Friday, February 19, 2016

Ianomâmis em extinção



Pedro J. Bondaczuk


As notícias sobre o processo de extermínio dos índios ianomâmis, par parte de garimpeiros no Estado de Roraima, se sucedem. A imprensa dá ampla cobertura aos fatos, as autoridades prometem tomar providências, mas o tempo passa e tudo continua na mesma.

Enquanto isso, dezenas, centenas, quando não milhares de seres humanos, que outrora constituíram nações fortes e orgulhosas, seguem morrendo, pelo simples “crime” de terem concepções de vida, costumes e visão do mundo diferentes dos praticados pelos ditos civilizados.

Nos últimos dias, divulgaram-se duas informações envolvendo tais comunidades. Uma dá conta de que os garimpeiros que ocupam ilegalmente as terras dos ianomâmis mataram, na quinta-feira passada, dois líderes desse povo, sendo um deles o cacique Lourenço, num estúpido massacre praticado na Maloca Halomais, a 500 quilômetros de Boa Vista.

A outra notícia é, inclusive, mais preocupante, a ponto de mobilizar o próprio ministro da Saúde, Alceni Guerra. Trata-se de um surto de oncocercose, doença que destrói o globo ocular e cega as pessoas que a contraem, e que já se espalhou entre cinco mil índios. Além disso, a malária dizima aldeias inteiras, acompanhada de outras moléstias igualmente mortais, como o sarampo e a tuberculose.

É lamentável que em plena era da comunicação total, às vésperas do século XXI, ainda haja tantos e tão tolos preconceitos entre os ditos civilizados. Os indígenas – e isto não vale apenas para o Brasil, mas para Equador, Venezuela, Bolívia e Peru, entre outros – são tratados como se não fossem humanos. Basta que se lhes imponha esse rótulo de “índios” – por sinal, inadequado, surgido do equívoco de Cristóvão Colombo, que ao descobrir a América, pensou ter chegado à Índia – para que tais pessoas sejam despidas da sua humanidade.

A sociedade, por desencargo de consciência, faz um certo alarido quando casos como o massacre na Maloca Halomais ou do surto de oncocercose são divulgados. Intelectuais deblateram, grupos que buscam mais aparecer do que fazer algum bem a quem quer que seja promovem marchas, passeatas e “happenings”, até que outro assunto da moda desperte sua atenção.

Em pouco tempo, ianomâmis ou sejam lá que tribos forem, serão rapidamente esquecidos. Suas terras são ilegal e impunemente invadidas, seus membros são dizimados em confrontos armados com os invasores, sua gente é contaminada por doenças que no seu isolamento sadio nunca antes havia tido, tudo isso nos bastidores. Longe das câmeras de televisão, dos editoriais e das manifestações dos eternamente festivos “salvadores da pátria”. Triste destino. 

(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 12 de setembro de 1990)


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