Tuesday, June 21, 2016

Testando a responsabilidade



Pedro J. Bondaczuk


O Plano Collor, de combate sem tréguas à inflação, entra, amanhã, numa nova fase, com o abandono da famosa lista da Sunab como instrumento de contenção dos preços. Gêneros como a carne de segunda, o açúcar refinado, o óleo de soja, a margarina, o arroz tipo 2 e o feijão carioquinha ficam liberados.

Doravante, os responsáveis pela comercialização desses produtos vão ser desafiados a mostrar que têm, de fato, responsabilidade e estão prontos para a nova fase de modernização econômica que o governo pretende implantar, com o estabelecimento de uma autêntica economia de mercado.

Teme-se que num primeiro instante, pelo menos, alguém se sentirá tentado a exagerar, a ganhar muito com a nova situação. É um risco que as autoridades terão que correr. Caso ocorra uma eventual explosão de preços em algum desses produtos, a inflação, que em agosto ainda ficou em dois dígitos, ao registrar 10,58% (ligeiramente menor do que a de julho) pode ganhar novo ímpeto, comprometendo os esforços, que não foram poucos, feitos até aqui para a sua contenção.

Mas o secretário nacional da Economia, João Maia, em entrevista à imprensa, mostrou muita tranqüilidade nesse aspecto. Disse que o governo pretende trabalhar com as forças de mercado e não acredita que os gêneros liberados venham a sofrer aumentos abusivos. Tomara que o seu otimismo tenha fundamento.

Riscos de abuso existem e ninguém pode negar. Basta que se recorde o que aconteceu com o cafezinho nesta semana. Todos os bares do Rio de Janeiro passaram a cobrar por ele, na segunda-feira, os mesmíssimos Cr$ 15,00. Ninguém estipulou preço de Cr$ 12,00, Cr$ 13,00 ou Cr$ 14,00. Seria apenas coincidência? Claro que não!

Ficou perfeitamente caracterizada a cartelização. Não se entende esse medo da concorrência de determinados setores econômicos brasileiros. Essa padronização do que se cobra (e sempre para cima, evidentemente), chega a se constituir até num vício fundamente arraigado no comportamento comercial entre nós.

O presidente Collor, em discurso que proferiu na quinta-feira, quando da entrega do prêmio à melhor empresa do ano, outorgado pela revista “Exame”, deixou claro que não existe uma economia de “meio-mercado”. Ou ela é livre, ou não é. E esse segundo tipo mostrou-se absolutamente inadequado. A tal ponto que o tema que empolga, na atualidade, a sociedade soviética, é exatamente este. E todos sabem que a superpotência euro-asiática sempre foi, desde 1917, o verdadeiro paradigma da centralização. Se o livre mercado é bom para a União Soviética, por que não haveria de ser, também, para o Brasil?    

(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 2 de setembro de 1990)


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