Municípios falidos
Pedro J. Bondaczuk
O presidente Wenceslau Brás
costumava dizer que "o Estado é uma ficção: o que existe é o
município". Afinal, é nele que as pessoas vivem, trabalham,
produzem e morrem.
A preocupação primeira do
cidadão, antes de pensar em macroeconomia ou na política estadual
ou federal, é com aquilo que o cerca. É, por exemplo, com o estado
de conservação das ruas do seu bairro. É com o trajeto que faz
diariamente para estudar, trabalhar ou se divertir. É com a coleta
de lixo. É com a segurança. É com postos de saúde, hospitais e
escolas que possa eventualmente utilizar. É com o que depara em seu
dia a dia.
Por uma série de razões,
entre as quais a má gestão, a maior parte dos municípios
brasileiros está literalmente falida. Dívidas de gestões passadas
acumulam-se sobre as mesas dos atuais prefeitos, deixando-os sem
recursos para aplicar sequer no básico, naquilo que aparece aos
olhos dos munícipes.
Para complicar, as prefeituras
assumem crescentes responsabilidades, notadamente nas áreas de saúde
e educação, sem que haja o correspondente repasse de verbas. Não,
pelo menos, no montante suficiente para cumprir, como se deve, com
essas tarefas sobressalentes.
Para pressionar o governo
federal, no sentido de pelo menos proceder a rolagem de algumas das
dívidas, o prefeito de Campinas, Francisco Amaral, convidou
administradores municipais de cerca de mil cidades brasileiras para
fazerem uma frente comum. Apenas 150, no entanto, mandaram
representantes para a reunião, que ocorreu anteontem. Isto não quer
dizer que só esse tanto de municípios está às voltas com
problemas financeiros. Razões de ordem política levaram a maioria a
recusar o convite.
Mas há o outro lado da moeda.
Gastos irresponsáveis, muito superiores aos recursos disponíveis
--- originários da arrecadação do Imposto Predial e Territorial
Urbano majorado de ano para ano, e em algumas cidades até
triplicado, e de outros tributos --- podem comprometer a política
econômica de qualquer governo federal (ainda mais se tratando de
Brasil) e desestabilizar a própria moeda nacional.
São inúmeros os casos de
irregularidade denunciados em prefeituras da região e investigados
mediante a formação de Comissões Especiais de Investigação
(CEIs) das respectivas Câmaras Municipais. É certo que no País
impera a impunidade para esses casos de improbidade administrativa.
Mesmo os que são provados acabam por dar em nada. São raríssimos
os casos em que os culpados são punidos. A maioria das investigações
termina simplesmente arquivada, sem que se dê qualquer tipo de
satisfação à opinião pública.
A Frente de Prefeitos,
liderada por Chico Amaral, quer, entre outras coisas, a criação de
um Programa de Socorro às Prefeituras em dificuldade, uma espécie
de Proer, que socorreu, a partir de 1995, bancos prestes a quebrar,
com destinação de R$ 21 bilhões para esse fim. Reivindica, também,
o parcelamento de débitos das prefeituras junto à Previdência e ao
Fundo de Garantia do Tempo de Serviço. Além disso, quer a liberação
de verbas para obras sociais.
As propostas que serão
encaminhadas ao presidente Fernando Henrique Cardoso são factíveis,
pelo menos em parte. Todavia, é necessário que haja a
contrapartida, representada pela satisfação que os prefeitos devem,
da prestação de contas de sua gestão, aos munícipes, ao cabo de
seus mandatos, o que, pelo que se saiba, nunca ocorreu na vida
política brasileira.
(Editorial número um
publicado na página 2 do Correio Popular em 22 de janeiro de 1998).
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