Agricultura
sem rumo
Pedro J. Bondaczuk
O Brasil nunca teve uma política agrária que
realmente merecesse esse nome. Não há um planejamento sobre o que plantar, em
que quantidades e por quem. Terras próprias para o plantio de grãos são
utilizadas com cana-de-açúcar. As que se prestariam melhor a essa cultura,
tendem a se transformar em meros pastos.
Superprodução de alguns produtos agrícolas e
escassez aguda de outros são fatos tão corriqueiros que sequer chegam a ser
noticiados. A posse das propriedades em determinadas regiões deste
país-continente se dá quase que num processo de autêntico bandoleirismo.
Há quem se aposse de extensas áreas à força,
praticamente a bala, e mantêm esse solo absolutamente inculto. Depois, é claro,
de depredar tudo o que a natureza levou milênios para elaborar, como é o caso
do Sul do Pará.
Com isso, o Brasil vive a vexatória situação de,
mesmo em sendo detentor de uma das quatro maiores extensões de terra
agriculturáveis do Planeta, continuar sendo não um expressivo fornecedor de
alimentos para o mundo, mas importador de produtos essenciais que poderiam ser
plantados aqui.
Além disso, nossa produtividade é incipiente. As
técnicas adotadas na maior parte do nosso território – salvo as exceções já
conhecidas, no eixo Sul-Sudeste ou numa ou outra modelar fazenda de outra
região – são tão rudimentares que remontam à Idade da Pedra.
O agricultor brasileiro, em geral, não sabe, por
exemplo, como utilizar corretamente, sem expor os que manipulam e o consumidor
a intoxicações – quando não há envenenamentos – os defensivos agrícolas. Mas é
na forma com que alguém se torna proprietário de alguma gleba, pertencente à
União – ou seja, à totalidade dos brasileiros – principalmente no Norte, que
está a maior aberração.
O Sul do Pará, por exemplo, vem sendo palco de
verdadeira luta armada nos últimos anos. Um relatório divulgado pelo Instituto
de Desenvolvimento Econômico e Social do Estado revela cifras alarmantes. Entre
1964 e 1988, os conflitos de terras ali provocaram a morte de 529 pessoas.
Outras 121 ficaram feridas, 129 foram espancadas e 1.064 acabaram submetidas a
trabalho escravo.
Na região há, portanto, um autêntico Estado dentro
do Estado, com leis próprias, ditadas por bandoleiros, e que são as mais
perversas possíveis. Direitos humanos ali são autênticos palavrões. Houve, na
região, no período, sete seqüestros, 463 prisões, 116 desaparecimentos e 142
ameaças de morte. E tudo virtualmente impune.
Além disso, 15.671 famílias foram ameaçadas de
despejo e 3.799 despejadas de fato por quem não tinha competência legal para
fazer isso. Falar, portanto, em “reforma agrária”, num país que sequer possui
uma política para o setor, não passa de ficção ou de ilusória bandeira para
pessoas mal-informadas, intoxicadas de ideologismos maldigeridos.
(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio
Popular, em 11 de dezembro de 1990)
Acompanhe-me pelo twitter: @bo0ndaczuk
No comments:
Post a Comment