Monday, February 29, 2016

Treze países decidem por todos


Pedro J. Bondaczuk


A estratégia da Europa Ocidental e dos Estados Unidos em relação aos Estados ditos terroristas do mundo árabe, no caso Líbia, Síria e Irã, é a de isolar esses países, tanto econômica, quanto diplomaticamente. O objetivo, apregoado pelos europeus, é tornar seu continente livre de atentados e dar mais segurança a seus cidadãos na área do Mar Mediterrâneo. Dessa maneira, nos últimos dias vimos uma sucessão de expulsões de diplomatas, de estudantes e até de empresários, especialmente líbios, da Itália, da França e da Espanha, com a correspondente represália do governo de Tripoli.

Desde sábado, a Síria entrou nessa "ciranda maluca", diferente de tudo o que já se viu em tempos de paz. Em relação ao Irã, desde 1979, quando do incidente da ocupação da embaixada norte-americana em Teerã, esse país tem sido considerado "non grato" à dita civilização ocidental.

Essas medidas, ao nosso ver, são contraproducentes e até certo ponto perigosas. É verdade que a curto prazo podem inibir o terrorismo. Isso, se os Estados acusados de serem seus patrocinadores realmente forem aquilo que deles se diz. Pelo menos enquanto o assunto ainda ocupa as manchetes e outro fato não esteja desviando as atenções internacionais, eles não podem nem treinar, nem dar apoio logístico e nem sequer esconder grupos terroristas. Se o fizerem, correm o risco de ter seus interesses econômicos ainda mais comprometidos e, em caso extremo, até de sofrer represálias armadas.

Como medidas de emergência, para frear as ações terroristas, pode ser um expediente válido, ainda que contestável. Mas as providências, para serem duradouras, precisarão ter um caráter mais amplo. Ser mais discutidas, envolver maior número de parceiros (se possível, toda a comunidade mundial) e não podem, portanto, ficar restritas apenas aos "treze" cardeais do mundo moderno.

Há várias hipóteses a considerar quanto à questão, mas duas se destacam de imediato. A primeira admite que os segregados são, realmente, Estados terroristas. Neste caso, com o isolamento (que certamente será compensado por uma aproximação maior com a União Soviética), eles terão condições de formar de fato os "esquadrões-suicidas" de que tanto o líder líbio Muammar Khadafy vem falando, nos últimos tempos, sem que sejam molestados por ninguém.

Nessas circunstâncias, os futuros atentados seriam cometidos sem que se deixasse nenhuma pista ligando os extremistas a seus patrocinadores. Isso não é muito difícil e os europeus sabem que não é. A segunda hipótese, considera que os Estados ora isolados nada têm a ver com o terror. Em tal circunstância, além das ações extremistas não diminuírem em tempo algum, os diversos grupos passarão a contar com a simpatia dos que foram acusados sem dever. Nesse caso, nem mesmo um ataque nuclear limitado conseguirá conter a violência, que então explodirá e tenderá a se generalizar.

Essa história de um país punir a outro já trouxe muita dor de cabeça no presente século a toda a comunidade mundial. Chegou, até, a causar duas guerras mundiais, cujas conseqüências ninguém mais do que o europeu conhece tão bem. Mesmo assim, o expediente volta a ser usado, somente aumentando ainda mais as tensões e consolidando antagonismos. E a Organização das Nações Unidas, para o que serve? E o Conselho de Segurança? E a Corte Internacional de Justiça de Haia? O mundo, acaso, tornou-se feudo exclusivo da poderosíssima "Trilateral"? Tudo leva a crer que sim!

(Artigo publicado na página 12, Internacional, do Correio Popular, em 13 de maio de 1986)


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