Saturday, June 30, 2018

CRÔNICA DO DIA - Idealismo ativo


Idealismo ativo


Pedro J. Bondaczuk

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Há dois tipos de idealismo: o ativo, que se reflete em ações concretas e eficazes para que aquilo que se idealize tenha a mínima chance de se tornar concreto, e o romântico, estático, imóvel, que se limita a meras cogitações individuais e fica na dependência exclusivamente das circunstâncias, quando não do acaso, para produzir efeitos. Este último pode, via de regra, ser classificado, sem nenhum exagero, de mero “devaneio”.

Os idealistas de fato, os que, com suas ideias, sonhos e realizações mudaram o mundo para melhor, não se limitaram jamais a idealizar realidades desejáveis e promissoras. Agiram!. Trabalharam duro pelas causas que abraçaram, sem se importar se teriam ou não eventuais vantagens pessoais. Já os simples sonhadores, que achavam que as coisas iriam se acertar por si sós, terminaram a vida frustrados, amargos e infelizes. Não idealizaram. Limitaram-se a “devanear”.

Claro que todo o escritor (salvo exceções) é, em certa medida, idealista. Tem algum tipo de mensagem a transmitir ao mundo, caso contrário, não escreveria. Ninguém o obriga a fazê-lo. Duvido, porém, que algum deles, quando se propõe a produzir um livro, esteja de olho, “apenas” no dinheiro que este poderá render.

Se estiver, certamente é um alienado. Dá para contar nos dedos de uma só mão (e ainda assim, provavelmente, ficarão de fora o anular e o indicador) quantos escritores enriqueceram, apenas, com Literatura. Pondero que não considero como tal essa enxurrada de lixo cultural que as editoras nos impingem e que, para o nosso aborrecimento e desgosto, lhes assegura o faturamento e lucros consideráveis nos balanços de fim de ano em detrimento do que vale a pena ser escrito, impresso, publicado e, sobretudo, lido.

Quando proponho, portanto, que o escritor divulgue, por todos os meios possíveis ao seu alcance, o fruto do seu tremendo trabalho (e quem escreve sabe do desgaste físico, mental e, principalmente, psicológico e emocional que isso implica), não penso, evidentemente, em cifrões. Mas... se essa ação impulsionar vendas, pergunto: que mal haverá nisso? Significará, caso eu consiga me tornar um best-seller, que sou mercenário? O lucro (caso venha) será consequência, nunca objetivo.

Deixar por conta das editoras a divulgação de uma obra, notadamente se você tiver convicção que ela irá beneficiar, de alguma maneira, seu único destinatário (o leitor, pois ninguém escreve para os editores, críticos etc.), não é ser idealista. É entregar-se a devaneios. Afinal, dificilmente você será o único escritor ligado a elas por contrato. O catálogo delas será, certamente, dos mais extensos. E em quem você acha que elas irão apostar?

Em você, que transmite princípios nobres e úteis, mas é desconhecido e tem baixo potencial de vendas, ou no sujeito que escreveu sobre como “fazer mágicas” para brilhar em festinhas infantis ou em quem se limitou a publicar receitas de comidas exóticas? Provavelmente estes sujeitos venderão mais, muito mais do que você. E as editoras concentrarão toda sua atenção, não tenha a mais remota dúvida, nesses livros, que estão a trilhões de anos-luz de ser literatura.

Quem você acha que elas irão divulgar ad náusea, você, que com seu esforço, talento e criatividade se propõe a educar gerações ou quem escreve histórias bizarras, de vampiros, lobisomens e outros quetais, de gosto sumamente duvidoso, totalmente supérfluas, quando não idiotas e inúteis? Consulte a relação semanal dos livros mais vendidos e você saberá em quem elas apostam.

Ademais, a participação em feiras de livros, como enfatizei, não se destina, sequer, a promover vendas. Não, pelo menos, como objetivo primordial. Se estas aumentarem, tanto melhor. A vantagem principal de participar desse tipo de evento é a possibilidade de você conhecer pessoas e lugares e de veicular ainda mais e melhor as ideias que o mobilizaram a escrever. Isso sim é idealismo legítimo, porquanto ativo.

Quem me conhece não pode me apontar jamais o dedo acusador e dizer que sou mercenário em relação à literatura. Fiz, nas últimas duas décadas, sem abrir mão de nenhuma das minhas obrigações profissionais, conjugais ou sociais, roubando preciosas horas do meu descanso e lazer, quase um milhar de palestras e conferências, notadamente em escolas e centros culturais de várias partes do País, divulgando minhas ideias sobre literatura e sobre a vida. O público que me ouviu ascende a algumas dezenas de milhar. E sabem quanto cobrei por toda essa superexposição, que me consumiu tanto tempo, trabalho e estudo? NADA!!!! Que mercenário mais desastrado que sou, não é mesmo?!!



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