O
que escritores leem
Pedro
J. Bondaczuk
O
que os escritores – chamemo-los de “profissionais” – cujas
vidas giram ao redor da literatura, que é não apenas sua profissão,
mas, sobretudo, paixão, leem, costumeiramente? Afinal, só escreve
bem quem lê muito (essa parece ser uma “regra universal” para os
literatos e todos os que tiram seu sustento da redação de textos).
A pergunta me foi feita, recentemente, por e-mail, por um leitor e
entendi tratar-se de um bom tema para ser abordado neste espaço.
A
resposta mais honesta que posso dar é: depende. Não, não estou
ficando em cima do muro. Depende mesmo. Do que? De uma série de
fatores. Por exemplo, do país em que o sujeito vive, dos recursos
financeiros de que dispõe para a aquisição de livros, do seu grau
de cultura, da sua personalidade, do seu gosto, do fato de dominar ou
não outro idioma além do seu e vai por aí afora.
Eu,
por exemplo, dou preferência (por motivos óbvios) a autores de
língua portuguesa. Todavia, sempre que o dinheiro permite, me dou o
luxo de “importar” livros, quer em inglês, quer em francês,
espanhol ou italiano. Não é sempre que isso é possível. Mas
também (felizmente) não é um fato tão raro assim. Tenho, em minha
caótica biblioteca, diversos lançamentos em língua estrangeira,
muitos dos quais não lançados nunca no Brasil. Não tantos, claro,
quantos desejaria que fossem. Muitos desses livros importados tenho
comentado, amiúde, neste espaço – e vocês são testemunhas disso
– pois já abordei obras, sem exagero algum, de cerca de quatro
centenas de escritores. Nada mau, não é mesmo?
É
difícil de saber o que os principais astros da literatura mundial
leem. Por que? Simples, quando entrevistados, são raros os
entrevistadores que lhes façam essa pergunta. Creio, contudo, que
seus critérios de leitura não difiram muito dos meus. As
preferências, talvez (ou certamente, sabe-se lá) variem, de acordo,
reitero, com sua nacionalidade, formação cultural, personalidade e
vai por aí afora. Os poucos que revelam suas leituras, todavia,
salvo raras exceções, declaram serem leitores dos chamados
clássicos. Pudera! Da minha parte, sempre recomendo a quem posso que
também os leia. São eles que formam o alicerce da cultura das
pessoas razoavelmente instruídas.
Dia
desses, topei, na internet, com uma entrevista de Michael Cunningham.
Vocês, certamente, sabem de quem se trata. Se não sabem, ou não se
lembram, eu lhes esclareço. É um escritor norte-americano, digamos
maduro para a atividade – completará 66 anos em 6 de novembro de
2018 – e que tem importante conquista em seu currículo: ganhou o
Prêmio Pulitzer de 2002, na categoria ficção, com o romance “As
horas”. O livro é tão bom, que foi adaptado para o cinema. Aliás,
Cunningham é, também, produtor cinematográfico e chegou a atuar,
até mesmo, como ator. Foi no filme “Evening”, que tem no elenco
“feras” da sétima arte, como Glenn Close, Toni Collette e Meryl
Streep. Como se vê, nosso companheiro não é fraco. Tem seis livros
publicados, todos sucessos de vendas e de crítica, sendo seu romance
mais recente “Ao cair da noite”, lançado em 2010, inclusive no
Brasil.
Pois
bem, agora vocês já conhecem (ou se lembram dele caso tenham
esquecido de quem se trata) Michael Cunningham. Na tal entrevista que
mencionei, ele revelou quais são suas leituras. Não todas, óbvio,
pois para isso teria que escrever um livro inteiro, se não vários
deles. Entre seus preferidos, citou vários autores, tidos como
clássicos, como Virgínia Woolf, Jane Austen, Anton Chekhov, Gustave
Flaubert, James Joyce, Thomas Mann e F. Scott Fitzgerald. Como se vê,
todos escritores consagrados e lidíssimos tempo e mundo afora.
Todavia,
entre suas preferências, estão, também, vários contemporâneos
(dele e nossos). Parte considerável desses, confesso, conheço
apenas de nome. Alguns, nem mesmo de nome sei de quem se trata.
Outros tantos, todavia, já tive o privilégio de também ter lido.
Neste caso, declinou estes escritores: Denis Johnson, Jonathan
Lethem, Jeffrey Eugenides, Alice Munro, Margaret Atwood, José
Saramago, Murakami e Achebe. Bela sugestão para incluir na relação
dos livros a adquirir tão logo, claro, disponha de recursos para
tal. Isso se vier a dispor desse dinheiro.
Há
uma certa similaridade entre as preferências literárias de
Cunningham e as minhas. Ele confessou, na citada entrevista, que
aprecia demais ler escritores novos, estreantes no mundo editorial,
rigorosamente desconhecidos do público e da crítica, em busca do
seu espaço no complicado e competitivo mercado. Eu também gosto
disso. Alguns desses novatos se projetam de imediato e não tarda
para se tornarem best-sellers. A diferença é que Cunningham lê os
“novatos” do seu país, os Estados Unidos. E eu... leio livros
dos nossos “novatos”.
De
alguns deles, sequer preciso comprar. Recebo-os de “presente”,
com o respectivo pedido de ajuda para divulgá-los. Caso sejam bons,
faço meus comentários a respeito e publico-os nos espaços de que
disponho na mídia, quer a impressa, quer a eletrônica. Sobre os que
têm deficiências e são mais casos para críticas e reparos do que
para elogios, eu me calo. Deixo para outros críticos, mais severos e
insensíveis, a tarefa para mim amarga de malhar a produção de
esperançosos neófitos. Certo ou errado em minha atitude, não
serei eu quem haverá de matar os sonhos de quem quer que seja.
Entre
os novatos que Cunningham revela ter lido ultimamente, ele enfatiza
três em especial. Coincidentemente, são três mulheres. A primeira,
é uma escritora sérvia, nascida na antiga Iugoslávia, mas que
reside há já algum tempo nos Estados Unidos: Téa Obreht. Ocorre
que desde o mês de julho de 2011, ela não pode mais ser considerada
“novata”. Passou, com louvor, em seu batismo de fogo, ao
conquistar, em Londres, o Prêmio Orange do Reino Unido, com seu
primeiro romance, “The tigers wife”. A premiação é destinada à
melhor obra escrita em língua inglesa por mulher de qualquer parte
do mundo. E Téa é uma escritora das mais promissoras, pois tem
muita lenha para queimar. Por que? Porque tem, apenas, 36 anos de
idade.
A
segunda escritora novata que Cuningham mencionou foi outra jovem
(nascida em 1972) e outra de origem estrangeira. Basta atentar para o
seu nome, nitidamente de origem asiática: Sarah Shun-lien Bynum,
residente em Los Angeles. Dela, o entrevistado mencionou o romance
“Madeleine is sleeping”.
Finalmente,
a terceira das novatas que Cunningham citou é Karen Russell, da
novíssima geração (nasceu em 10 de julho de 1981). Ela
especializou-se em histórias curtas, com as quais venceu alguns
concursos literários universitários. Recentemente, lançou sua
primeira novela, intitulada “Swamplandia”, livro que o talentoso
ganhador do Pulitzer de 2002 afirmou ter lido, e gostado. Creio que
respondi, pelo menos razoavelmente, à pergunta do leitor sobre
leituras de escritores. Pelo menos tentei.
No comments:
Post a Comment