O Paraíso perdido. Perdido?
Pedro J. Bondaczuk
A
busca por um hipotético Paraíso, de onde o homem teria sido expulso “no
princípio dos tempos”, por haver desobedecido o Criador, é tema de cogitação e
de anseio de bilhões de pessoas através do tempo, na sucessão de gerações.
Trata-se de um mundo ideal, lugar idílico e perfeito onde inexistem a morte, a
maldade e a dor. Todas as religiões falam desse local perfeito, com variações
na sua descrição e e suas delícias, onde "o cordeiro confraterniza-se com
o leão, a corsa com o tigre" e não há servos e nem senhores. Seria um
recanto em que subsistiria a pureza original e não haveria sujeiras ou
impurezas de nenhuma espécie, nem materiais e nem espirituais. Os grandes
místicos descreveram em detalhes tal Paraíso, que os cépticos duvidam que
exista e o atribuem apenas à fantasia. É possível ao ser humano criar um
recanto de luz, em que a felicidade seja perene e interminável e se constitua
na única regra?
Com
os pressupostos atuais, não!!! Enquanto o homem não se livrar dos seus desejos,
não desatar os nós da sua ambição que o prendem a objetos, não eliminar sua
obsessão pelo poder, não se conscientizar que o "ser" é que é importante,
e não o "ter", continuará desperdiçando sua vida, sofrendo toda a
sorte de agruras, dores, frustrações e medos, mergulhado em angústias, correndo
atrás do nada. Sidarta Gauthama já ensinava que a fonte de toda a desgraça
humana é o desejo. Explicava que ele engendra toda a gama de sentimentos
daninhos que atormentam as pessoas e fazem com que elas atormentem os
semelhantes. Os grandes mestres ensinaram, com mínimas variações, a mesma
coisa. E deram exemplos de vidas abnegadas para fundamentar esses ensinamentos.
Tanto que nenhum deles foi rico. Não, pelo menos, com o que se entende hoje
como riqueza.
Não
só líderes religiosos trataram (e tratam) desse tema, mas também filósofos,
como por exemplo Platão, para o qual o único paraíso do homem é “a paz no coração”.
Faz sentido. Não vou entrar no mérito da questão, se as religiões têm ou não
razão nas visões que pintam desse mundo ideal e nem expressar minha opinião a
propósito. Esse é um tema sobre o qual é
impossível, ou quase, travar debates racionais. Tem a ver com a crença das
pessoas. E quem sou eu para dizer que Fulano, Sicrano ou Beltrano estão certos
(ou estão errados) em suas convicções?!! Trato-o, sim, mas com enfoque
puramente literário.
Como
não poderia deixar de ser, a Literatura vem explorando, há muito, desde sua
origem, esse tema, e sob os mais variados aspectos. Inúmeros poemas foram
escritos a respeito, com visões ora profanas, ora místicas, dependendo da
crença e da formação de cada poeta. No primeiro caso, cito, a título de
exemplo, o poema “Paraíso”, composto por Fernando Pessoa em 6 de novembro de
1912, que transcrevo abaixo:
“Se houver além da Vida um Paraíso,
Outro modo de ser e de viver,
Onde p’ra ser feliz seja preciso
Apenas ser;
Onde uma Nova Terra áurea receba
Lágrimas, já diversas, de alegria,
E em Outro Sol nosso olhar outro beba
Um Novo e Eterno Dia;
Onde a Áspide e a Pomba de nossa alma
Se casem, e com a Alma Exterior
Numa unidade dupla – sua e calma –
Nossa alma viva, e à flor
De nós nosso intimo sentir decorra
Em outra Coisa que não Duração,
E nada canse porque viva ou morra –
Acalmaremos então?
Não: uma outra ânsia, a de infelicidade,
Tocar-nos-á como uma brisa que erra,
E subirá em nós a saudade
Da imperfeição da Terra”.
Quanto ao aspecto espiritual
desse almejado mundo de perfeição, o poeta inglês John Milton publicou, em
1667 (com uma segunda versão em memória da “Eneida” de Virgílio publicada sete
anos depois, em 1674) toda uma epopéia, composta por doze cantos, com base no
relato do livro de “Gênesis”, da Bíblia. Refiro-me ao clássico “Paraíso
perdido”. Claro que não foram só esses dois poetas, com visões tão diversas,
que escreveram a respeito. Foram milhares e milhares e milhares. Escritores de
diversas épocas e tendências, igualmente registraram suas opiniões a propósito.
Como Clariece Lispector, que escreveu: “Não estou à altura de ficar no paraíso
porque o paraíso não tem gosto humano”. Ou como Marcel Proust, para quem “os
paraísos perdidos estão somente em nós mesmos”. Ou como o genial (posto que de
mal com o mundo e com a humanidade), Ambrose Bierce: “Paraíso: um sítio onde os
maus deixam de nos aborrecer com os seus assuntos pessoais, e os bons ouvem
atentamente quando contamos os nossos”. Essa sua definição consta do livro
“Dicionário do Diabo” (cruz credo!!!).
A
serenidade, advinda do despojamento, é o fundamento desse Paraíso para "O
Buda", que o descreveu desta maneira: "O espaço é sereno e a
tranqüilidade infinita. Nem frio, nem dores, no meu reino luminoso. O odor do
nardo perfuma o ambiente e a vida dos espíritos, balançados nas asas da
alegria, sem travos de saudade, não terá fim nem terá cansaços. As mães
beijarão os filhos encantadas; os noivos, esquecendo os madrigais inúteis,
mostrarão às suas amadas o céu repleto de canções, como o trigal cheio de
espigas douradas. Não haverá noite, não haverá sono, mas somente o hálito do
destino a aquecer o coração dos crentes e a banhá-los na felicidade
indestrutível".
A
Bíblia descreve o Éden mais ou menos da mesma forma. Fica a pergunta (e que
cada um responda por si, de conformidade com suas crenças): Existe este
Paraíso, este Walhala, este reino de delícias? Onde está? Em algum recanto da
Terra? No Sistema Solar? Em um planeta ao redor de outra estrela da Via Láctea?
Em outra galáxia, alhures? Onde está? Como chegar até ele? Para o escritor
russo, Fedor Dostoievski, ele existe e estamos nele; É a “vida”. Mas ele
complementa: “todavia os homens não o sabem e não se preocupam em sabê-lo”.
Jorge Luís Borges, por sua vez, revelou: “Sempre imaginei que o paraíso será
uma espécie de biblioteca”. Volta e meia chego a pensar da mesma forma. Mas...
este Paraíso existe? Como é? Onde está? Como chegar a ele? Consulte o seu
coração..
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk.
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