Saturday, May 05, 2018

CRÔNICA DO DIA - Liberdade de expressão


Liberdade de expressão


Pedro J. Bondaczuk


Os meios de comunicação, com todas as suas deficiências, naturais quando se trata de alguma obra humana, são indispensáveis nas sociedades contemporâneas. Não se concebe, hoje em dia, uma civilização, que realmente mereça essa designação, sem telefones, jornais, rádio, televisão e internet, com sua multiplicidade de portais e de blogs, que não param de ser abertos.

O norte-americano Leon Martel constatou que "a informação está rapidamente substituindo a energia como principal recurso de transformação da sociedade". E nem é preciso recorrer a nenhuma citação de jornalistas, escritores, sociólogos, antropólogos ou de qualquer outro tipo de intelectual para essa constatação. A imprensa, fenômeno relativamente recente no mundo, veio para ficar. É (ou deveria ser) a guardiã da cidadania. Para que aja como tal, todavia, tem que ser absolutamente livre e independente.

A liberdade de imprensa, antes de se constituir num direito de profissionais e de empresas ligadas ao setor, é um bem da sociedade. Exige mobilização constante, vigilância permanente e postura firme e lúcida diante de fatos que representem ameaça ou que efetivamente a atinjam.

A liberdade de imprensa, certamente, contribui para o fortalecimento das instituições democráticas de um país. O jornalista exerce, diariamente, um trabalho constante e ininterrupto em favor da sociedade. Afinal, esta tem o direito constitucional à informação, plena, limpa e, sobretudo isenta, seja de que natureza for. A Constituição promulgada em 5 de outubro de 1988 estabelece, no inciso IX, do artigo 5º, que “é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença”.

Compete, pois, à sociedade, através das suas instituições e agentes, garantir e defender a imprensa livre. E não somente isso. Cabe-lhe, ao mesmo tempo, combater a impunidade dos crimes praticados contra profissionais e veículos de comunicação, que visem tolher, de alguma forma, a sua liberdade.

A unanimidade internacional é que os meios de comunicação são fiscais do poder público. A melhor tradição da liberdade de imprensa é a de que o aparelho do Estado não pode impor embaraços à publicação de informações de interesse da população.

Destaque-se que os servidores têm todo o direito de reclamar, de cobrar retificações e até de exigir reparações quando prejudicados pelo mau jornalismo, que infelizmente existe é mister reconhecer, baseado na mentira, no exagero ou na distorção dos fatos. O Código Penal, porém, capitula esses crimes contra a honra, como a injúria, a calúnia e a difamação.

Este direito dos ofendidos, todavia, só vigora após a divulgação da notícia. Qualquer ato do poder público, de restrição prévia à informação, atropela a conquista histórica da liberdade de imprensa, de velar pelo interesse público.

O profissional de comunicação, seja qual for a área em que atue, tem um compromisso e uma responsabilidade muito grandes para com o público que pretende atingir. O compromisso é o de adotar postura voltada para a prestação de serviços à comunidade, esclarecendo-a, orientando-a e atuando como o seu porta-voz. A responsabilidade, por sua vez, decorre exatamente do item anterior.

Quanto maior for a amplitude do meio que o comunicador utilizar, mais responsável ele terá que ser quanto ao que disser ou que escrever. Precisará, claro, ter muito critério e muita competência sempre. Deverá ser guiado por um elenco de pressupostos que vão desde o interesse à qualidade do que veicula; da técnica usada à utilidade da comunicação, passando, por aí, o bom-gosto, a inteligência e outras coisas mais, que o jornalista e/ou o radialista conhecem, ou deveriam conhecer de sobejo.

Quem não aceitar isso, espontaneamente, sem imposição ou pressões, estará, evidentemente, em profissão errada. A mensagem que o profissional de comunicação passar, embora possa ser endereçada a um determinado público, bastante específico, terá influências as mais variadas sobre tantas outras faixas da população. Tem que atentar, sempre, para o que, como, com que objetivo e a quem comunicar.

