Monday, August 24, 2015

Já comprei minha camisa


Pedro J. Bondaczuk


A seleção brasileira, convocada a semana passada, e que embarca rumo aos Estados Unidos amanhã, vai estrear na Copa do Mundo com 80% da capacidade física dos jogadores, conforme previsão do fisicultor Moracy Sant'Anna. Isso é bom? É mau? O tempo para a preparação, praticamente de menos de um mês, é curto, como se propala? Acredito que não!

Até porque a sua base é a mesma do grupo de 1990, que fez aquele fiasco, que todos nós lembramos, na Itália. Ocorre que hoje esses jogadores estão mais amadurecidos, mais experientes, mais tarimbados e mais conscientes da importância da conquista do tetracampeonato, não apenas para a satisfação dos 150 milhões de brasileiros, mas principalmente para o fecho de suas carreiras.

Posso dizer que vi, em uma oportunidade ou outra, a apresentação das 24 seleções que vão disputar a Copa e não despontou entre elas nenhum "bicho-papão". Pelo contrário, a grande maioria adota a mesma tática, o mesmo futebol-força, com congestionamento do meio de campo, no máximo dois atacantes natos e apoio dos laterais e miolo de zaga, como fator surpresa. Ou seja, a mesma forma com que o Brasil joga.

A diferença está no talento de um Romário, de um Bebeto, de um Zinho e de um Leonardo, coisa que os nossos adversários não têm.

Ninguém, evidentemente, pode prever quem irá conquistar a Copa. Se isso fosse possível nem haveria disputa. A graça desse esporte e o motivo de ele empolgar multidões é exatamente a sua imprevisibilidade. Nem sempre o melhor é o campeão. Prova disso foi o último Mundial, o da Itália, em que a Alemanha teve uma apresentação discretíssima e emplacou seu tricampeonato sem nenhum brilho. Aliás, na fase de classificação, chegou a ser decepcionante, colhendo magros resultados que lhe permitiram apenas se arrastar até a final.

Apesar de tudo isso, por uma questão, digamos, de sexto sentido, de intuição, fiz uma coisa inédita enquanto torcedor doente da Seleção. E olhem que esta será a 12ª Copa do Mundo da minha vida. Comprei uma camisa canarinho, de número dez --- de Pelé, para dar mais sorte --- na certeza de que desta vez irei, finalmente, soltar o grito que ficou preso na garganta em 1982, por causa do "verdugo de Sarriá", o italiano Paolo Rossi. Aquele time, apesar de haver ficado marcado pelos fatídicos 3 a 2 para a Itália, foi empolgante, espetacular, mágico.

Vejo, todavia, uma determinação maior no atual grupo, que em momento algum, mesmo nos heróicos 6 a 0 contra a Bolívia, no Recife, durante as Eliminatórias, contou com a confiança do torcedor. Além disso, nossos adversários, convenhamos, não são bichos-papões.

A Rússia está às voltas com briguinhas de comadres, e muitos dos seus principais astros não foram convocados. Camarões, apesar da autoconfiança (excessiva) de seus jogadores, é uma seleção envelhecida em quatro anos (a base é a mesma de 1990) e sequer foi a campeã da Copa da África. A Suécia é aquilo que conhecemos. Provavelmente foi o selecionado que o Brasil enfrentou mais vezes em mundiais.

Daí não ser preocupante o fato de a nossa equipe estrear com apenas 80% da sua capacidade física. O auge será, e deve ser, atingido na grande final, quando poderemos soltar o grito preso na garganta há sofridos 24 anos: é tetracampeão, é tetracampeão!!

(Artigo publicado na página 2 do caderno Esportes, na coluna "Fera" do Correio Popular, em 23 de maio de 1994).


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