Tuesday, June 23, 2015

Verso e reverso do Real


Pedro J. Bondaczuk


À medida em que o tempo passa, as campanhas se desenrolam e se aproxima o dia das eleições de 3 de outubro próximo, mais se consolida a posição do candidato tucano, Fernando Henrique Cardoso, como o provável sucessor de Itamar Franco na Presidência da República.

É claro que ninguém pode cantar vitória na véspera. O leitor, certamente, se lembra do que ocorreu em São Paulo, em 1988, quando o atual prefeito paulistano, Paulo Maluf, liderava, folgadamente todas as pesquisas de opinião até as vésperas da votação e, no entanto, acabou surpreendido pela petista Luiza Erundina.

Essa possibilidade de reversão sempre existe. Todavia, agora, há um fator novo eu torna uma eventual surpresa muito mais difícil, senão bastante improvável: o Real.

Em termos objetivos, a menos que cometa uma bobagem muito grande em algum debate, como ocorreu quando perdeu para Jânio Quadros uma eleição virtualmente ganha para a prefeitura da cidade de São Paulo, ou que surja um fato novo bastante comprometedor, como uma inesperada Miriam Cordeiro, o que é menos provável ainda, o ex-ministro da Fazenda pode ir preparando o seu ministério e seu discurso de posse. E a vitória, pelo andar da carruagem, tende a acontecer sem a necessidade de um segundo turno.

A esperada reação de Orestes Quércia, pelo menos até aqui, não se verificou. E dificilmente essa fulminante virada virá a acontecer, até pela premência de tempo. Afinal, estamos a pouco mais de um mês das eleições e Fernando Henrique não pára de crescer nas pesquisas.

Todavia, o mesmo fator que pode representar o sucesso do candidato tucano, tende a ameaçar sua credibilidade como presidente logo no início do mandato. Ninguém nega que até aqui o Real tem sido do agrado da população, a despeito do achatamento salarial existente e dos preços ainda não terem emagrecido o quanto poderiam e deveriam.

A nova moeda, por exemplo, é muito mais procurada do que o dólar, que teve, nos últimos dias, sua cotação mais baixa em cem anos. A euforia existente, porém, já era prevista e tende a aumentar por volta de 3 de outubro. E depois?

Caso o programa de ajuste econômico não seja acompanhado de uma série de reformas, corre o risco de se transformar em nova e gigantesca frustração, maior, inclusive, do que a do Cruzado. Os próprios autores do plano admitem isso. Para que se consolide, vários artigos da atual Constituição terão que ser reformados. Há consenso a esse respeito.

Como o atual Congresso, inexpressivo e sem credibilidade, perdeu a oportunidade de se redimir fazendo uma revisão constitucional profunda e decente, a tarefa vai ficar para os próximos congressistas. E será muito mais árdua. Qualquer alteração precisará de maioria qualificada, ou seja, de dois terços dos votos de deputados e senadores e em dois turnos.

Só conseguirá mudar qualquer coisa na Carta Magna quem tiver cacife político. Ou seja, no mínimo 250 cadeiras no Congresso e, assim mesmo, com grande poder de barganha para conseguir adesões na oposição.

Projeções, contudo, indicam que o partido, ou coligação, majoritários no Legislativo Federal, terão, no máximo, em torno de 160 parlamentares. As eleições para a Câmara e o Senado foram postas, durante a atual campanha, num plano inferior, como se não fossem a chave do sucesso do próximo governo, embora sejam.

Não queremos ser estraga prazeres dos empolgados cidadãos em relação à nova moeda. Até porque, ainda há tempo de fazer a coisa certa. Seja qual for o candidato eleito para suceder Itamar Franco, sua vitória deve vir, necessariamente, acompanhada de cômoda maioria parlamentar.

Caso contrário, a armadilha da "governabilidade" fará com que fique com as mãos amarradas, sem poder pôr em prática nenhuma das mirabolantes promessas da atual campanha. E elas têm sido muitas! Esse ´re o nó político que o eleitor pode e deve desatar, caso não se deixe levar pela simples empolgação. É preciso cabeça fria e pés no chão.

(Artigo publicado na página 2, Opinião, da Folha do Taquaral, em 20 de agosto de 1994).


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