escrever, e
bem.
Claro que quando
escritos por jornalistas tendem a ser tecnicamente mais perfeitos. Melhores se
tornam ainda se o autor, além de jornalista, for também escritor. É o caso, por
exemplo, de “Soledad no Recife”, de Urariano Mota. Mas há livros-reportagens
escritos por quem não domina nenhuma das duas técnicas (a jornalística e a
literária) e que, ainda assim, caem no gosto do público e se tornam
best-sellers.
Um desses casos é “2455
– Cela da Morte”, de Caryl Chessman, que entre o final dos anos 50 e início dos
60 do século passado, vendeu milhões de exemplares, mundo afora, e foi,
inclusive, estrondoso sucesso de vendas no Brasil. Os leitores da minha faixa
etária certamente se lembram disso. Para os que não lembram, faço um breve
resumo do caso.
Caryl Chessman foi
preso em 23 de janeiro de 1948, acusado de ser o então já famoso “Bandido da
Luz Vermelha”. Atribuíram-lhe uma série muito grande de roubos e estupros, em
ataques a casais de namorados, nas colinas que rodeiam Hollywood, em Los
Angeles, na Califórnia. A polícia procurava há muito tempo o autor desses
delitos. Chessman teve a infelicidade de satisfazer à descrição do marginal
feita por várias vítimas.
O apelido “Bandido da
Luz Vermelha” devia-se ao fato de, quando o assaltante abordava suas vítimas,
utilizar-se de uma lanterna com luz vermelha, com a qual cegava suas vítimas antes dos ataques.
Chessman foi julgado e
condenado à morte por um Tribunal do Júri, em que, dos doze jurados, onze eram
mulheres. Durante todo o julgamento, e nos anos posteriores, negou a autoria
dos crimes que lhe foram atribuídos. E permaneceu negando até o dia da sua
execução, ocorrida doze anos e quase cinco meses após ser preso, em 2 de maio
de 1960, na câmara de gás. Nunca admitiu haver cometido aqueles delitos.
Caryl Chessman foi
recolhido à cela de n° 2455, no chamado “corredor da morte”, da Penitenciária
de San Quentin, ala restrita aos condenados à espera da execução. Nesse setor,
raramente algum prisioneiro permanecia por mais de uma semana. Chessman,
todavia, permaneceu por mais de doze anos.
Nesse período, iniciou
uma desesperada batalha para provar inocência e, assim, salvar seu pescoço.
Ali, estudou Direito e assumiu a própria defesa. Interpôs dezenas de recursos e
petições a tribunais da Califórnia e à Suprema Corte dos EUA.
Conseguiu adiar por
sete vezes sua execução, sendo que, em pelo menos quatro, o adiamento ocorreu
minutos antes de ser encaminhado à câmara de gás. O livro “2455 – Cela da
Morte” narra, tim-tim-por tim-tim, todo o caso. Chessman revelou-se um escritor
de talento, com um estilo de fazer inveja a muito escritor profissional. Tanto
que, além desse livro-reportagem, escreveu outros três, que, no entanto, não
tiveram o mesmo sucesso, deste que se tornou best-seller mundial, mas que
venderam bem acima da média.
Prometo trazer,
oportunamente, à baila outros casos famosos, que geraram grandes
livros-reportagens. A maioria foi escrita por jornalistas de inegável talento,
mas vários outros foram produzidos por absolutos leigos, quer em jornalismo,
quer em literatura, como foi o caso de Caryl Chessman.
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
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