Tormentas de outubro
Pedro J. Bondaczuk
O mês de outubro parece ter
sido destinado às tragédias, neste ano. Algumas, como a morte do
deputado Ulysses Guimarães, foram ditadas pelo acaso. Outras, como o
massacre na Casa de Detenção de São Paulo, ou como a rebelião na
unidade da Febem do Tatuapé, também na Capital, ocorreram por
falhas humanas e, principalmente, pela inadequação do nosso sistema
social, ainda perverso, imperfeito, discriminador e um tanto cínico.
Tanto acontecimento negativo
fez com que muita gente sequer se desse conta da passagem do primeiro
mês de aprovação, pela Câmara dos Deputados, da abertura do
processo de impeachment contra o presidente afastado, Fernando
Collor, com seu consequente afastamento do cargo.
O vice em exercício, Itamar
Franco, embora com amplo respaldo parlamentar, apesar de ter
externado boas intenções, foi como que tomado por inexplicável
paralisia. Sugestões para deter a crise econômica e minorar o
sofrimento de milhões de “descamisados” foram feitas às
dezenas. Mas de prático, de efetivo, de algo que tenda a devolver a
esperança a esse povo que a tem como autêntica profissão de fé
(mas que se acha desesperançado diante do quadro atual), nada se
fez. Até a escolha do novo ministério se deu com uma enervante
lentidão, embora se faça um desconto neste caso, diante da
necessidade de se costurarem acordos políticos com as mais diversas
facções e tendências.
A pergunta que certamente
Itamar deve estar se fazendo é: como dar aos cidadãos aquilo que
eles esperam do seu governo? O que fazer para administrar os
conflitos inerentes a uma sociedade democrática? Como satisfazer os
interesses conflitantes e ficar bem com todos?
Em primeiro lugar, esta última
premissa é impossível de ser satisfeita. O deputado Delfum Netto
costuma fazer uma citação que, embora óbvia, até mesmo acaciana,
é esquecida por muitos. “Para que alguém ganhe algo, sempre
haverá quem saia perdendo em contrapartida”, afirma o parlamentar.
O deputado mineiro, que
brilhantemente atuou na vida pública em fins do século passado,
Carneiro Leão, dá a receita correta para um governante atender aos
interesses nacionais, ao preceituar: “Para dar à Nação o que ela
pretende, basta obedecer à Constituição”.
Uma ação tão simples, no
entanto, nem sempre é executada (para não dizer quase nunca). As
cartas constitucionais brasileiras (e com a atual, o País já teve
oito delas) têm sido deixadas de lado exatamente por aqueles que,
juram se tornar seus guardiões.
Outro político famoso,
Teófilo Otoni, foi mais longe ao aclarar o espírito da nossa lei
maior. Afirmou: “São direitos inalienáveis, imprescritíveis e
sagrados: a liberdade, a segurança, a propriedade e a resistência à
opressão”.
Tais prerrogativas, e todas
simultaneamente, nunca podem ser suprimidas dos cidadãos, sob pena
de se criar, no lugar de uma nação, um caótico acampamento de
refugiados, onde a lei das selvas, com o mais forte oprimindo e
escravizando o mais fraco, passando a imperar. Uma sociedade dessas
não tem condições sequer de falar em futuro.
(Artigo publicado na página
2, Opinião, do Correio Popular, em 29 de outubro de 1992)
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