Pedro J. Bondaczuk
O chefe da junta de governo do Haiti, general Henry Namphy, tão logo assumiu o poder, em 7 de fevereiro de 1986, após a fuga do ditador Baby Doc para a França (com a ajuda norte-americana) conquistou, de início, as simpatias da opinião pública mundial.
Parecia imbuído de um sincero desejo de institucionalizar o país, disparadamente o mais pobre de todo o hemisfério Norte, com uma economia arrebentada pela aventura inconseqüente de Jean-Claude Duvalier, sucessor de seu ilustre e sanguinário pai, François, mais conhecido como o “ Papa Doc”. Esta personalidade, aliás, foi a mais perfeita cópia da dualidade representada por Dr. Jekyll e Mr. Hyde, personagem do romance “ O médico e o Monstro”, encarnado pelo mesmo homem.
Namphy jurou devolver o poder aos civis no prazo de dois anos. E pôs, de imediato, tão logo assumiu, mãos à obra. Convocou uma Assembléia Constituinte, recebida com enorme desinteresse pelo povo haitiano, que se mantinha céptico em relação ao propalado processo de abertura política, ao perceber que o governo de transição praticava (ou fazia vistas grossas) as mesmas mazelas administrativas e as mesmíssimas violações aos direitos humanos do deposto ditador.
De qualquer forma, Namphy gozava de crédito no exterior. Tudo isso, no entanto, foi por água abaixo após o que ocorreu em 29 de novembro passado. Civis armados, ex-integrantes do terrível bando de assassinos, que foi a polícia secreta do regime deposto, os tristemente célebres “ Tontons Macoutes” (bichos-papões) e militares promoveram dantesco banho de sangue no dia das eleições, no exato momento em que eleitores (esperançosos) aguardavam na fila de uma seção eleitoral para votar.
Morreram, na oportunidade, 34 pessoas e o número de feridos foi de cerca de 70. As cifras exatas da carnificina são desconhecidas, como tudo o que se refere à truculência e à arbitrariedade de que os haitianos têm sido vítimas nestes últimos (e infelizes) 30 anos. O general Namphy, entretanto, manifestou-se de uma forma estranha, suspeita e por isso lamentável.
Em vez de apurar quais foram os autores do bárbaro e covarde massacre, simplesmente cancelou as eleições. Não prendeu um único dos bandidos, mas dissolveu o Conselho Eleitoral Independente, previsto na Constituição. Não levou ninguém às barras do tribunal por assassinato, mas mudou a lei que vai reger as novas eleições, marcadas, agora, para 17 de janeiro próximo, abrindo brechas para que ocorram fraudes e manipulações na votação.
Todas as promessas de Henry Namphy, portanto, ficaram, somente nas intenções, ou nem nisso, mas só na retórica. Mas “ de bem intencionados o inferno está cheio”, diz o dito popular, se é que o general teve ou tem boas intenções. Não é o que parece.
Tudo indica que as sonhadas eleições livres não vão passar, como sempre, de pantomimas, de engodo para tapear a opinião pública internacional, como foram, por sinal, processos semelhantes ocorridos nas Filipinas e, mais recentemente, na Coréia do Sul.
(Artigo publicado na página 20, Internacional, do Correio Popular, em 20 de dezembro de 1987).
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