Thursday, June 30, 2016

Marcha lenta


Pedro J. Bondaczuk


O presidente da Copersucar, Werther Anicchino, advertiu, ontem, que se o governo não tomar imediatas providências, como por exemplo a importação de um bilhão de litros de metanol, o usuário do carro a álcool terá, na próxima entressafra, em março de 1991, problemas muito mais sérios de abastecimento do que aqueles que teve no corrente ano e que não foram pequenos.

Mais uma vez, portanto, o consumidor, que acreditou nas promessas do governo, que investiu na compra de veículo movido por esse combustível, que recebeu a garantia de que seu carro não ficaria parado na garagem por falta do carburante, corre o risco de ser lesado.E, o que é o pior, todo um processo tecnológico genuinamente brasileiro, desenvolvido inclusive com o dinheiro dos contribuintes, está em vias de ser desmoralizado.

Muitos dos quatro milhões de detentores de automóveis movidos a álcool já fizeram, estão fazendo ou pensam em fazer a conversão de seus motores para a gasolina, da qual o Brasil não é auto-suficiente e para cuja produção bilhões de preciosos dólares têm que ser queimados anualmente.

Esse caso conduz o crítico a uma profunda reflexão acerca do que aconteceu ao País de algumas décadas para cá. Não é verdade que o brasileiro não trabalhou nesse período, ou fez menos do que em outras ocasiões. Ao contrário.

Nunca um povo se esforçou tanto, por tantos anos, quanto o nosso. E provavelmente jamais alguém conheceu maiores frustrações e retrocessos quanto os que vivem neste País. Há exceções, é claro, mas estamos nos referindo à grande maioria.

Houve ocasiões em que chegamos a espantar o mundo com nossas taxas de crescimento econômico, com cifras girando por muito tempo ao redor dos 10% chegando até mesmo a 14%. Onde residiu o nosso “pecado”? Em que ponto falhamos em todos esses anos, para chegarmos a 1990 com os salários detendo um poder de compra 35% menor do que em 1980 e com o mínimo, a remuneração de 80% dos brasileiros, adquirindo de cinco a seis vezes menos mercadorias do que em 1940?

Talvez a falha sempre estivesse em não levar a sério a estratégia de Henry Ford, que tinha a política de pagar muito bem aos seus empregados, para que cada um deles pudesse ser, igualmente, seu cliente na aquisição do produto que fabricava: o automóvel.

É preciso que se salve o Proálcool, não por uma questão de puro nacionalismo, por se tratar de uma tecnologia nossa, mas por uma razão absolutamente pragmática. O País não pode abrir mão de uma fonte energética renovável, em favor de outra que está muito perto de se exaurir no mundo, como comprovam inúmeras pesquisas e advertências de técnicos do setor. Até porque a nossa quota de erros e omissões se esgotou por inteiro na infeliz década de 1980.

(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio popular, em 17 de julho de 1990).


Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk 

No comments: