A Clonagem Humana
Pedro J. Bondaczuk
As declarações do cientista
norte-americano Richard Seed, em entrevista dada a uma pequena
emissora de rádio do Estado de Illinois, nos Estados Unidos,
afirmando que fará um clone humano em no máximo um ano e meio,
causaram furor no mundo. Em pouco tempo, suas palavras chegaram aos
principais veículos de comunicação, Planeta afora, gerando
imediatas reações e alguma inquietação.
Alguns mostraram-se descrentes
da possibilidade. Outros apontaram a inutilidade das experiências.
Outros, ainda, ressaltaram seus óbvios riscos. O que se temia,
quando da clonagem da ovelha Dolly, em 1996, por parte da equipe dos
laboratórios escoceses "PPL Therapeutics" --- e que vários
governos e a própria ONU tentaram evitar, mediante aprovação de
resoluções e de legislação restritiva --- está portanto prestes
a acontecer. Ou pelo menos de ser tentado.
Os debates em torno da questão
desenrolaram-se no correr de todo o ano passado, envolvendo médicos,
biólogos, técnicos em engenharia genética, juristas e
legisladores. Na opinião da maioria, tal prática, envolvendo seres
humanos, deveria ser absolutamente proibida, por apresentar, além de
questões éticas absolutamente inaceitáveis, riscos de mutações,
entre outros.
É desnecessário repetir os
argumentos em contrário, do ponto de vista moral, apresentados desde
então. Aliás, especialistas renomados na área duvidam que Richard
Seed, que afirma ter obtido doutorado de Física na Universidade de
Harvard e que, portanto, sequer é biólogo, reúna conhecimentos
técnicos suficientes para empreender a experiência.
Os pesquisadores do instituto
PPL tiveram frustradas pelo menos 277 tentativas, antes que Dolly
pudesse ser "produzida". De qualquer forma, a própria
intuição "nos cochicha" que um dia, em algum lugar, com
respaldo legal ou sem ele, e por mais hediondo, perigoso e
desnecessário que seja esse procedimento, alguém vai tentar (se é
que já não se tentou) e terá êxito, produzindo "replicantes"
humanos. É a vida copiando a ficção, como no caso do submarino
nuclear Nautilus, preconizado por Júlio Verne e de tantos outros
inventos, que concretizaram a imaginação de escritores.
A esse propósito, o biólogo
Jean Rostand já havia previsto --- e a previsão consta no "The
People's Almanac", de David Wallace e Irving Wallace, publicado
em 1973 nos Estados Unidos --- a possibilidade de clonagem, inclusive
de pessoas.
"A partenogênese,
reprodução por meio de um gameta não fecundado, será algum dia
possível. Poderemos então ter tantas cópias exatas de um homem
excepcional quantas desejarmos", afirmou o cientista na ocasião.
Na época, ou foi ignorado pela maioria, ou não foi levado a sério.
Lamenta-se que preciosos
recursos, que deveriam ser destinados a pesquisas mais relevantes e
urgentes de maneiras de curar doenças e de acabar com a fome e a
miséria, sejam desperdiçados para que alguns "brinquem"
de ser Deus. O maior problema no mundo contemporâneo, aliás, não
é o da falta de pessoas. É exatamente o contrário: o da
superpopulação. E nos países mais miseráveis e injustos do
Terceiro Mundo. E isto com os nascimentos ocorrendo pelos processos
naturais!
Aliás, a "pretensão à
divindade" foi explicitada por Richard Seed para justificar sua
tentativa de clonar seres humanos. "Seguimos o caminho de nos
tornarmos Deus. Vamos ter quase tanto conhecimento e poder quanto
Deus", afirmou. É esse tipo de mentalidade que chega a ser
arrepiante quando se lida com o maior mistério da natureza: o da
vida.
(Editorial número um,
publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 9 de janeiro
de 1998).
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