Tuesday, June 12, 2018

DIRETO DO ARQUIVO - As Bolsas e a Vida


As Bolsas e a Vida



Pedro J. Bondaczuk


A crise financeira na Ásia, nos outrora chamados "Tigres Asiáticos" --- que receberam essa designação por causa da agressividade que demonstraram no comércio exterior --- parece não ter mais fim. Desde outubro passado, as oscilações nos mercados de ações vêm mantendo em suspense as autoridades econômicas dos chamados "países emergentes", como Brasil e Argentina, temerosas de ataques especulativos às suas respectivas moedas.

Quando as coisas parecem tender à estabilização, lá vem a notícia da quebra de alguns bancos na Coreia do Sul, ou da falência fraudulenta de alguma corretora no Japão ou a informação sobre dificuldades do banco central indonésio. E tudo volta de repente à estaca zero. O "terremoto" financeiro recomeça, derrubando as bolsas asiáticas, europeias e latino-americanas e aumentando o clima de incerteza mundial.

Na sexta-feira, a causa do abalo foi a Indonésia, cuja moeda foi fortemente desvalorizada. Anteontem, a quebra do Peregrine Investments Holdings, de Hong Kong, deixou o "mercado nervoso", expressão cada vez mais em voga para caracterizar a tendência de venda de papéis, o que provoca queda na cotação média das ações. Qual será a próxima vítima?

De repente, moedas de nomes exóticos, antes conhecidas de pouquíssimos especialistas ou dos que são afeitos a curiosidades contidas em almanaques, como "bath", "won", "ringit" ou "rúpia indonésia", se incorporaram ao noticiário do dia a dia e ao vocabulário inclusive de leigos.

Mas a pergunta que o brasileiro faz a todo instante, temeroso quanto à resposta, é: o Real vai conseguir resistir, apenas com as 51 medidas adotadas pelo governo (algumas comprovadamente ineficientes ou inaplicáveis) a um novo e eventual ataque especulativo?

A equipe econômica do presidente Fernando Henrique Cardoso e, em especial, o ministro da Fazenda, Pedro Malan, garantem que sim. E de quebra asseguram que não haverá novos ônus sociais para a população nesse "braço de ferro" financeiro, em um mundo globalizado.

Esse otimismo, porém, não é compartilhado por ilustres economistas nacionais e internacionais. O professor da Fundação Getúlio Vargas, Paulo Nogueira Batista Júnior, por exemplo, entende que o Brasil é um dos países periféricos mais vulneráveis a ataques especulativos. A vulnerabilidade está na chamada "âncora cambial", constituída pela reserva em moeda forte, no caso dólares (parte considerável atraída pelos altíssimos juros pagos pelo governo), que sustenta artificialmente a cotação do nosso signo monetário.

Outros dois alvos potenciais de ataques são, aparentemente, mais frágeis ainda: Rússia (recém implantando um programa de estabilização) e Argentina. Para muita gente, a crise asiática é um fenômeno distante, que nada tem a ver com suas vidas ou com suas realidades pessoais. Mas tem. Seus empregos estão em jogo. Seu "status" social pode ser alterado em um piscar de olhos. O futuro de seus filhos pode ser comprometido.

É o preço do crescimento, em um mundo globalizado. Em Dacca, capital de Bangladesh, em Cabul (Afeganistão), em Mogadíscio (Somália) ou em Addis-Abeba (Etiópia), ninguém está preocupado com o terremoto financeiro do Sudeste da Ásia. É possível e provável que esses países, que têm as menores rendas per capita do Planeta, sequer tenham bolsas de valores. Não participam portanto do "jogo da globalização", repleto de armadilhas e surpresas. São os "excluídos" da comunidade internacional, condição que o Brasil começa a deixar.

(Editorial número um publicado na página 2 do Correio Popular em 14 de janeiro de 1998).


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