Copa e eleições
Pedro J. Bondaczuk
A
disputa da Copa do Mundo é uma das raras oportunidades para que o brasileiro
mostre o quanto ama este país. É ocasião para vestir-se de verde e amarelo,
tirar a bandeira nacional do fundo do baú e gritar emocionado: Brasil! Brasil!
Brasil! É momento de afirmação da nacionalidade. É, antes de uma festa
esportiva, um raro momento de civismo, que une todas as classes sociais.
Como
nas outras quinze Copas disputadas --- e o Brasil foi o único a ser
representado em todas essas disputas --- ocorre agora a mesma manifestação de
descrença (com uma pontinha indisfarçável de derrotismo) na nossa seleção, como
em tantas outras situações semelhantes. Defeitos inerentes a todos nós --- como
a falta de previsão, o fato de deixar tudo para a última hora e a confiança sem
limites na capacidade de improvisação --- são apontados pela imprensa
especializada como falhas imperdoáveis, com o que concorda parte considerável
da torcida. Tais deficiências (contornáveis, por sinal, como experiências
passadas mostraram), são colocadas como obstáculos quase intransponíveis à
conquista do sonhado penta. Mas não há novidade alguma nisso.
À
exceção de 1950, quando o "já ganhou" provavelmente levou nosso
selecionado ao fracasso, no jogo decisivo contra o Uruguai, no que se
convencionou chamar de "o desastre do Maracanã", nos demais mundiais
a tônica foi essa: pessimismo, críticas e restrições a técnicos ou jogadores.
Em 1954, era "palpável" o nosso complexo de inferioridade frente aos
europeus. Alguns tolos inconseqüentes chegaram a dizer que constituíamos uma
raça inferior. Nada mais estúpido!. Em 1958, a seleção embarcou cercada do mais
absoluto descrédito. Maravilhou o mundo e conquistou seu primeiro título.
Em
1962, o pessimismo e a mentalidade derrotista voltaram, após o segundo jogo,
quando Pelé sofreu a distensão muscular contra a Checoslováquia, naquele
sofrido 0 a 0 no Chile, que o alijaria da Copa. Esse mesmo adversário, no
entanto, seria superado com relativa facilidade na final, na conquista do bi.
Em 1970, o Brasil fez fiasco na fase de amistosos (como agora). Mas deu no que
deu: foi tricampeão.
Poderíamos
reportar todos os mundiais. A véspera de cada um deles não diferiu disso que
estamos assistindo agora. Há torcedores, inclusive, que ostensivamente torcem
contra o Brasil, sob o pretexto de que um eventual fracasso na França impediria
a reeleição de Fernando Henrique Cardoso para a Presidência. Será que o
presidente depende, de fato, da performance da seleção para garantir mais
quatro anos no poder? O futebol pode ajudar, mas não será o fator determinante
de sua vitória ou derrota.
O
que vai contar, com toda a certeza, vai ser o nível de desemprego no País às
vésperas da eleição. Terá um peso considerável o andamento da economia e o controle
do indecente déficit público. Vão pesar, e bastante, declarações dos três
principais candidatos. Por exemplo, Fernando Henrique não pode mais cometer
gafes como a que cometeu, quando chamou os brasileiros que se aposentam com
menos de 50 anos de "vagabundos". Por outro lado, Luís Inácio Lula da
Silva e Ciro Gomes, seus principais adversários, precisam policiar atos e
palavras, para não cometerem deslizes como estes, ou até piores.
Quanto
ao desempenho da seleção, é duvidoso que venha a influir, pelo menos em grande
medida, na campanha sucessória. Apesar do clima de pessimismo e das notícias
alarmantes procedentes da França --- sobre insuficiência de preparação, brigas
entre jogadores e contusões --- o Brasil tem, é óbvio, todas as chances de
repetir o êxito obtido em quatro ocasiões.
Na
hora do "vamos ver", é o talento que conta. E isso o atleta
brasileiro tem de sobra. Não foi por acaso que o País conquistou os quatro
campeonatos que ostenta, um dos quais na Europa em 1958, feito jamais repetido
por outro sul-americano, ou africano ou asiático. Em competição, prognósticos
são inúteis. Isto vale tanto para uma Copa do Mundo, quanto para uma eleição,
seja ela para a Presidência, para governo do Estado, para prefeituras ou mesmo
para uma sociedade de bairro.
(Texto
escrito em 9 de junho de 1998 e publicado como editorial na Folha do Taquaral).
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
No comments:
Post a Comment