Saturday, February 20, 2016

Quando a cautela jamais é excessiva



Pedro J. Bondaczuk



Os vários grupos terroristas que agem, em especial na Europa e no Oriente Médio, estão (felizmente) numa espécie de recesso durante este quase um semestre de 1987, após um início de ano fulminante, principalmente no Líbano, quando em apenas uma semana de janeiro, cerca de 15 personalidades estrangeiras foram seqüestradas.

Entre estes reféns estava o negociador da Igreja Anglicana, Terry Waite, de quem não se ouviu falar mais desse o dia 20 desse tenso e violento mês. Entretanto, estes estados de hibernação do terror – conforme a experiência através dos anos tem mostrado – costumam ser, muitas vezes, catastróficos.

E tudo leva a crer que a temporada de verão na Europa, que começa em junho próximo, deverá ser das mais agitadas. Não somente em virtude da ameaça, deixada ontem, na sede de uma agência de notícias ocidental, em Paris, através de uma carta dos terroristas, mas por causa de outras evidências até mais preocupantes.

Esses grupos de fanáticos, que têm no terror o seu único argumento, vivem procurando pretextos para agir. No ano passado, eles sofreram inúmeros reveses, na França, na Itália, na Alemanha Ocidental e na Áustria, com vários de seus membros capturados, julgados e condenados a longas penas de prisão.

No entanto, com base em situações análogas anteriores, é possível de se prever que essas entidades estejam agora se movimentando mais do que nunca nas sombras, maquinando retaliações as mais sinistras e bestiais. Bastará uma ligeira abertura na guarda, uma mínima vacilação das forças de segurança, para que mais bombas voltem a atingir pessoas inocentes e alheias às controvérsias ideológicas.

Quanto aos seqüestros no Líbano, não se deve esperar nada de dramático, pelo menos até o mesmo período de meio de ano de 1988, quando a França e os Estados Unidos estarão ultimando suas campanhas presidenciais para as respectivas sucessões de François Mitterrand e de Ronald Reagan.

No mês passado, uma facção xiita libanesa e um membro influente do clero dessa seita anunciaram, explicitamente, isso. Disseram que os reféns dessas duas nacionalidades não seriam executados e nem postos em liberdade antes dessa ocasião. Ou seja, essas entidades radicais pretendem pressionar a opinião pública desses dois países para influenciar nos correspondentes resultados eleitorais, se é que isso é possível.

A ser válido e verdadeiro esse raciocínio, talvez os cativos alemães ocidentais e britânicos venham a ser postos em liberdade até agosto próximo. O primeiro desses dois Estados já teve suas eleições, com a tranqüila reeleição dos integrantes da coalizão que sustenta politicamente o chanceler Helmut Kohl, que garantiu, sem muitos sustos, um novo mandato.

Na Grã-Bretanha, a votação vai ocorrer no dia 11 próximo. Aguarda-se, sobretudo, e com muita expectativa, qualquer notícia acerca de Terry Waite, que foi ao Líbano com uma missão bastante nobre, qual seja, a de negociar a liberdade de cativos estrangeiros, e acabou sendo retido por lá.

Entretanto, o representante da Igreja Anglicana calculou mal a época de iniciar sua humanitária tarefa. Foi a Beirute no auge de uma disputa entre facções muçulmanas, outrora aliadas, pelo controle do setor ocidental da capital. Assim que desembarcou no país, a milícia drusa o tomou sob a sua proteção, com a melhor das intenções, ciente dos perigos que os estrangeiros estavam correndo na oportunidade.

Foi o que bastou para transformar o negociador britânico, candidato ao Prêmio Nobel da Paz de 1987, no alvo predileto dos xiitas, justamente aqueles com quem ele iria negociar e de cuja presença não poderia, portanto, escapar.

Desde que ele desapareceu, muita coisa já foi dita a esse respeito. O jornal alemão “Bild” chegou a informar que Waite teria sido gravemente ferido por seus captores, notícia que não foi confirmada por nenhuma fonte (e nem desmentida), embora deixasse muita inquietação atrás de si.

O risco, portanto, no próximo verão do Hemisfério Norte, salvo alguma dramática mudança no quadro atual, não vai residir no Oriente Médio. Estará focado na Europa e, mais especificamente, na França, Itália, Áustria e Alemanha Ocidental.

Os extremistas prometeram uma temporada muito quente, virtualmente fervendo, no continente. E convém que eles sejam levados a sério, para que tragédias possam ser evitadas e não se lamente depois pela falta de cautela. Em tais ocasiões, todo o zelo que se tenha, por maior que seja, jamais chega a ser excessivo.

(Artigo publicado na página 10, Internacional, do Correio Popular, em 26 de maio de 1987).


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