Sunday, August 30, 2015

Num passo de caranguejo


Pedro J. Bondaczuk


O Brasil foi colocado, ao lado do Chile, Ghana, Jamaica e Peru, como um dos países onde o nível de miséria mais aumentou, no período de 1983 e 1984, num relatório divulgado ontem, pelo Banco Mundial, em que o organismo faz uma análise da economia em nível planetário.

Embora os dados que a instituição possui sejam de 4 anos atrás, a situação não se alterou, em absoluto, para melhor. Pelo contrário (e qualquer brasileiro pode constatar por sua própria vida pessoal), ocorreu uma degradação ainda maior, mormente agora, em 1988.

Vivendo aqui, conhecendo a fertilidade do nosso solo e a laboriosidade da nossa gente, ficamos indagando, com nossos botões: “Por que estamos caminhando para trás, na direção do abismo, quando temos tudo para ser uma sociedade próspera e harmoniosa?”.

Em março do ano passado, o advogado Antonio Cláudio Mariz também demonstrou idêntica perplexidade e igual revolta pelo que está nos acontecendo. Disse, à agência “O Estado”: “A fecundidade da terra, as riquezas minerais que o País possui, a força de trabalho a ser desenvolvida na indústria e nas demais atividades produtivas, tornam inconcebível, inaceitável, vergonhoso e absurdo o estado de carência de significativas parcelas da população”.

O pior de tudo é que alguns “iluminados” de Brasília, vivendo numa autêntica “ilha da fantasia”, desvinculados da realidade, não estão enxergando isto, que no Exterior é patente para todos. Caso não fosse, o número de emigrações (legais ou clandestinas), numa quantidade impressionante, a tal ponto da Casa da Moeda sequer vencer em emitir passaportes, seria um bom indicativo de que algo de podre existe no reino da mamata, parodiando Shakespeare.

É evidente que essa “capital da alienação” citada é o Planalto Central. Ali, fala-se de tudo, menos de como evitar esse estado de miserabilidade, que nos humilha e atormenta a todos, até aos ricos – a riqueza, afinal, não é nenhum pecado. Ser próspero, num país onde a maioria também é, tem um significado. Mas possui outro, bem diferente, num lugar onde a miséria campeia.

No Exterior, essa pessoa, procedente de um país carente, nunca é vista com bons olhos, mesmo não tendo nada a dever a ninguém. Todos, portanto, temos que unir esforços para acabar com essa situação vexatória e angustiante, que está se agravando a cada dia que passa, se transformando numa perigosa bomba de tempo de insatisfação social e que pode trazer conseqüências muito sérias se um dia vier a explodir incontrolavelmente.

O caminho, cabe às lideranças políticas nacionais (tão desprestigiadas) indicar. Antes, elas têm que deixar de lado seu inconseqüente e estúpido carreirismo de hoje e pensar um pouco mais no amanhã. Ou seja, deixar de plantar a couve para o prato de hoje, para plantar o carvalho, para a sombra de amanhã.

(Artigo publicado na página 10, Internacional, do Correio Popular, em 8 de julho de 1988).


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