Armas ou pão
Pedro J. Bondaczuk
O
discurso feito pelo presidente norte-americano Ronald Reagan no dia 5 passado,
por uma rede de emissoras de televisão dos EUA, abordando a imediata
providência que deve ser adotada pelo seu governo para combater a inflação
daquele país é, no mínimo, alarmante. Falando no Salão Oval da Casa Branca, ele
abriu o seu primeiro pronunciamento à nação depois de eleito, advertindo o povo
sobre a ameaça de uma "calamidade econômica" que pesa sobre a
superpotência ocidental. Em princípio as providências que ele propõe para
debelar essa distorção da economia do Ocidente, não apresentam maiores
novidades. Reagan já as havia anunciado durante toda a sua campanha eleitoral.
E elas, inclusive, foram a causa determinante da sua esmagadora e contundente
vitória nas eleições presidenciais de novembro passado sobre Jimmy Carter.
O
que deve assustar os países que sempre viveram na sombra dos EUA para se
manterem, é o último tópico do seu pronunciamento. Disse o presidente, ao
encerrar a sua fala: "Não podemos continuar desperdiçando às custas desta
terra e de nossos filhos. Podemos começar a recompensar o árduo trabalho e a
assunção dos riscos, fazendo com que o governo funcione dentro dos limites de
seus recursos". Para os desavisados --- ou mal informados --- Reagan fez,
nesse trecho do seu discurso, uma alusão indireta à decisão da Casa Branca,
tomada no início da semana passada, de suspender toda e qualquer ajuda
financeira aos países subdesenvolvidos, que não seja de caráter militar. E para
que as falidas economias das nações mais pobres não as conduzam a convulsões
sociais semelhantes às que ocorrem atualmente nas caóticas Repúblicas de El
Salvador e da Guatemala, Washington está disposto a continuar provendo-as de
armas para conter as eventuais revoltas populares que a fome possa inspirar.
Logo
no início do seu pronunciamento, Reagan afirmou que a inflação e o desemprego
nos EUA deveriam ser combatidos ao mesmo tempo. Aparentemente, segundo os
padrões ortodoxos dos economistas conservadores daquele país, isso é
impossível. Conforme eles, os ataques às altas inflacionárias devem
necessariamente passar por medidas recessivas para "desinchar" ---
deflacionar --- a economia. E a recessão, como até os leigos sabem, conduz a
elevados índices de desemprego. Como Reagan conciliaria as duas coisas? Muito
fácil. Protegendo a indústria nacional contra a concorrência externa. Com isso
ele garantiria o mercado interno para as empresas exclusivamente
norte-americanas, criando novos empregos, em vez de diminuí-los, diante da necessidade de
substanciais aumentos da produção.
No
dia 2 passado, o deputado democrata de Massachusetts, Brian Donnely, anunciou
que recomendará ao Executivo do seu país, não apenas o prosseguimento, mas
principalmente a elevação das restrições oficiais às importações de calçados
dos EUA. E justificou a providência citando a crescente competição dos produtos
estrangeiros --- inclusive do Brasil --- o que estaria levando muitas
indústrias do seu Estado ao fechamento, deixando, em conseqüência, milhares de
novos trabalhadores sem emprego.
Alguns
podem argumentar que, por esta proposta ser de autoria de um parlamentar
oposicionista, dificilmente ela passará no novo Congresso, de predominância
republicana. Puro engano. O próprio presidente Reagan deu seguidas indicações
de que esta é, também, não apenas a sua intenção, como principalmente a fórmula
que encontrou para combater a inflação nacional, sem aumentar o desemprego.
Dessa
forma, aqueles que durante todos estes anos viveram quase que exclusivamente à
sombra do grande gigante do Norte do continente, devem se acautelar. E buscar
fontes alternativas para financiar seu desenvolvimento. Caso contrário, terão
que se conformar com a nova política de Reagan; que vai buscar transformá-los
--- por questões até mesmo estratégicas --- de "Repúblicas de
Banana", em meros Estados policiais.
(Artigo
publicado na página 2, de Opinião, do Diário do Povo em 17 de fevereiro de
1981)
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
No comments:
Post a Comment