Tuesday, December 18, 2012

Igualdade não, mas é preciso solidariedade

Pedro J. Bondaczuk

O presidente francês, François Mitterrand (talvez de uma forma compreensivelmente demagógica, visto que está em campanha visando à sua reeleição) está pregando algo revestido de uma grande lógica. Trata-se de uma tese tão óbvia, que chega a ser complicada para a maioria, que aprecia complicações. Defende um limite de pobreza, abaixo do qual ninguém venha a ficar. Ou seja, que não haja nenhum cidadão em seu país que seja privado daquilo que é básico para a existência: comida, roupa e teto.

É evidente que Mitterrand não está propugnando pela absoluta igualdade social. Aliás, nenhuma pessoa séria pregaria isso. Os seres humanos são, basicamente, diferentes, desiguais. Alguns têm mais aptidões, outros têm um pouco menos e outros, ainda, virtualmente, não têm nenhuma. Não é justo, e nem possível, pois, que todos sejam nivelados.

Mas isso não implica em condenar os desfavorecidos à morte, ou a uma existência despida de dignidade. Até porque, os recursos da existentes, atualmente, no Planeta, são para lá de suficientes para prover a todos. O que há é uma distribuição iníqua deles. O que existe é o desperdício de poucos em detrimento da sobrevivência de alguns bilhões de indivíduos. E isto extrapola o terreno da competição humana. Transforma-se em mesquinharia, em maldade, em distorção de caráter.

Pregar a inexistência de pessoas pobres é uma utopia. Mas agir no sentido de condenar a maioria a vegetar nos limites da miséria, da indigência, da inanição é uma perversidade. Nem é preciso que seja um Robin Hood para investir contra essa distorção. Basta ser um político honesto, um administrador competente, um homem íntegro para prover fundos suficientes capazes de evitar casos constrangedores, como aqueles com os quais nos deparamos cotidianamente e que, de tanto ver, sequer damos mais importância.

Os silos dos países ricos estão abarrotados de alimentos, cujos custos de estocagem são exorbitantes. Enquanto isso, 5,2 milhões de etíopes, por exemplo, dos quais 2 milhões são crianças, correm, de novo, o risco de morrer de fome.

É evidente que o governo desse país é o principal responsável por isso. Afinal, a Etiópia é, hoje, a República mais armada da África. Por que não investiu os poucos recursos que tinha na melhoria das condições sociais do seu povo? Esta é a pergunta que se faz amiúde.

Mas sua omissão não é justificativa para que quem pode ajudar deixe de agir dessa maneira. Afinal, quando isso acontece (e ocorre sempre), a população humilde, a que não tem culpa alguma da falta de visão de seus governantes, é vítima, duplamente.

Oxalá Mitterrand consiga dar o exemplo dentro do seu próprio país (e que este possa se multiplicar em cadeia), extinguindo o vexame da miséria, que depõe contra a racionalidade desse ser dito inteligente, que é o homem.

(Artigo publicado na página 12, Internacional, do Correio Popular, em 7 de abril de 1988)

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