Pedro J. Bondaczuk
O meu já famoso (de tanto que o tenho mencionado nestas reflexões) bloco de anotações, em que compilo o que considero de mais relevante nas várias biografias que leio, não tem, como pode parecer, notas apenas referentes a escritores, embora a Literatura conte, por razões óbvias, com a minha até instintiva preferência. Outros artistas também merecem minha atenção, como pintores, escultores e compositores, quer de música erudita, quer da popular. Um dos que mais me fascinam, quer pelos seus feitos, quer por sua vida e, sobretudo, quer pela sua vasta e consistente obra, é o alemão, naturalizado britânico, Georg Friederich Haendel. Sou seu admirador incondicional. Sua música, principalmente a sacra, toca-me profundamente e me emociona às lágrimas, como raramente outro já conseguiu ou consegue fazer com tamanha intensidade.
Não sou o único, claro, a ficar fascinado, embevecido e mais, hipnotizado com a harmonia e melodia que esse gênio conseguiu extrair, tendo por matéria-prima as sete notas musicais e suas variações. A sua “Aleluia”, por exemplo, que integra o oratório “O Messias”, é sempre ouvida com o público respeitosamente de pé, tamanha é sua beleza e tão peremptória sua solenidade. Isso acontece tanto na Grã-Bretanha, onde ele é considerado o compositor nacional (embora tenha nascido na Alemanha), quanto em qualquer parte do mundo onde a música eterna e intemporal, classificada de “clássica”, é apreciada.
Curiosa é a origem desse costume, que persiste até hoje, em muitas partes, em especial no Reino Unido, uma espécie de reverente ritual que celebra o talento fenomenal de um gênio, que chegou a ser chamado de “divino” por muitos, tamanho o fascínio que despertou e que segue despertando através de suas obras. Tudo começou quando Haendel foi apresentar o oratório “O Messias” ao rei inglês, e a toda a corte, em 23 de março de 1743. George II, da casa de Hanover, ocupava, então, o trono. O compositor alemão havia sido contratado pelo seu pai e antecessor, George I. Toda nova composição do então já consagrado músico era apresentada, até por questão de respeito, antes, ao monarca e só depois era executada em outros palcos. Isso, pois, também aconteceu com a grandiosa peça “O Messias”.
A apresentação desse oratório embeveceu toda a corte e também o rei, que parecia hipnotizado pela poderosa melodia. Até que veio o clímax, o momento mais grandioso da composição, o movimento chamado “Aleluia”. George II não se conteve. Profundamente emocionado, arrebatado, como em êxtase, pôs-se de pé, baixou a cabeça e acompanhou desse jeito toda a execução desse trecho até o fim. A corte toda seguiu, incontinenti, o exemplo do monarca. A partir de então, esse gesto de reverência e admiração tornou-se tradicional em toda a parte – pelo menos do Reino Unido – em que o oratório “O Messias” seja executado.
Desconheço comportamento igual, ou pelo menos semelhante, em relação a qualquer outra composição, de qualquer outro compositor, seja ele Johann Sebastian Bach, seja Ludwig van Beethoven, seja Frierich Chopin. etc. Mesmo sem ser britânico, todas as vezes em que tive o privilégio de ouvir esta peça, acompanhei a tradição e a ouvi de pé. Honra ao mérito. Haendel merece tamanha reverência.
Abro aqui um parêntese para reiterar o que já esclareci em outros tantos textos destas reflexões. Embora minhas considerações baseiem-se em anotações de relatos biográficos das personalidades enfocadas, elas não têm a veleidade de ser (e nem são) biografias, mesmo que resumidas. São meros comentários à margem, de detalhes nem sempre levados em conta, mas que escondem, nas entrelinhas, preciosas lições. Por isso, não me sinto comprometido a seguir nenhuma regra ou ordem, sequer a cronológica. Minha proposta é a de fazer destes textos exercícios dialéticos e, sobretudo, de suscitar reflexões.
Embora não espere resposta direta dos leitores, mediante comentários (o que seria, aliás, ideal), se minhas considerações levarem pelo menos um dos que as lerem a pensar (o desejável é que seja o maior número possível), já me darei por realizado. Meu papel – e isso já afirmei centenas de vezes – é o do provocador. Mas não daquele que suscita a polêmica pela simples polêmica, sem nenhum objetivo mais pratico ou mais nobre. Por isso não me importo em nadar contra a corrente e em manifestar opiniões contrárias às da maioria. Afinal, é da discussão respeitosa e civilizada e do debate bem fundamentado e inteligente que emerge a verdade.
A vida de Haendel apresenta lições preciosíssimas que podemos e devemos aproveitar. É questão de sabedoria aprendermos tanto com os erros, quanto com os acertos alheios, para que não venhamos cometer os mesmos deslizes que outros cometeram, mas para acompanhar com segurança as ações corretas e eficazes que praticaram, sem precisarmos nos expor de forma desnecessária. Por isso, esse personagem, magnífico e exemplar, será, nos próximos dias, o foco das minhas atenções e considerações, neste espaço nobre da internet.
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