Obra copiosa e consistente

Pedro J. Bondaczuk

O quadro mais comentado de Rembrandt Harmenzoon Van Rijn – provavelmente nem tanto por seu valor artístico, embora este seja incontestável, mas em decorrência do famoso leilão de 23 de novembro de 1961, na Galeria Parke-Bennet, de Nova York, em que este foi arrematado por US$ 2,3 milhões – é “Aristóteles contemplando o busto de Homero”. Tentei reconstituir sua trajetória, desde que saiu das mãos do nobre siciliano Antonio Ruffo, da cidade de Messina, que o encomendou ao pintor e o recebeu em 1654, até chegar ao milionário norte-americano Alfred W. Erickson, que o vendeu, mas não consegui. Nesse mercado da arte as transações, em geral, são feitas com muita discrição. Só sei que em meados do século XVIII essa tela estava na Inglaterra. Daí em diante, perdi sua pista. Bem, mas isso pouco importa.

Essa tela, atualmente, está no Museu Metropolitano da “Big Apple” e pode ser apreciada por todos os que visitem essa metrópole do mundo. O preço que Rembrandt cobrou por este quadro foi considerado “salgado “ na época. Aliás, esta era uma característica do pintor holandês: a valorização (hiper?) do que fazia. Impunha seu preço e não havia meios de reduzir a pedida. E não adiantava pechinchar. Estava errado? Não sei! Cada qual sabe de si e tem certa idéia do quanto vale o que faz. Eu tenho meus parâmetros. O leitor, certamente, também tem o seu. O fato é que os 500 florins que Ruffo desembolsou pelo quadro era quatro vezes maior do que o cobrado na ocasião por obras similares na Itália. E olhem que os artistas italianos tinham reputação e tradição de qualidade.

Interessante é a análise publicada na enciclopédia eletrônica Wikipédia sobre essa obra, que peço licença ao leitor para reproduzir: “Rembrandt representa Aristóteles olhando, reflexivamente, o busto de Homero. Uma cálida luz flutua entre as duas figuras e se concentra, precisamente, onde os olhares deveriam cruzar-se. É uma luz que parece brotar de dentro da obscuridade. Aristóteles veste-se como um rico mercador holandês do século XVII. A corrente de ouro que traz em torno do corpo aparece em outros retratos de Rembrandt e lembra os presentes que os pintores recebiam de seus patronos. Representa-se (Aristóteles) como um homem velho, quando já seu aluno, Alexandre Magno, se dedicava à conquista de um império. Poderia estar pensando na ascensão de Alexandre, nas suas ambições mundanas, face à espiritualidade do homem, representada por Homero”. Como se vê, magnífica análise. Sucinta e simultaneamente explicativa.

A obra de Rembrandt é copiosa, vastíssima, variada e, para o meu gosto estético, consistente. Para muitos ela não tem tanta consistência assim. Mas... A descrição de suas principais telas é um exercício dos mais compensadores, mas que deixo a cargo do leitor que desejar se aprofundar no mundo desse temperamental e controvertido artista. Até porque, a proposta destas reflexões (e deste espaço) não é, a rigor, esta. Contudo, a título de informação, alguns de seus trabalhos têm que ser, necessariamente, pelo menos citados.

Em 1632, Rembrandt pintou uma tela que intitulou “Aula de Anatomia do Professor Tulp”. Atualmente ela está no Museu Mauritsuhis de Haia. Data de 1636 seu famoso “Autorretrato com Saskia” (sua esposa), que pertence ao Gemalddegalerie, em Dresden, na Alemanha. “Ronda da noite” data de 1642 e foi restaurada em meados da década de 80 do século passado. A restauração chega a tornar até inadequado o título dessa obra, que pode ser apreciada no Rijkmuseum de Amsterdam.

No mínimo uma dezena (certamente muito mais) de quadros de Rembrandt têm que ser, necessariamente, citada. Como, por exemplo, “Cristo em Emaus”, de 1648, pertencente ao acervo do Louvre, em Paris. Ou como “O homem com o capacete de ouro”, um retrato do irmão de Rembrandt, , datado de 1650, atualmente no Bode-Museum de Berlim. Ou, então, como o “Retrato do burgomestre Six”, de 1654, exposto no Huis Six, de Amsterdam. Não se pode omitir, também, a “Bênção de Jacó”, de 1656, atualmente no Hessiche Lansgalerie, em Kassel.

Como se vê, Rembrandt nunca negligenciou sua arte. Encomendas jamais lhe faltaram. Ganhou muito dinheiro com seus quadros, mas tinha um defeito muito grave, que nunca corrigiu. Sabia cobrar bem pelo que fazia, mas não sabia gastar com juízo. Esbanjava rios de dinheiro com bobagens e deu no que deu. Terminou a vida se não na miséria, pelo menos em extrema pobreza. Foi dos tais que tinham asas, mas não sabiam voar.

Antes que algum expert em artes plásticas me cobre, menciono mais alguns trabalhos célebres de Rembrandt:

a) “Aula de anatomia do doutor Deyman” – 1658 - Rijkmuseum, Amsterdam.

b) “O cavaleiro polonês” – 1657 – Frik Museum, Nova York.

c) “Os síndicos da Associação dos Mercadores de Tecidos” – 1662 – Rijkmuseum, Amsterdam.

d) “Volta do filho pródigo” – 1668 – Ermitage, São Petersburgo.

e) “Casal com três filhos” – 1668 – Coleção de Hering Anton Ulrich Museum, Brausschweig.

f) “A noiva judia” – 1668 – Rijkmuserum,. Amsterdam.

g) “Homem em desgraça” – pintado no ano da sua morte – Ermitage, São Petersburgo.

Poderia citar mais umas dezenas de obras de Rembrandt, mas não o farei. Os quadros mencionados são suficientes para o leitor ter uma idéia de sua intensa produtividade. Chama-me, em particular, a atenção o título de uma de suas últimas telas, “Homem em desgraça”. Seria uma alusão implícita, ou mesmo subconsciente, ao que lhe aconteceu? Se não foi, bem que poderia ter sido.

 

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