Sunday, August 16, 2015

O que Gorbachev quer de Ronald Reagan?


Pedro J. Bondaczuk


A recusa do líder soviético, Mikhail Gorbachev, de marcar uma reunião de cúpula, que seria realizada ainda no corrente ano, em Washington, com o presidente norte-americano Ronald Reagan, pegou todo mundo de surpresa. Decepcionou a Casa Branca, os aliados da Otan, os observadores e a opinião pública mundial.

Ninguém entendeu qual é a jogada do secretário-geral do Partido Comunista da URSS, principalmente depois do clima de euforia que um princípio de tratado, obtido em 19 de setembro passado na capital norte-americana, gerou em toda a parte. O secretário de Estado George Shultz, que retornou de mãos vazias de Moscou, disse não acreditar que o Cremlin estivesse tentando obter novas concessões para a assinatura do tratado para a eliminação dos mísseis de média e curta distância dos arsenais das superpotências.

O chanceler soviético, Eduard Shevardnadze, deixou implícito que a razão do endurecimento se prendia ao maluco projeto da Casa Branca denominado, não se sabe por que razão, de "guerra nas estrelas". Ou seja, se foi essa, de fato, a causa, os russos retrocederam um passo, já que haviam concordado em não incluir, pelo menos agora, este item nas negociações.

Há analistas entendendo que a volta atrás de Gorbachev tem um motivo mais atual, de política exterior: o Golfo Pérsico. O dirigente, inclusive, não escondeu de Shultz o seu desagrado pela maciça  presença naval norte-americana e de seus aliados europeus na região. Em termos inusitadamente duros, disse ao chefe da política externa norte-americana que essa questão estava "envenenando" o clima de cordialidade entre as superpotências.

O líder soviético parece entender que a aventura dos Estados Unidos nessa área de tamanha importância para o mundo significava um desequilíbrio estratégico, uma mudança não prevista de peças no imenso tabuleiro de xadrez em que o Planeta se tornou para as duas nações militarmente mais poderosas deste século.

Ocorre que esse é apenas um episódio, entre tantos que dividem Washington e Moscou. E não deveria servir para separar ainda mais os dois lados. Ambos são os únicos que, agindo em conjunto, podem pôr fim à estúpida guerra entre o Irã e o Iraque, antes que os aiatolás resolvam dar o xeque-mate em Bagdá.

Todos sabem que a despeito da superioridade aérea iraquiana, é Teerã que está mais próxima da vitória. Numa reunião de cúpula realizada com o espírito aberto e receptivo, a União Soviética e os Estados Unidos poderiam concordar numa ação comum, tendente a evitar contratempos futuros. Apesar de tudo, ainda acreditamos numa reunião de cúpula para este ano. Afinal, o Cremlin sempre caracterizou suas atitudes pelo mistério e pelo suspense.

(Artigo publicado na página 21, Internacional, do Correio Popular, em 25 de outubro de 1987).


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