Que se reverta a
corrida armamentista nuclear
Pedro J. Bondaczuk
Os criadores das armas nucleares tinham em mente, quando
da elaboração de tão poderoso instrumento de morte e de destruição (e,
portanto, de poder), que elas jamais viessem a ser usadas mais do que uma vez
contra aglomerações humanas. Que os efeitos terribilíssimos da primeira bomba,
lançada sobre uma cidade inimiga qualquer, fariam com que o adversário
percebesse que não tinha chances de lutar contra algo tão poderoso. Ou seja,
contra as próprias forças que geram todo o potencial de energia das estrelas.
Aquele a quem coube tomar essa decisão, contudo, não
se satisfez com um único uso prático da arma das armas. Com isso, Nagasaki,
pequena cidade japonesa, acabou se tornando a segunda povoação escolhida
(aleatoriamente) para, ao lado de Hiroshima (a primeira), conhecer os horrores
do inferno. Foi designada para servir, ao lado da irmã, de cobaia, de exemplo,
de aviso de que as guerras jamais voltariam a ser iguais às que foram travadas
antes desses dramáticos acontecimentos. Os otimistas chegaram a acreditar, até,
que nunca mais os povos iriam se guerrear.
No entanto, os cientistas que desenvolveram as armas
nucleares pensavam, apenas, em “qualidade”. Julgavam, por outro lado, que o
medo era o sentimento mais forte que movia o ser humano, superior a todas as
outras paixões, como ódio, ambição, etc. Enganaram-se, obviamente.
Formou-se todo um complexo industrial para produzir
esses monstruosos artefatos. Rios de dinheiro passaram a ser investidos na
produção de bombas cada vez mais sofisticadas, mais destrutivas, mais à prova
de qualquer tipo de defesa. Esses investimentos, frise-se, foram feitos com
recursos desviados da melhoria de vida de bilhões de pessoas.
À “qualidade”, por outro lado, aliou-se a
quantidade. E quando os povos do mundo se deram conta do que estava
acontecendo, os detentores da tecnologia nuclear, os que abriram essa diabólica
caixa de Pandora que continha todos os males da Terra, perceberam que haviam
ido longe demais.
De apenas um instrumento de intimidação, para inibir
o ânimo guerreiro de qualquer ditador ou qualquer comunidade nacional,
concluíram, estupefatos, em determinado momento, que detinham o poder de
destruir uma centena de planetas do porte do nosso! E, pior, que não sabiam
como deter as engrenagens dessa diabólica máquina produtiva, que a cada dia
despejava, nos arsenais das superpotências, dezenas e mais dezenas de novas
bombas nucleares, cada vez mais potentes, letais e arrasadoras.
Pode ser que o dia de ontem tenha, afinal, sido o
salvador lampejo de lucidez para a humanidade. É possível que tenha chegado o
momento da virada, da mudança de rumo, da inversão do processo. É uma
possibilidade, posto que remota.
Pela primeira vez, dois inimigos potenciais (Ronald
Reagan e Mikhail Gorbachev) deixaram sua cordilheira de diferenças de lado e
concordaram em assinar um pacto, não somente limitando a fabricação de novos
mísseis nucleares, mas destruindo um naipe completo dos já existentes em seus
respectivos arsenais.
Foi um passo pequeno, é verdade, diante da magnitude
do problema. E nem é seguro de que virá a ser acompanhado por outras ações do
gênero, mais decisivas e ousadas. Mas esse tratado é simbólico. Desperta a
esperança de que o homem, afinal, tenha se convencido de que é possível uma
convivência pacífica (e até harmônica) entre sistemas tão opostos, tanto em
práticas quanto em objetivos, como são o comunismo e o capitalismo.
Oxalá se possa caminhar tão rápido, em sentido
inverso (o da destruição da totalidade das armas nucleares) como se andou na
direção da sua massiva fabricação.
(Artigo publicado na página 10, Internacional, do
Correio Popular, em 9 de dezembro de 1987).
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