Friday, February 12, 2016

Sucessão suscita indagações


Pedro J. Bondaczuk


A subida, ontem, de Mikhail Gorbachev ao cargo máximo da União Soviética, embora esperada há tempos por observadores ocidentais e prevista por nós com grande insistência desde dezembro do ano passado (quando do agravamento da enfermidade de Constantin Chernenko, desperta em todos esperanças, expectativas e uma série de indagações.

Pelo fato do novo secretário-geral do PC da URSS ser o primeiro da geração pós-Stalin, espera-se que imprima um ritmo mais moderno à administração da superpotência do Leste e que liberalize o regime, seguindo o exemplo chinês, aproximando-se um pouco mais do Ocidente e quebrando o permanente clima de tensão reinante no mundo.

Enquanto ele não se manifesta, contudo, em algo que realmente seja importante em nível internacional, permanece a expectativa de como costuma agir, como encara os problemas do nosso tempo e qual a contribuição que tem para oferecer à promoção da paz mundial. E o que não faltam, em relação a Gorbachev, são interrogações.

O que o levou a ter um crescimento tão meteórico na rígida estrutura do poder soviético, onde geralmente os grandes comandantes têm que galgar com enervante lentidão os postos secundários, até atingir o topo da escada da fama?

Qual a sua visão do confronto Leste-Oeste e da exportação da revolução? O que ele pensa da “détente” e da estratégia MAD (“Mutual Assured Destruction), o chamado “equilíbrio do medo”, segundo o qual, enquanto existir a possibilidade da mútua destruição garantida das duas superpotências, não haverá um conflito nuclear?

E em relação ao Terceiro Mundo (que é o que nos interessa mais de perto), qual será a sua forma de agir? Continuará baseada na permanente tentativa de infiltração nos países mais pobres, se valendo de seus problemas internos para desestabilizar seus regimes e colocar no poder governos marxistas que orbitem ao redor da irresistível influência de Moscou?

Ou se limitará a conservar o marxismo (posto que profundamente descaracterizado) apenas no âmbito da própria União Soviética? E em relação aos satélites do Leste europeu? Permitirá que cada um siga seu próprio caminho, de acordo com as características e peculiaridades próprias, ou prosseguirá imitando Kruschev e Brezhnev, invadindo (a exemplo do que fizeram aqueles dois líderes em relação à Polônia, Hungria e Checoslováquia) os que ousarem ao menos pensar em liberalização?

Como se vê, indagações existem até de sobra. Embora haja, também, muita esperança de que o mundo possa, finalmente, respirar um pouco mais aliviado, sem uma competição tão acirrada e ostensiva, que envolve indistintamente a todos, como a atual guerra sem declaração formal de União Soviética e Estados Unidos.

Que possamos assistir ao início de uma nova era (que ainda não passa de mera e delirante utopia dos que teimam em crer no bom senso humano) de cooperação e respeito entre as nações para a solução de questões muito mais urgentes do que saber qual dos gigantes é o maior, tais como a fome, o desemprego, as moléstias, a mortalidade infantil...

(Artigo publicado na página 21, Internacional, do Correio Popular, em 12 de março de 1985).


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