Um comunicador irresponsável pode, até mesmo, provocar sublevação popular, de conseqüências imprevisíveis, sem que sequer se dê conta e mesmo que não seja essa a sua intenção (quase nunca é). Veja-se, por exemplo, o que ocorreu nos países muçulmanos em decorrência da publicação, por parte de um jornal dinamarquês, da caricatura do profeta Maomé.

Que benefício, e a quem, essa divulgação (no fundo, no fundo, preconceituosa) trouxe? Qual a necessidade de se mexer com as crenças e convicções alheias, mesmo as que consideremos ridículas e frutos do atraso (não é o caso), utilizando, como pretexto, o direito da liberdade de expressão? Convém ressaltar e sempre reiterar que um comunicador tem a possibilidade concreta de influenciar idéias, costumes, comportamentos e ações em uma sociedade. Quanto mais liberdade tiver, portanto, maior será, em contrapartida, a sua responsabilidade.

O jornalista tem que ter em mente que os personagens das histórias que traz a público – trágicas ou cômicas, coletivas ou individuais, envolvendo ora atos sublimes e nobres, ora crimes escabrosos e hediondos (estes, infelizmente, em maior quantidade) – não são imaginários, como os criados pelos escritores de ficção: romancistas, novelistas ou roteiristas de cinema. Envolvem seres reais, de carne, osso, sangue e vísceras, com reações e emoções contraditórias, com sonhos, recalques, desvios, alegrias e decepções. Tem que se conscientizar que está lidando com "pessoas", não com sombras ou conceitos.

Deve ter em mente que a "matéria-prima" do seu trabalho é o ser humano, com suas deficiências, virtudes, taras, grandezas, interesses e mesquinharias. Não pode nunca se esquecer de que, a mais leve insinuação, por mínima que seja, sobre desvios de conduta de alguém, sua moral ou sua forma de pensar, trará conseqüências, muitas vezes irreversíveis, para esse indivíduo. Pode destruí-lo. Daí a necessidade do profissional de jornalismo (repórter, editor, comentarista etc.) ser justo, imparcial e honesto no que faz.

Comunicação, porém, não é somente jornalismo. A televisão, em seus programas de entretenimento, principalmente novelas e filmes, influencia comportamentos, para o bem ou para o mal. Mencione-se, por exemplo, o desvirtuamento que se vem fazendo, em determinados canais (e isso não é de hoje) e em alguns horários nem sempre apropriados, da arte do erotismo. Seu limite, em relação à pornografia, é sutil, sutilíssimo e nem todos os expectadores têm critério ou maturidade suficientes para fazer a distinção.

Não defendo, evidentemente, nenhum tipo de censura. E, como já ressaltei, a Constituição brasileira a proíbe. O que é necessário é que o próprio comunicador, autor de novela, roteirista de filme ou mesmo escritor de romances tenha autocrítica. Que pergunte, a si mesmo, se tem algo inteligente, proveitoso, interessante e construtivo a dizer (ou a escrever, claro). Se a resposta for positiva, que o diga. Caso contrário...

Para se destruir algo ou alguém, seja lá o que ou quem for, não é preciso ser criativo, dispor de muita técnica ou ter um pouquinho a mais de massa cinzenta que os mortais comuns. Construir, porém, é tarefa de gigantes, de pessoas especiais, talentosas e de grande visão. Será que é válido, por uma certa importância em dinheiro (e não importa quanto), um intelectual se expor ao ridículo e alterar (para pior) o comportamento de pessoas mais simples e menos dotadas de capacidade de análise?

Pode-se, grosso modo, destacar quatro funções básicas da imprensa livre. A primeira, é fazer com que os líderes do governo, em seus três poderes, prestem contas à população, da qual são originários e à qual representam. A segunda, é divulgar assuntos que pedem a atenção da opinião pública, não importa se positivos ou negativos. A terceira é informar os cidadãos para que possam tomar decisões, em suas vidas e seus negócios, conscientes e fundamentadas em fatos. E, finalmente, quarta, é a de criar conexões entre as pessoas na sociedade civil.

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