Na rota do crime
Pedro J. Bondaczuk
A cidade de Campinas, não faz
muito, gozava de enorme e justo prestígio nacional e internacional
por suas excelências. Era decantada, em verso e prosa, por todas as
partes do País, pelos expoentes da sua cultura, por seus talentosos
artistas (pintores, escultores, poetas, músicos, etc.), por seus
esportistas, pelos seus exímios e eficientes médicos e pelos
produtivos e competentes centros de pesquisa científica de que
dispõe. Trata-se, ainda, de um dos melhores lugares para se
trabalhar, prosperar e viver. É um polo continental de alta
tecnologia. Não faz muito, era conhecida como a "capital da
gentileza", a "Atenas brasileira" e outras tantas e
lisonjeiras denominações, que nos enchiam de vaidade e de justo
orgulho. E não havia exagero em nada disso.
Ultimamente, no entanto, a
cidade anda frequentando as manchetes da imprensa por outro motivo,
nada agradável ou mesmo conveniente. Vem sendo citada como uma das
vertentes de uma suposta rede do crime organizado, que estaria
estendendo os seus tentáculos corruptores por 14 Estados da
Federação, e cujo expoente maior seria o deputado cassado do Acre,
Hildebrando Pascoal.
Essa terrível organização
criminosa, de fazer inveja às várias versões da Máfia (quer a
siciliana, quer a napolitana ou a norte-americana), seria responsável
por toda a sorte de delitos. Estaria infiltrada em todos os escalões
do poder, como não faz muito ocorria na vizinha Colômbia. Seus
crimes iriam desde o narcotráfico e a consequente lavagem do
dinheiro sujo obtido com essa atividade ilícita, ao roubo de
caminhões e cargas, pistolagem, assassinatos de motoristas,
políticos e desafetos e vai por aí afora. As denúncias são de
Jorge Meres Alves de Almeida, que confessou fazer parte dessa
quadrilha, denunciando os companheiros para obter pena mais suave.
Implicam homens públicos, empresários, delegados, policiais, etc.
Muitos deles seriam de Campinas. E isto nos parece exagero. Pelo
menos, até que se prove o contrário.
O vértice campineiro dessa
corja de bandidos estaria, supostamente, centralizado na atuação do
empresário William Sozza, que nega enfaticamente sua participação
na rede em questão e se diz vítima de uma enorme "armação".
Estaria mentindo? É impossível de se afirmar. Não se pode, porém,
tirar nenhuma conclusão a priori, e muito menos fazer
prejulgamentos, lançando, apressadamente, suspeição sobre quem
quer que seja, antes de concluídas as investigações levadas a cabo
pela Comissão Parlamentar de Inquérito da Câmara Federal, que
apura a ação nefasta e destruidora do narcotráfico no País. É
bom que se recorde o que aconteceu, anos atrás, no famoso caso da
Escola de Base.
Na oportunidade, um casal,
proprietário de uma instituição de ensino pré-escolar, foi
execrado publicamente e sofreu um verdadeiro linchamento moral, por
suposto abuso sexual contra um garotinho de 4 anos, com base somente
em afirmações da própria criança e de seus pais. A imprensa, de
maneira açodada e irresponsável, assumiu, de imediato, baseada em
frágeis evidências, a culpabilidade dos acusados. Exerceu, por sua
conta e risco, o papel de juiz e simultaneamente de executor (o que
não lhe cabe jamais e nunca deveria caber) e tratou o pobre casal
como dois notórios criminosos, dois monstros, indignos de qualquer
comiseração. E se deu mal.
Ao cabo das investigações
policiais, concluiu-se que os dois professores eram absolutamente
inocentes! Mas então já era tarde. A escola havia sido fechada e os
abnegados mestres, que tiveram a reputação maculada, estavam
arrasados, na rua da amargura, por causa da gana de muitos editores
por uma manchete escandalosa, mesmo que inverídica. Lamentável! A
mulher morreu pouco tempo depois, certamente de desgosto. O marido
tenta, ainda, ganhar a vida com uma acanhada lojinha, onde mal tira o
suficiente para comer. Indenização por perdas e danos morais? Nem
pensar!
No entanto, é indispensável
que a CPI vá a fundo em suas investigações sobre o narcotráfico
e, em nosso caso, apure se de fato existe a tal conexão campineira,
quais são os envolvidos, que tipo de atividades criminosas exerce e,
acima de tudo, se tal tentáculo, desse polvo nojento e corruptor
existir, que seja imediatamente extirpado. E que, os eventuais
criminosos, contra os quais se reúnam provas cabais, sejam punidos
exemplarmente pela Justiça. As acusações são gravíssimas.
É preciso que Campinas volte
a ser conhecida, nacional e internacionalmente, apenas pelas coisas
positivas e boas que tem. Que seja lembrada pela operosidade da sua
população. Que se exalte o talento e o bom gosto dos seus
artistas. Que se enfatize a competência dos seus atletas. Que se
valorize a excelência dos seus médicos. Trata-se de uma cidade
muito especial, nascida sob o signo da vitória, que renasceu, em
meados do século passado, virtualmente, das "cinzas",
quando atingida por insidiosa epidemia de febre amarela que a
devastou. Não é justo, portanto, que seja vítima de perversos
bandidos. Não se pode permitir que o tráfico e consumo de drogas,
que têm desgraçado tantas famílias, sejam livres por aqui. É
preciso dar um basta à violência que se generaliza e se expande.
Esta é uma tarefa não apenas das autoridades, da polícia ou da
Justiça. É uma cruzada que cada campineiro deverá assumir, para
que não se perca, em poucos anos, aquilo que foi construído, com
tamanho sacrifício, em mais de dois séculos, por várias gerações.
Reage Campinas!
(Editorial publicado na Folha
do Taquaral na primeira quinzena de novembro de 1999)
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
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