A linguagem do povo
Pedro J. Bondaczuk
.
Um leitor assíduo das minhas crônicas, tanto em jornais quanto nos
vários sites e blogs da internet em que participo ativamente,
questiona-me sobre a validade ou não do escritor se utilizar da
“linguagem do povo”, aquela falada no dia a dia – sem
preocupações com concordância, regência, conjugação correta de
verbos, utilização de pronomes etc. – em textos literários.
Minha resposta é a mesma que dei quando fui questionado sobre o uso
de palavrões. Eu, particularmente, não gosto de usar e raramente me
utilizo desse expediente. Todavia, em determinadas circunstâncias e
ocasiões, isso não somente é válido, como até se impõe.
No entanto, o escritor deve deixar claro que é seu personagem que
fala errado e não ele que não conhece português. Afinal, queira ou
não, tenha ou não essa consciência, ele é o guardião por
excelência do idioma. Tanto que, determinadas expressões que geram
dúvidas nos gramáticos quanto à sua correção, são catalogadas
pelos dicionaristas como válidas com base, muitas vezes, apenas no
seu uso por escritores consagrados. Você pode observar isso, por
exemplo, em algumas expressões no dicionário do mestre Aurélio.
Caso você esteja escrevendo um romance, em que algum de seus
personagens (ou todos) seja um sujeito iletrado (analfabeto ou não,
não importa) não irá convencer ninguém se o puser dialogando num
português impecável, perfeito, castiço, de forma que nem mesmo o
mais erudito dos eruditos utiliza no cotidiano. A história ficará
inverossímil se o fizer.
O necessário, porém, é ter cuidado para não exagerar na dose. É
como certas bebidas alcoólicas: tomadas em pequenas doses, servem
como aperitivo, mas se você tomar a garrafa toda... E,
principalmente, não misture erros gramaticais seus, pessoais, com os
dos personagens. Detecte-os, no processo de revisão, e corrija-os de
imediato.
Aliás, se o escritor for relaxado em seu linguajar, sequer
encontrará editor que tope embarcar nessa canoa furada com ele (para
não partilhar do ridículo). Seu livro nascerá “morto”, ou
seja, permanecerá inédito, a menos que o banque do próprio bolso.
E se o fizer, por um excesso de vaidade que o cegue ao ponto de
perder a noção de autocrítica, certamente irá arcar com
monumental prejuízo, por falta de leitores que se habilitem a
comprar tamanha baboseira.
Muitos escritores de primeiríssima linha reproduziram a linguagem do
povo em diálogos de personagens (quando isso se impunha, claro) em
romances de grande sucesso. Mas fizeram-no com bom-senso, elegância
e, sobretudo, pertinência. É isso o que lhe recomendo, caríssimo
leitor.
Por sua pergunta, concluo que você é aspirante a escritor.
Mande-me, pois, seus textos, sem nenhum receio de eventuais prejuízos
à sua imagem, pois prometo, caso sejam bons, publicá-los (como faço
com todos os que me procuram) e, em caso contrário, juro que não o
exporei ao ridículo. Se houver erros insanáveis para um editor,
comprometo-me a analisá-los exclusivamente com você, em um e-mail
particular. Ninguém saberá, a não ser nós dois, ok?
Mas não tenha receio de se expor. Submeta-se à crítica, que é
sempre saudável. Ela pode ser muito mais didática do que um montão
de aulas teóricas de literatura. Ademais, ninguém é infalível e
nem nasceu sabendo das coisas, não é mesmo?
No comments:
Post a Comment