Sunday, February 07, 2016

Votar é muito importante mesmo que não se saiba como

Pedro J. Bondaczuk

O presidente argentino, Raul Alfonsin, enfrenta, amanhã, nas urnas, teste decisivo, que pode marcar o perfil de como vai ser seu final de mandato. Se ele terá ou não condições de cumprir seu arrojado programa reformista, visando modernizar a economia e a sociedade do seu país, ou se ficará com as mãos amarradas por causa de um Parlamento hostil, será decidido nestas eleições. Mais de 19 milhões de eleitores irão votar, neste domingo, para renovar a metade da Câmara dos Deputados, onde o partido do governante, a União Cívica Radical, dispõe de fragílima maioria de somente três cadeiras. E o peronismo jogou todas as suas fichas nessa campanha eleitoral, cujo brilho foi empanado na última hora pela violência sectária que tomou conta, anteontem, dos militantes das duas principais facções políticas.

Os justicialistas usaram uma tática velha para recuperar o prestígio que perderam. Promoveram greves e mais greves em todo o país, aproveitando-se das dificuldades enfrentadas pelas autoridades econômicas com o Plano Austral, que no seu começo foi decantado como a oitava maravilha do mundo atual, mas que agora demonstra ser (a exemplo do seu irmão brasileiro, o Cruzado) um barco cheio de rombos, fazendo água por todos os lados (embora tenha sobrevivido por muito mais tempo do que o seu similar). Parte considerável dos comícios em praças públicas foi ocupada com o tema da dívida externa.

Mágicos maravilhosos, desses acostumados a tirar coelhos da cartola (quer no final das contas se revelam não passar de ratos) fizeram as mesmas promessas mirabolantes e irrealísticas de sempre. Pregaram rupturas espetaculares com o sistema financeiro internacional, como se isso fosse simples, ou sequer factível, num mundo a cada dia mais caracterizado pela interdependência. Outros prometeram acabar com o desemprego, com a inflação e com a recessão, num abrir e fechar de olhos, como se soluções desse porte estivessem dando sopa por aí. Enfim, foram usadas as velhas e manjadas artimanhas políticas de sempre para ludibriar os incautos, como em todos os lugares em que a atividade pública é considerada mera sinecura, neste atrasado e infeliz Terceiro Mundo.

Mas os eleitores, certamente, saberão separar o joio do trigo. E mesmo que não saibam, e mais uma vez venham a se equivocar em sua escolha, a simples realização de uma eleição, num continente não muito acostumado à democracia, é algo que deve ser festejado. De tanto errar, um dia as pessoas vão aprender a votar, se puderem praticar. Tudo é uma questão de tempo e de exercício.


(Artigo publicado na Editoria Internacional, do Correio Popular, em 5 de julho de 1987)

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