O marco inicial da
Filosofia do Ocidente
Pedro
J. Bondaczuk
O primeiro filósofo
ocidental de que se tem notícia é Tales, natural da cidade da Ásia Menor de
Mileto, no Sul da Jônia. Isso, em termos cronológicos. Essa primazia, no
entanto, deve-se exclusivamente ao fato de ser o primeiro cujo pensamento foi
registrado e chegou até nós. “Mas como?!”, perguntará o pesquisador da História
da Filosofia que saiba que nenhum dos escritos desse emérito pensador
sobreviveu ao desgaste do tempo. Mesmo sem que nenhuma de suas obras tenha
ficado incólume, no entanto, suas idéias filosóficas não “morreram”. Sua
sobrevivência deve-se ás pesquisas do historiador e biógrafo grego Diógenes
Laércio, aos comentários eruditos de Simplício de Cilícia e, principalmente, a
Aristóteles, que tratou delas com detalhes em seus livros.
Tales, portanto, foi
instituído como uma espécie de “marco” inicial da Filosofia do Ocidente, que
teve seu ponto de partida, registrado, na Grécia Antiga. Isso não quer dizer
que não houve filósofos que o antecederam. Houve, e muitos (cuja quantidade, é impossível de determinar), quiçá milênios
antes desse ilustre cidadão de Mileto, descendente de fenícios, nascer. Ocorre
que dos verdadeiros pioneiros não restaram ínfimos registros, nem mesmo de seus
nomes, quanto mais de suas idéias. E Tales só não teve idêntico destino graças
ao empenho dos pesquisadores que citei. Ou seja, de Diógenes Laércio e a
biografia que escreveu, de Simplício de Cilícia (comentador da obra de
Aristóteles) e, principalmente, deste filósofo que teve seus trabalhos
comentados, nos quais cita, a todo o momento, as idéias filosóficas do cidadão
de Mileto.
E o que Jostein Gaard
diz a respeito desse “pioneiro oficial” da Filosofia Ocidental em seu livro “O
mundo de Sofia”? O escritor norueguês escreve: “(...) O primeiro filósofo de
que ouvimos falar foi Tales, da colônia grega de Mileto. Ele viajou bastante
pelo mundo. Entre outras coisas, diz-se que ele calculou a altura de uma
pirâmide no Egito medindo a sombra da pirâmide no exato instante em que sua
própria sombra tinha o mesmo comprimento da sua altura. Ele também teria
previsto um eclipse solar no ano 585 a.C. (...)”. Mesmo que não se aceite Tales
como o pioneiro da Filosofia Ocidental (embora haja consenso a propósito), esse
pensador merece, pelo que se conhece a seu respeito, todo o respeito e
veneração que se possa tributar a um gênio, que de fato foi e que revolucione o
mundo das idéias, lançando as bases das ciências. E ele foi, mesmo, genial. Se
não, vejamos.
Além de filósofo, foi
matemático, autor, entre outros tantos princípios da ciência dos números, do
famoso teorema que leva seu nome (o que propõe, como hipótese, que ele
brilhantemente demonstrou, que “se duas retas transversais são cortadas por um
feixe de retas paralelas, então a razão entre quaisquer dois segmentos
determinados em uma das transversais é igual à razão entre os segmentos
correspondentes à outra transversal”). Mas não foi só isso (o que já seria o
bastante para imortalizá-lo). Tales foi engenheiro, projetando e construindo
complicadas engenhocas, sem nenhum dos recursos e ferramentas de que hoje
dispomos. Ou seja, foi uma espécie de “Professor Pardal” da Grécia Antiga. Só
isso? Ainda não. Tales de Mileto foi astuto homem de negócios e respeitável
astrônomo, o primeiro a explicar o eclipse solar, ao verificar que a Lua é
iluminada pelo Sol e não o contrário, como então se supunha.
Jostein Gaard, porém,
enfatiza a principal razão do gênio de Mileto ser tido e havido como o pioneiro
da Filosofia Ocidental. Escreve: “(...) Tales dizia que a água era as origem de
todas as coisas. Precisamente o que ele queria dizer com isso nós não sabemos.
Talvez quisesse dizer que toda forma de vida surgiu na água – e à água devesse
retornar quando chegasse ao fim. Quando esteve no Egito, certamente Tales pôde
observar no delta do Nilo como os campos inundados se tornavam férteis depois
que as águas recuaram. Talvez também tenha visto como do nada surgem sapos e
rãs e como o campo fica verde após a chuva. É portanto provável que Tales tenha
especulado como a água pode se transformar em gelo e vapor – e depois retornar
à forma líquida (...)”.
O gênio de Mileto teria
sido o primeiro a apontar o que, no seu entender, era a “substância primordial”
de todas as coisas no universo. Embora hoje saibamos, de sobejo, que esta não é
a água, sua preocupação em descobri-la deu margem a que outros filósofos
sugerissem outras coisas, dando importante impulso à Filosofia. No livro
“Metafísica”, Aristóteles observa o seguinte a propósito da teoria de Tales:
“(...) Tales diz que o princípio de todas as coisas é a água, sendo talvez
levado a formar essa opinião por ter observado que o alimento de todas as
coisas é úmido e que o próprio calor é gerado e alimentado pela umidade. Ora,
aquilo de que se originam todas as coisas é o princípio delas. Daí lhe veio essa
opinião e também a de que as sementes de todas as coisas são naturalmente
úmidas e de ter origem na água a natureza das coisas úmidas (...)”.
A enciclopédia
eletrônica Wikipédia traz uma explicação que se faz indispensável citar:
“Quando Tales disse que todas as coisas estão cheias de deuses, ou que o
magnetismo se deve à existência de ‘almas’ dentro de certos minerais ele não
estava invocando as palavras Deus e Alma, no sentido religioso, como as
conhecemos atualmente, mas sim adivinhando intuitivamente a presença de fenômenos naturais inerentes à
própria matéria”. Voltarei a tratar desse filósofo e da escola que fundou nos
próximos dias.
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
No comments:
Post a Comment