Prisões
e o inferno de Dante
Pedro J. Bondaczuk
A doutrina penal consagrada preceitua que as prisões
não devem ser encaradas como depósitos de criminosos, de desajustados sociais,
de pessoas que vivem à margem da lei, mas que sejam centros de reeducação para
devolver os que delinqüiram ao convívio da sociedade.
Todavia, entre a teoria e a prática vai uma
distância fantástica. Os centros de encarceramento transformaram-se, em geral,
e no mundo todo, num verdadeiro circo dos horrores, onde aliada à privação da
liberdade, quem tem a desventura de parar ali finda por abrir mão da própria
dignidade humana. Personificam bem o inferno da “Divina Comédia”, célebre poema
de Dante Aligheri. Só falta que se coloque um cartaz em suas portas, como o do
abismo do mal do genial poeta, com os dizeres: “”Ó vós que aqui entrais, deixai
todas as vossas esperanças”.
Agora, um advogado holandês está apresentando uma
proposta radical, tida por muitos como temerária, que está sendo debatida nesta
semana por criminologistas da América Latina, num congresso que se realiza em
Belém.
O professor Louck Hulsman, da Faculdade de Direito
de Rotterdam, propõe, simplesmente, a extinção das prisões. Claro que ele não
deseja que elementos comprovadamente irrecuperáveis, de alta periculosidade e
sem a mínima possibilidade de reintegração social, fiquem perambulando nas
ruas, praticando toda a sorte de atrocidades.
O jurista argumenta que se está fazendo uma
irracional inversão no encarceramento de pessoas. Enquanto gente humilde,
passiva mais de assistência social do que de cadeia, está sendo rigorosamente
punida por delitos menores, inúmeros condenados da Justiça, pela prática de
crimes hediondos, ficam à solta, por falta de vagas nos presídios.
Em junho de 1990 estimava-se que 84 mil mandados de
prisão não podiam ser cumpridos no Estado de São Paulo por não haver lugar para
colocar mais ninguém nas várias e superlotadas penitenciárias. O professor
holandês argumenta, não sem fundamento, que da forma como se está procedendo,
no mundo todo, na atualidade, todos os centros de detenção só estão servindo
para corromper seres humanos. Atuam como autênticas universidades do crime em
que o indivíduo penetra inocente, por um deslize na maioria dos casos praticado
por causa de circunstâncias funestas, e sai – ou ao cabo da sua pena ou através
de fuga – um verdadeiro monstro, revoltado contra tudo e contra todos.
Está aí uma boa questão para se pensar agora que, em
decorrência da proximidade das eleições, o tema violência – cuja ocorrência, na
verdade, nunca diminuiu – ganha, oportunisticamente, enfoque até exagerado,
para uso de políticos que distorcem o alcance e a função dessa nobre atividade
com histriônicos arroubos de demagogia.
(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio
Popular, em 10 de agosto de 1990)
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
No comments:
Post a Comment