Tuesday, May 22, 2018

DIRETO DO ARQUIVO - A clonagem humana


A Clonagem Humana


Pedro J. Bondaczuk


As declarações do cientista norte-americano Richard Seed, em entrevista dada a uma pequena emissora de rádio do Estado de Illinois, nos Estados Unidos, afirmando que fará um clone humano em no máximo um ano e meio, causaram furor no mundo. Em pouco tempo, suas palavras chegaram aos principais veículos de comunicação, Planeta afora, gerando imediatas reações e alguma inquietação.

Alguns mostraram-se descrentes da possibilidade. Outros apontaram a inutilidade das experiências. Outros, ainda, ressaltaram seus óbvios riscos. O que se temia, quando da clonagem da ovelha Dolly, em 1996, por parte da equipe dos laboratórios escoceses "PPL Therapeutics" --- e que vários governos e a própria ONU tentaram evitar, mediante aprovação de resoluções e de legislação restritiva --- está portanto prestes a acontecer. Ou pelo menos de ser tentado.

Os debates em torno da questão desenrolaram-se no correr de todo o ano passado, envolvendo médicos, biólogos, técnicos em engenharia genética, juristas e legisladores. Na opinião da maioria, tal prática, envolvendo seres humanos, deveria ser absolutamente proibida, por apresentar, além de questões éticas absolutamente inaceitáveis, riscos de mutações, entre outros.

É desnecessário repetir os argumentos em contrário, do ponto de vista moral, apresentados desde então. Aliás, especialistas renomados na área duvidam que Richard Seed, que afirma ter obtido doutorado de Física na Universidade de Harvard e que, portanto, sequer é biólogo, reúna conhecimentos técnicos suficientes para empreender a experiência.

Os pesquisadores do instituto PPL tiveram frustradas pelo menos 277 tentativas, antes que Dolly pudesse ser "produzida". De qualquer forma, a própria intuição "nos cochicha" que um dia, em algum lugar, com respaldo legal ou sem ele, e por mais hediondo, perigoso e desnecessário que seja esse procedimento, alguém vai tentar (se é que já não se tentou) e terá êxito, produzindo "replicantes" humanos. É a vida copiando a ficção, como no caso do submarino nuclear Nautilus, preconizado por Júlio Verne e de tantos outros inventos, que concretizaram a imaginação de escritores.

A esse propósito, o biólogo Jean Rostand já havia previsto --- e a previsão consta no "The People's Almanac", de David Wallace e Irving Wallace, publicado em 1973 nos Estados Unidos --- a possibilidade de clonagem, inclusive de pessoas.

"A partenogênese, reprodução por meio de um gameta não fecundado, será algum dia possível. Poderemos então ter tantas cópias exatas de um homem excepcional quantas desejarmos", afirmou o cientista na ocasião. Na época, ou foi ignorado pela maioria, ou não foi levado a sério.

Lamenta-se que preciosos recursos, que deveriam ser destinados a pesquisas mais relevantes e urgentes de maneiras de curar doenças e de acabar com a fome e a miséria, sejam desperdiçados para que alguns "brinquem" de ser Deus. O maior problema no mundo contemporâneo, aliás, não é o da falta de pessoas. É exatamente o contrário: o da superpopulação. E nos países mais miseráveis e injustos do Terceiro Mundo. E isto com os nascimentos ocorrendo pelos processos naturais!
Aliás, a "pretensão à divindade" foi explicitada por Richard Seed para justificar sua tentativa de clonar seres humanos. "Seguimos o caminho de nos tornarmos Deus. Vamos ter quase tanto conhecimento e poder quanto Deus", afirmou. É esse tipo de mentalidade que chega a ser arrepiante quando se lida com o maior mistério da natureza: o da vida.

(Editorial número um, publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 9 de janeiro de 1998).


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