Futuro,
que futuro?
Pedro
J. Bondaczuk
A
atual civilização, ao contrário das que a antecederam, aposta
todas as suas fichas num futuro radioso, de prosperidade, justiça e
paz, sem, no entanto, lançar as bases para esse desejável período
áureo, achando que ele terá geração espontânea. Não terá!
Qualquer projeção que se faça num tempo que ainda não aconteceu e
que, sequer há a menor segurança de que irá acontecer, não passa
de delirante fantasia. Contudo, os que agem assim, se acham
“realistas” e com “inequívoca visão de progresso”. O mínimo
senso de análise e de lógica, todavia, derruba essa visão
fantasiosa.
No
terreno pessoal, embora as coisas variem de pessoa para pessoa, de
conformidade com as circunstâncias de cada um, o futuro, certamente,
não reserva, pelo menos no longo prazo, nada melhor do que cada qual
vive agora. Talvez ocorra ocasional progresso material. Quiçá
melhore a condição econômica e o status profissional e social.
Mas... por quanto tempo pode durar essa hipotética evolução, que
nunca é uma certeza, por melhor que o sujeito se conduza? No
futuro, por exemplo (caso a morte não nos surpreenda antes), está
nosso envelhecimento. E (e esta é a única certeza que temos),
estará nosso fim.
Claro
que se trata de algo incômodo para se pensar. Nem por isso devemos
interromper nossos projetos de vida, que deve ser aproveitada da
melhor maneira, conforme a capacidade e os objetivos de cada um. Há
os que apostem nos prazeres sensoriais, para os quais eles são o
real significado de felicidade. Há os místicos, que crêem numa
“vida” após a morte, posto que imaterial e que não se importam
em viver miseravelmente na Terra, apegados a essa crença irracional
e sem o mínimo fundamento. Há os que entendem que vieram ao mundo
com um objetivo específico, que se propõem a cumprir, perpetuando
assim a memória, na impossibilidade de serem “imortais”. Quem
está certo? Todos? Um deles? Qual? Nenhum? Como saber?
O
magnífico escritor mexicano (sobretudo poeta, mas também ensaísta
e diplomata), Octávio Paz, ganhador (com a maior justiça) do Prêmio
Nobel de Literatura de 1990, assim se expressou a propósito, em um
ensaio publicado em 1984 pelo “Jornal da Tarde” de São Paulo:
“Cada civilização se distingue pela sua visão do tempo. Nas
civilizações passadas, se identifica qualquer tempo passado como
melhor que o atual, ele é a Idade de Ouro que perdemos. A Idade
Moderna, ao contrário, decidiu baixar o céu até a Terra e
instaurou o futuro como algo melhor, o progresso como uma coisa
superior, o hoje melhor que ontem etc. Mas o futuro é inabitável
porque nos é inacessível”.
É
impossível de se prever, pelo menos com razoável exatidão, o que
irá ocorrer, por exemplo, no final deste dia, quanto mais deste ano,
desta década que se inicia ou deste século. Quando março de 2011
começou, por exemplo, algum japonês, por mais pessimista, precavido
ou informado que fosse, previu acaso o que aconteceria no país
quatro dias depois, com o devastador terremoto (o maior de sua
história) e o conseqüente tsunami, não menos arrasador? Não, não
é não! Claro que não! O feroz cataclismo alterou para sempre a
realidade de milhares de habitantes do Japão, além de suprimir a
vida de pelo menos duas dezenas de milhar de outros.
Estamos
todos sujeitos a esse tipo de fenômeno, absolutamente imprevisível.
E de pagar, diga-se de passagem, por nossa imprudência quer na
conduta pessoal, quer na coletiva. Octávio Paz acentua: “O futuro
que nos aguarda pode muito bem não ser o lugar de uma perfeição
almejada por nós, mas sim a eclosão de catástrofes; a explosão
populacional, a poluição, as catástrofes políticas, a física
moderna com seu arsenal nuclear, a destruição antiecológica de
todos os recursos da Terra que permitam a vida nela. A sociedade
diante da hecatombe atômica, não pode crer muito no futuro”. Mas
crê, eu aduziria. E essa crença, pelo exposto por este que sempre
se constituiu em um dos meus escritores prediletos, não é nada
realista e muito menos pragmática.
Há
algum exagero nas observações de Octávio Paz? Obviamente que não.
O terceiro milênio começou com o Planeta abrigando um contingente
estimado em 5,3 bilhões de habitantes. Bastaram onze anos, porém,
para que já esteja batendo nos 7 bilhões. Todavia, os recursos da
Terra não se ampliaram nada, nada.
Há
uma infinidade de novas bocas para alimentar, sem que o solo
agriculturável haja se expandido ou se tornado minimamente mais
fértil. Pelo contrário! A lógica é a de que, em algum ponto do
futuro, que pode estar muito próximo ou relativamente distante,
faltará o básico, o essencial, a comida, para assegurar a
sobrevivência de muitos, se não de todos. Isso sem falar na água
potável, que tende a se tornar no elemento mais precioso, muitíssimo
mais que o petróleo, por ser vital e se tornar cada vez mais
escasso.
Octávio
Paz também acentua: “Os últimos decênios da história da
humanidade foram uma repetição do passado. Se hoje em dia não nos
prostramos mais diante de uma deificação da natureza, sabemos,
porém, que temos que viver em harmonia com a natureza, da qual o
homem não é o centro, mas apenas um de seus elementos
constitutivos. De modo que o centro afetivo do homem moderno se
encontra agora entre a nostalgia do passado e a utopia do futuro. No
entanto temos que nos lembrar de que hoje é vida, mas também é
morte”.
Onde
a solução? Ela existe? No que consiste? Como encontrá-la e
aplicá-la? Essas são as questões que deveriam nos mobilizar, mesmo
que nunca encontremos respostas. É incômodo pensar nisso? Claro que
é. Mas há como fugir, quer hoje, quer amanhã, quer algum dia?
Arremato estas reflexões como as iniciei, ou seja, citando mais uma
vez Octávio Paz, que conclui: “Saber que somos mortais nos leva a
indagar que futuro melhor nos espera? A ameaça de aniquilação do
mundo deu novo e redobrado valor à hora presente. A presença é um
novo erotismo fundado, não na eternidade, mas no aqui e no agora”.
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
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