Viciados em crise
Pedro
J. Bondaczuk
O
Brasil é um país que se habituou tanto com as crises políticas
que, quando não há nenhuma em andamento (fato raríssimo), as
pessoas ficam inquietas, achando que alguém esteja maquinando alguma
de graves proporções. De repente, como que para satisfazer a essa
expectativa, um fato irrelevante qualquer acaba ganhando desmedidas
proporções. E a turbulência é restabelecida.
Instala-se
nova crise. Isso é mau? Depende do aspecto que se encare. Em
princípio, trata-se de um comportamento natural em países
democráticos. Crises são a essência da democracia. É nesse tipo
de sistema que pessoas, em seu nome ou de grupos, têm direito,
liberdade e espaço para expressar opiniões ou contraditar as
alheias.
Uma
sociedade livremente organizada dispõe de mecanismos para
administrar essas situações. Isso é válido para países onde haja
um mínimo de justiça social e igualdade de oportunidades para
todos. Não no nosso. Seria o Brasil uma democracia? Por mais
otimistas que possamos ser em relação ao futuro brasileiro, não se
pode garantir isso.
Há
uma minoria privilegiada ditando regras e manipulando o destino de
uma enorme massa de miseráveis e de desesperados. Cada crise que
ocorre, real ou intencionalmente provocada a partir de episódios
tolos, sem nenhum desdobramento prático, dá pretexto a uma série
de ações movidas por poderosos e que acabam penalizando os
indefesos. Apenas a eles.
Foi
o que ocorreu com o pretenso lançamento, por parte do presidente
Itamar Franco, da candidatura do ministro da Fazenda, Fernando
Henrique Cardoso, à Presidência. Houve, no caso, distorções ---
por precipitação, mau entendimento ou de forma deliberada --- de
uma entrevista.
Em
momento algum do referido depoimento do governante, dado em Juiz de
Fora, se disse que o atual mentor da política econômica sairia como
candidato. Pelo contrário! Bastou, porém, esta interpretação,
dada por algum editor afoito ou comentarista político "mais
realista do que o rei", para que águas aparentemente tranquilas
se tornassem (artificialmente) turvas.
Parlamentares
logo insinuaram que poderiam derrubar o Fundo Social de Emergência
em segunda votação no Congresso para "não dar corda" ao
ministro. Estava instalada mais uma crise, o "vício" das
nossas elites.
(Artigo
publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 22 de
fevereiro de 1994).
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