Solução passa por um pacto
Pedro J. Bondaczuk
O
ministro da Fazenda, Fernando Henrique Cardoso, está propondo um expediente
para combater a endêmica e renitente inflação brasileira, tentado (sem sucesso)
por vários outros governos: a negociação que conduza a uma espécie de pacto.
A
reação inicial, da maioria esmagadora dos cidadãos, é a mais previsível
possível: a de ceticismo. Alguns chegam até mesmo a dar um sorriso irônico, via
de regra acompanhado de uma expressão galhofeira, tão a caráter do nosso
temperamento. Mas qual é, então, a opção? A tentativa de vencer essa terrível
disfunção econômica mediante decretos? Tolice!
O
ideal, descartada a primeira hipótese, seria algum outro choque na economia,
tão "chocada" de 1986 para cá, com os respectivos congelamentos de
preços e salários? Há quase que um consenso, hoje em dia, de que essa é uma
complicação enorme, jamais uma solução.
O
que fazer? Recorrer a expedientes extremos, do tipo confisco de poupança da
sociedade? Passar por cima de contratos e alterar as regras de mercado? Ou
deixar como está para ver como é que fica? Impossível!
Nem
é preciso ser um economista ou sequer ter noção da matéria para saber que a
inflação é a maior concentradora de renda. Transfere recursos de quem os tem
minguados para aqueles que possuem muito além de suas necessidades. E a maioria
já nem tem mais o que transferir.
O
País conta com 34,6 milhões de indigentes, cifra que supera a população total
da Argentina. Como se observa, ironias à parte, o único caminho para que as
taxas inflacionárias sejam trazidas para baixo, até um patamar aceitável, é a
obtenção de um acordo que, se não satisfaça a todos --- há um clichê surrado,
mas sempre verdadeiro, que diz ser "impossível agradar a gregos e
troianos" --- pelo menos seja razoavelmente respeitado.
Nenhum
país que tenha vencido a inflação e voltado a crescer o fez sem uma espécie de
pacto, envolvendo governo, capital e trabalho. Risível ou não, a proposta de
Fernando Henrique Cardoso, de tão óbvia, chega a ser como Nelson Rodrigues
costumava dizer: "ululante".
Ou
será que existe alguém de posse de uma fórmula mágica que, da noite para o dia,
vai não apenas deter a erosão da nossa moeda --- hoje tão achincalhada e
desvalorizada que nem é mais tomada como referencial de preços --- mas
conseguir, de quebra, que ela se valorize? Se tiver, que apresente, poisa
certamente irá obter o Prêmio Nobel de Economia.
É
certo que o governo, antes de propor este entendimento nacional, deve dar o
exemplo de austeridade, que tanto se espera, tantas vezes prometido e
reiterado, mas jamais cumprido. O Estado está falido e ainda assim gasta por
conta aquilo que não tem.
As
finanças públicas são como cobertor de pobre: quando se consegue cobrir a
cabeça, os pés ficam de fora e vice-versa. Os cortes a serem feitos no
orçamento de 1993, para fazer face ao reajuste de 85% aos servidores públicos
federais, ameaçam tirar verbas de setores exatamente os mais carentes e
desassistidos, como saúde, educação e assistência social.
Se
isso ocorrer, o governo estará dando uma demonstração explícita de falta de
capacidade administrativa. Afinal de contas, o que é o ato de administrar
senãoi a definição correta das prioridades?
(Artigo
publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 2 de junho de 1993).
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