Saturday, March 03, 2018

DIRETO DO ARQUIVO - Cidade tumultuada


Cidade tumultuada


Pedro J. Bondaczuk


A crise na administração municipal, às voltas com a falta de dinheiro para pagar até seus compromissos inadiáveis, levou o prefeito Francisco Amaral a tomar uma decisão que apenas conseguiu acirrar os ânimos do funcionalismo e não resolveu coisa alguma. Em uma tentativa (louvável na intenção, mas equivocada na forma) de evitar demissões em massa de servidores, numa época em que emprego é coisa rara, praticamente um milagre, o administrador da cidade cortou alguns dos benefícios sociais dos que prestam serviços à Prefeitura. Entre estes estão os adicionais de insalubridade e periculosidade e o pagamento do seguro-saúde, entre outros.

Questiona-se, antes de tudo, a legalidade desse ato, independente da sua necessidade e urgência ou não. Juristas divergem a respeito. Antes de viajar para a Alemanha, em maio passado, o prefeito já havia feito tentativa nesse sentido, tendo buscado o respaldo da Câmara dos Vereadores. Embarcou com o funcionalismo em estado de greve, exigindo a suspensão da medida. O vice-prefeito, Carlos Cruz, que assumiu o cargo durante a ausência do titular, prudentemente retirou o projeto do Legislativo, possivelmente para dar tempo a novas negociações. Estas, contudo, não aconteceram.

Chico, ao retornar, determinou que o projetado desconto dos benefícios fosse efetuado na folha de pagamentos de maio, o que levou a categoria à mobilização e a nova paralisação, que ainda persiste, prejudicando o já precário atendimento à população, em especial nas críticas e essenciais áreas da Saúde e da Educação. As partes parecem irredutíveis em suas respectivas posições e o impasse afeta os campineiros que, para aumentar seu tormento, se veem às voltas, também, com a greve dos motoristas e cobradores do serviço de transporte público urbano.

As maiores prejudicadas com essa situação, obviamente, são as pessoas carentes, que se utilizam dos centros de saúde e hospitais municipais, dos ônibus, bem como das escolas públicas do Município. É uma aflição a mais para agravar o seu já imenso sofrimento, cristalizado sobretudo na insegurança que campeia na cidade (que continua batendo recordes sobre recordes de violência e criminalidade) e com o brutal desemprego, sem perspectivas de acabar. Pior, tende a se agravar, caso a Prefeitura efetue, de fato, os cortes que alega precisar fazer para compatibilizar sua folha de pagamentos ao montante arrecadado com impostos.

O momento não é para jogadas políticas, para blagues ou para gestos grandiloquentes, que não levam a nada e apenas acirram ainda mais os ânimos, já bastante exaltados. É a hora da prevalência do bom senso e de uma sincera disposição para negociar. Pouca coisa é mais preciosa, nos dias que correm, do que o emprego. Em contrapartida, os trabalhadores, com os salários bastante achatados em decorrência desse magnífico engodo, que é o Plano Real, não têm condições de abrir mão de mais nada em seus já minguados proventos. Onde está a solução? Boa pergunta!

Não estaria na hora do Governo Federal, que se mostrou tão pressuroso e diligente em socorrer bancos mal administrados da bancarrota, dar uma providencial ajuda aos municípios, que é onde as pessoas de fato vivem, produzem, geram riquezas e fazem circular mercadorias? Onde o princípio do municipalismo?

A quem interessa a falência das cidades, já que a maioria se encontra em situação tão precária ou pior do que Campinas? Justiça seja feita com o atual Prefeito: a situação precária das contas públicas já vem de outras administrações, que empurravam o problema com a barriga, fazendo empréstimos e mais empréstimos, no País e no Exterior. Coube a Francisco Amaral pagar a conta dos antecessores, sem ter com o quê.

A sucessão de crises que se abateram sobre o País do pós-Real somente agravou a já severa escassez de recursos. Mais desemprego significa menos consumo, menos impostos e maior inadimplência. Muitos (talvez a maioria) dos devedores do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) não saldam esse compromisso não por serem sonegadores compulsivos, ou por desejarem desafiar ou criar dificuldades para o Prefeito. Não o fazem por terem sido privados da sua fonte de renda. E o desemprego é consequência da tão decantada política econômica do governo Fernando Henrique Cardoso. Não caberia, por isso, uma compensação aos municípios?

(Editorial publicado na Folha do Taquaral na primeira quinzena de junho de 1999)


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