Kuwait na mira do Irã
Pedro J.
Bondaczuk
O Congresso dos Estados Unidos está bastante preocupado
com a política do presidente Ronald Reagan em relação ao Golfo Pérsico. Acha
que sua decisão de oferecer a proteção da bandeira norte-americana a 11 petroleiros
do Kuwait, vai provocar algum tipo de reação por parte do Irã que, há tempos,
vem acusando essa pequena e rica monarquia da região de ajudar o Iraque em seu
esforço bélico.
Por isso, os iranianos sentem-se
no legítimo direito de hostilizar esse país, renovando ameaças sobre ameaças de
promover algum tipo de retaliação. No entanto, essas advertências do regime do
aiatolá Ruhollah Khomeini vêm sendo feitas desde 1980, sem que nada
acontecesse, a não ser um ou outro ataque a navios (também praticados pelos
iraquianos, que foram, aliás, os que começaram com essa prática, que se
convencionou chamar de “Guerra dos Petroleiros”).
Esse assunto freqüentou as
manchetes em 1985, até que, por sua repetição, deixasse de ser noticiado e
sumisse dos meios de comunicação. Esse, aliás, é um dos grandes males dos
líderes mundiais. Aceitam com muita facilidade práticas criminosas, adiando
soluções, na vã esperança de que as grandes questões se solucionem de per si,
mediante o simples esquecimento. Claro que não é isso o que, logicamente, acaba
ocorrendo.
Caso típico dessa atitude é a
própria guerra do Golfo Pérsico, classificada, em um relatório divulgado,
anteontem, pelo Instituto Internacional de Investigações para a Paz, com sede
em Estocolmo, na Suécia, como uma das mais significativas deste século.
No entanto, o que se fez de
prático, de efetivo (além de se ganhar muito dinheiro com ela), para o seu fim?
Nada! Literalmente, nada! Foram realizadas, é verdade, muitas dessas reuniões
fúteis, de grupos regionais (tão abundantes, quanto ineficazes), que só servem
para colocar os assuntos internacionais em dia, em termos de informações, num
papo entre amigos (e às vezes, nem tanto), do que para se chegar a qualquer
solução prática.
Desses encontros saíram,
invariavelmente, apenas propostas esdrúxulas e impraticáveis que, aliás, sequer
foram levadas a sério pelos editores dos grandes jornais pelo mundo afora,
quanto mais pelos beligerantes, aos quais se destinavam.
O que se fez, e muito, foi
explorar essa guerra por todos os ângulos em que foi possível. No aspecto
político, por exemplo, foram oferecidos falsas alianças e enganadores apoios,
tanto a Teerã, quanto a Bagdá, o que apenas estimulou a continuação da
carnificina, e nunca o seu efetivo término. No plano econômico, a guerra do
Golfo propiciou a venda de toneladas e mais toneladas de armamentos de todos os
tipos e preços aos dois beligerantes (não raro, simultaneamente, pelo mesmo
fornecedor), como ainda estão fazendo 26 países, denunciados no documento que
citamos do instituto sueco. E no campo diplomático, foi usado, como pretexto, a
existência, no Irã, de um regime que se auto-segregou da comunidade
internacional (e que sempre se mostrou inócuo, apesar da retórica), para a
adoção de medidas que são a antítese de diplomacia.
Até aqui, ninguém, absolutamente
ninguém, de parte alguma, apresentou um só plano consistente, equilibrado,
sério e sem violações da soberania de nenhum dos dois contendores, para acabar
com este estúpido e cruel derramamento de sangue.
Aliás, em matéria de
incompetência, os nossos estadistas batem todos os recordes imagináveis. Em vez
do senhor Reagan enviar belonaves ao Golfo, desafiando o Congresso
norte-americano, a República Islâmica dos aiatolás e, principalmente, o
bom-senso, por que não trabalha na solução diplomática das 36 conflagrações
armadas que atualmente estão em andamento no mundo?
E o senhor Gorbachev, em vez de
andar rondando a área, como lobo faminto à procura de caça indefesa, por que
não retira as suas tropas do Afeganistão; não apresenta algum projeto para
pacificar Angola; não exige que o Vietnã saia do Camboja e não tenta pôr um
pouco de juízo na cabeça dos norte-coreanos?
Há 41 países envolvidos, hoje, em
guerras, guerrilhas e revoluções ditas salvadoras, mobilizando recursos que as
respectivas sociedades não têm e que se tivessem, deveriam ser investidos em
saúde, em educação, em moradias e para a geração de empregos, e não para
custear 5 milhões de soldados empenhados, atualmente, na inglória tarefa de
matar, destruir e aterrorizar.
Uma intervenção militar no Golfo Pérsico, portanto, só
pode ser tolerada, pelas pessoas de bom-senso e com um mínimo de lucidez,
somente se for para pôr fim ao conflito que ocorre nessa área. Caso contrário,
quem for para lá com outras intenções, que não esta, precisa ser imediatamente
detido, como piromaníaco. Mas desses, desgraçadamente, o tempo em que vivemos
está repleto.
(Artigo publicado na página 11, Internacional, do Correio Popular, em 19
de junho de 1987).
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