Friday, June 22, 2018

DIRETO DO ARQUIVO - Ambição realizável


Ambição realizável



Pedro J. Bondaczuk

A carta de intenções assinada pelo governo do presidente Collor de Mello e encaminhada ao Fundo Monetário Internacional, na semana passada, tem tudo para ser diferente das anteriores, que não passaram de mero exercício de ficção. Esta ampara-se num plano econômico que, a despeito de ser duríssimo, é bastante consistente.

Trata-se de um programa testado na prática ao longo de seis meses que, sem entrar no mérito do sacrifício social exigido, demonstrou ser eficaz no combate à renitente inflação. Aliás, nesse aspecto, a meta assumida pelas autoridades econômicas parece, pelo menos à primeira vista, um tanto utópica, ao prever uma taxa acumulada anual de 25%.

Isto implica num índice inflacionário médio mensal de 1,88%, que o País não registra, seguidamente, há muito tempo. Uma inflação dessa ordem, convenhamos, é altíssima para os padrões do Primeiro Mundo. Mesmo na Espanha, se ela fosse registrada, imediatamente deflagraria uma série de medidas amargas. Entre nós, contudo, que já chegamos a emplacar num único mês 84% (ou um pouco mais), se trata de um objetivo demasiadamente ambicioso, ao menos à primeira vista. Mas seria algo tão irrealizável assim?

É claro que para isso a sociedade irá passar por uma fase de grandes dificuldades. A recessão, que apenas ameaçou a economia após 16 de março passado, certamente irá se impor, e se acentuar, a menos que se parta para um entendimento nacional que venha a repartir os custos do sacrifício.

Esta questão do pacto está sendo mal interpretada por determinados setores. Eles agem como se, em não aceitando participar dele, o governo irá mudar sua política, reindexando desde salários a impostos. É a velha cultura inflacionária ainda presente.

Ocorre que as autoridades governamentais têm instrumentos em suas mãos para agir com ou sem acordo. E certamente irão utilizá-los, já que o atual governo é o primeiro, em três décadas, as ser escolhido direta, livre e soberanamente pelos brasileiros nas urnas, e em dois turnos. Portanto, conta com legitimidade e dispõe de vontade política para agir.

Por isso, os que ainda relutam quanto à obtenção ou não do entendimento, precisam acordar, depressa, para a realidade. Afinal, como diz a sabedoria popular, “é melhor um mau acordo do que uma boa demanda”. Principalmente em casos como este, em que uma briga tem tudo para ser perdida, mesmo antes de começar.

(Editorial publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 18 de setembro de 1990).


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