Pedro J. Bondaczuk
A utilização de animais na Literatura, como personagens e, notadamente, como protagonistas de enredos literários, é prática comum e das mais corriqueiras. Pouquíssimas histórias voltadas para crianças não fazem esse uso. Os astros das HQ, por seu turno, constroem fortunas, reputações e fama recorrendo a esse expediente. Boa parte dos desenhos animados, que “fazem a cabeça” de meninos e meninas já há pelo menos duas gerações, envolve patos, ratos, gatos, cachorros e pica-paus, entre outros, que vivem aventuras que, para os pequenos, chegam a ser até hipnóticas e se tornam inesquecíveis pelo resto de suas vidas.
Mas não são apenas os escritores de literatura infantil que se valem desse recurso, em que os bichos falam e agem como humanos na maior parte das vezes. O consagrado escritor Rudyard Kipling, por exemplo, no seu best-seller “Kim”, recorreu a esse expediente. E com sucesso. Os Estúdios Disney criaram sua versão cinematográfica desse romance, que intitularam de “Mowgli, o menino lobo”. Edgar Rice Burroughs, por seu turno, de certa forma, também agiu assim com sua série de peripécias do “Tarzan”, o homem macaco, adotado e criado por gorilas e que conhecia a linguagem dos animais da selva em que se criou: das panteras, babuínos, elefantes e outros mais, com os quais se comunicava com perfeição.
O fabulista francês, Jean de La Fontaine, fez sua fama com fábulas de cunho moralista envolvendo diversos animais. No Brasil, Monteiro Lobato, com sua reconhecida genialidade, trabalhou muito bem tudo isso com sua série de aventuras no mágico e encantado “Sítio do Pica-pau Amarelo”. Nesse aspecto, o folclore brasileiro é riquíssimo de histórias, envolvendo onças, raposas, jabotis e outros tantos bichos.
Quanto a La Fontaine, apesar de eu conhecer praticamente todas suas fábulas, e contá-las, diligentemente, agora, para meus netos (já as havia contado para meus quatro filhos), faço uma restrição à mais célebre delas: “A cigarra e a formiga”. Aliás, tenho sido alvo de críticas, nem sempre civilizadas e elegantes, todas as vezes que faço essa observação. Pouco importa. Não sou intransigente e mudo de opinião, sem nenhum problema, mas... Apenas quando alguém me prova que estou errado. No caso do fabulista, ninguém me provou.
E qual é essa restrição que faço a essa célebre fábula? Simples: se seu objetivo, ao criar as historiazinhas que criou, era o de transmitir, de forma didática e assimilável até pelos mais broncos dos broncos, lições de comportamento e de moral, não seria mais apropriado, em vez da formiga, ele ter utilizado como paradigma de trabalho a abelha? É verdade que ambos insetos guardam semelhanças em termos de “organização social” e de operosidade. Só que uma (e justo aquela pela qual La Fontaine optou) é nociva ao homem. Já a outra... É utilíssima e em todos os sentidos. Concordem ou não, ninguém irá me convencer de que, neste caso, o fabulista francês não foi um tanto (diria muito) infeliz. Isso não anula, claro, a importância e a relevância da sua produção. Mas escapou por um detalhe de merecer nota dez!
Quando me refiro a abelha, nesta série de descompromissadas reflexões – que, espero, tenham alguma utilidade, qualquer uma, para você, paciente e precioso leitor – estou pensando em apenas uma de suas famílias (porquanto há três delas): a das Ápidas, consideradas superiores em termos de produção de mel. Os membros desse grupo têm características distintivas e próprias, que os tornam preciosos para os apicultores. Têm tíbias nas perninhas posteriores, que apresentam depressão na face externa, rodeadas por pêlos, formando uma corbicela, ou “cestinha”, através da qual transportam o pólen das flores. Essa família é dividida em três subfamílias:
a) Bombinae – São as grandes mamanguabas peludas, que formam colméias no chão, utilizando detritos vegetais. Cada colônia tem como iniciadora uma única rainha.
b) Meliponinae – São as abelhas silvestres brasileiras, conhecidas, também, como “mandaçais”, “uruçus”, “jandaíras”, “tujuvas”, “jatis”, “borás”, “cupiras”, “tubis” e “arapuás”. Como se nota, são todos nomes derivados de línguas indígenas. Uma de suas características é a atrofia do ferrão. Além disso, têm nervuras incompletas na metade apical das asas.
c) Apinae – A principal representante dessa subfamília é a “Apis Melífera”, que é dócil e sociável e, por isso, a preferidas dos apicultores (também, claro, pela sua produtividade). Essa subespécie não existia na América do Sul e foi trazida para cá pelos colonizadores portugueses, adaptando-se magnificamente às nossas condições climáticas e hoje estão bastante disseminadas, e não apenas no Brasil, mas por todo o continente.
Na década de 50 do século XX uma experiência, feita em nosso país, de cruzar abelhas trazidas da África com a “Apis Melífera”, acabou fazendo, acidentalmente, com que a espécie importada se desenvolvesse muito mais do que o previsto. Ocorre que os insetos trazidos do continente negro têm como principal característica a extrema agressividade. Não por acaso, foram apelidados de “Assasssinas Africanas”, por atacarem os intrusos que ao menos se aproximem de suas colméias. E esses ataques são assustadores, feitos por enxames imensos, provocando, até mesmo, a morte de várias pessoas e de diversos animais (cães, gatos, cavalos, bois etc.).
De acordo com cientistas norte-americanos, no entanto, sua picada não é mais tóxica do que a da abelha comum. O que elas têm é mais irritabilidade . Por provirem de ambiente hostil e selvagem, como é a África, desenvolveram, ao longo de milênios, essa altíssima e inusitada agressividade, o que lhes garantiu, é mister que se destaque, a sobrevivência. As africanas que há no Brasil descendem de cerca de 26 exemplares originais trazidos da África e que escaparam de um apiário de Rio Claro, no interior do Estado de São Paulo, onde a experiência de cruzamento estava sendo realizada. Atualmente, elas estão espalhadas não só pelo nosso país, mas pelo território das três Américas.
Em 1985, por exemplo, um enxame dessas não raro mortais abelhas foi localizado em um, campo de petróleo no Sul do Estado norte-americano da Califórnia. Os entomólogos advertem que uma mistura dessa subespécie com outras quaisquer seria nociva para ambas. E isso não se deve, apenas, ao fator agressividade.
Nos Estados Unidos, por exemplo (e em várias partes do Brasil), os granjeiros utilizam abelhas para polinizar várias culturas agrícolas e prevenir a propagação de parasitas. Ficou comprovado, no entanto, que a espécie africana não é tão eficaz quanto a “Apis Melífera” para efeito de polinização de plantas. Quanto à sua agressividade, estima-se que as ferozes abelhas originárias da África sejam as responsáveis, em sua passagem pelas Américas do Sul e Central, pela morte de cerca de 500 pessoas. É pouco? Não acho! Por isso, leitor amigo, se eventualmente você topar com um enxame de africanas, o melhor que tem a fazer é fugir, enquanto lhe for possível, para bem longe dele. Afinal, como diz o povão, “o seguro morreu de velho”.
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