Verso e reverso do Real
Pedro J. Bondaczuk
À
medida em que o tempo passa, as campanhas se desenrolam e se aproxima o dia das
eleições de 3 de outubro próximo, mais se consolida a posição do candidato
tucano, Fernando Henrique Cardoso, como o provável sucessor de Itamar Franco na
Presidência da República.
É
claro que ninguém pode cantar vitória na véspera. O leitor, certamente, se
lembra do que ocorreu em São Paulo, em 1988, quando o atual prefeito
paulistano, Paulo Maluf, liderava, folgadamente todas as pesquisas de opinião
até as vésperas da votação e, no entanto, acabou surpreendido pela petista
Luiza Erundina.
Essa
possibilidade de reversão sempre existe. Todavia, agora, há um fator novo eu
torna uma eventual surpresa muito mais difícil, senão bastante improvável: o
Real.
Em
termos objetivos, a menos que cometa uma bobagem muito grande em algum debate,
como ocorreu quando perdeu para Jânio Quadros uma eleição virtualmente ganha
para a prefeitura da cidade de São Paulo, ou que surja um fato novo bastante
comprometedor, como uma inesperada Miriam Cordeiro, o que é menos provável
ainda, o ex-ministro da Fazenda pode ir preparando o seu ministério e seu
discurso de posse. E a vitória, pelo andar da carruagem, tende a acontecer sem
a necessidade de um segundo turno.
A
esperada reação de Orestes Quércia, pelo menos até aqui, não se verificou. E
dificilmente essa fulminante virada virá a acontecer, até pela premência de
tempo. Afinal, estamos a pouco mais de um mês das eleições e Fernando Henrique
não pára de crescer nas pesquisas.
Todavia,
o mesmo fator que pode representar o sucesso do candidato tucano, tende a
ameaçar sua credibilidade como presidente logo no início do mandato. Ninguém
nega que até aqui o Real tem sido do agrado da população, a despeito do
achatamento salarial existente e dos preços ainda não terem emagrecido o quanto
poderiam e deveriam.
A
nova moeda, por exemplo, é muito mais procurada do que o dólar, que teve, nos
últimos dias, sua cotação mais baixa em cem anos. A euforia existente, porém,
já era prevista e tende a aumentar por volta de 3 de outubro. E depois?
Caso
o programa de ajuste econômico não seja acompanhado de uma série de reformas,
corre o risco de se transformar em nova e gigantesca frustração, maior,
inclusive, do que a do Cruzado. Os próprios autores do plano admitem isso. Para
que se consolide, vários artigos da atual Constituição terão que ser
reformados. Há consenso a esse respeito.
Como
o atual Congresso, inexpressivo e sem credibilidade, perdeu a oportunidade de
se redimir fazendo uma revisão constitucional profunda e decente, a tarefa vai
ficar para os próximos congressistas. E será muito mais árdua. Qualquer
alteração precisará de maioria qualificada, ou seja, de dois terços dos votos
de deputados e senadores e em dois turnos.
Só
conseguirá mudar qualquer coisa na Carta Magna quem tiver cacife político. Ou
seja, no mínimo 250 cadeiras no Congresso e, assim mesmo, com grande poder de
barganha para conseguir adesões na oposição.
Projeções,
contudo, indicam que o partido, ou coligação, majoritários no Legislativo
Federal, terão, no máximo, em torno de 160 parlamentares. As eleições para a
Câmara e o Senado foram postas, durante a atual campanha, num plano inferior,
como se não fossem a chave do sucesso do próximo governo, embora sejam.
Não
queremos ser estraga prazeres dos empolgados cidadãos em relação à nova moeda.
Até porque, ainda há tempo de fazer a coisa certa. Seja qual for o candidato
eleito para suceder Itamar Franco, sua vitória deve vir, necessariamente,
acompanhada de cômoda maioria parlamentar.
Caso
contrário, a armadilha da "governabilidade" fará com que fique com as
mãos amarradas, sem poder pôr em prática nenhuma das mirabolantes promessas da
atual campanha. E elas têm sido muitas! Esse ´re o nó político que o eleitor
pode e deve desatar, caso não se deixe levar pela simples empolgação. É preciso
cabeça fria e pés no chão.
(Artigo
publicado na página 2, Opinião, da Folha do Taquaral, em 20 de agosto de 1994).
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