Saturday, August 08, 2015

A opinião pública


Pedro J. Bondaczuk

A opinião da maioria deve, “sempre” prevalecer e ser acatada por todos, como suposta atitude democrática? Depende! Caso seja rigorosamente correta, sem a mínima margem para dúvidas, e, portanto, justa e construtiva, a resposta é, óbvio, afirmativa. Mas não pelo fato de contar com a convicção (ou pelo menos com se não o apoio, a adesão) do maior número de pessoas. Esse não é fator determinante. O motivo dela dever prevalecer nesses casos específicos é o fato de satisfazer condições básicas, como veracidade, justiça e construtividade. Portanto, isso anula o “sempre” da proposição.

Algum sujeito, que ninguém fica sabendo jamais quem é, lá um belo dia solta um disparate qualquer sobre algo ou sobre alguém, não raro um boato, e, de imediato, sem nenhuma análise ou consideração, um bando de pessoas – centenas, milhares, milhões – repercutem-no de imediato, dando-lhe foros de verdade. Nem sempre, porém, é verdadeiro. Esse processo, ou procedimento, é o que se conhece como “opinião pública”. E esta expande-se, multiplica-se e fixa-se de vez quando divulgada pela imprensa. Muitos se esquecem, todavia, que jornalismo é feito por pessoas iguaizinhas a nós, sujeitas, portanto, a enganos e a interesses nem sempre construtivos ou compatíveis com os da maioria. Mas quando se impõe, o estrago à reputação ou à verdade ou a ambos é consumado e de tal forma que muitas vezes é impossível de ser remediado.     

Da minha parte, desconfio da tal “opinião pública” que, conforme o Marquês de Maricá, “é sujeita à moda, e tem ordinariamente a mesma consistência e duração que as modas”. Em muitos casos, ela se torna instrumento de terríveis injustiças e, como não tem “cara”, não há quem pague por elas quando a verdade, finalmente, vem à tona (caso venha). Se a opinião pública fosse “sempre” correta, justa e construtiva, Jesus Cristo, por exemplo, não seria condenado à morte. Narram os evangelistas que Pôncio Pilatos, convencido da inocência daquele sereno réu, mas não querendo descontentar o populacho (afinal, era político), resolveu deixar por conta do povo a decisão sobre seu destino. Colocou, como opção, libertar o Messias, que jamais havia feito algum mal a quem quer que fosse ou Barrabás, notório encrenqueiro (nos dias de hoje seria considerado “terrorista”), com um punhado de delitos nas costas. E todos sabem qual foi a “opinião pública”. Foi, além de lamentável, irremissível, do ponto de vista humano. Poderia citar centenas e centenas de outros casos, mas não o farei.   

Há um antiqüíssimo provérbio chinês que diz: “Um homem sábio toma suas próprias decisões, um homem ignorante segue a opinião pública”. Infelizmente, muitos a seguem. Machado de Assis comparou-a áquela serpente-deus dos antigos mexicanos. Escreveu, em uma de suas crônicas: “... Depois de devorar um alentado mamífero, prostra-se até que a ação digestiva lhe tenha esvaziado o estômago; então o flagelo das matas corre em busca de novo repasto, emborca novo animal pela garganta abaixo e cai em nova e profunda modorra de digestão. Esquisita que pareça a comparação, o público é assim. Precisa de uma novidade, e de uma grande novidade. Quando lhe aparece alguma, digere-a com placidez e calma, até que desfeita ela, outra lhe fica ao alcance e lhe satisfaz a necessidade imperiosa”. E não é? O povão adora escândalos, mas logo se cansa deles e fica na expectativa do próximo;

Para Henry David Thoreau, pioneiro da tática de “desobediência civil” consagrada pelo Mahatma Gandhi na Índia,  como forma de defender inalienáveis direitos individuais – seu livro “Desobedecendo” é um primor de sabedorias e de bom senso – “a opinião pública é uma tirana débil, se comparada à opinião que temos de nós mesmos”. Débil e, em certos casos, covarde, posto que sem personalidade e sem rosto. Da mesma forma que não me submeto “sempre” à sua tirania, não digo que “nunca” a acate. Mas só a acatarei quando entender que ela está sendo correta, justa e construtiva. Não sou tão reducionista. Busco agir como a atriz birmanesa (naturalizada inglesa) Jeane Roland sugere que se deva: “O fraco treme diante da opinião pública, o louco afronta-a, o sábio julga-a, o homem hábil dirige-a”. Ou seja, se alvo dela, procuro dirigi-la a meu favor.


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