Guerra civil sem motivo ou propósito
Pedro J.
Bondaczuk
O Líbano está vivendo uma situação humilhante e muito
incômoda, no mais recente episódio da sua guerra civil, de quase dez anos de
duração, cujos estragos são como se o conflito tivesse séculos. Enquanto tropas
estrangeiras, as de Israel, começam a deixar o país (não sem antes trocar tiros
e hostilizar muçulmanos libaneses) no Sul do território que ocupam há dois
anos, outras forças alienígenas, as sírias, aumentam a sua presença no Norte.
Dessa forma, a sua soberania
nacional continua sendo mera ficção, algo tão somente retórico. Os soldados de
Damasco têm como pretexto para o aumento de sua presença na região a garantia
da manutenção de Amin Gemayel na presidência libanesa, ameaçada, desta feita,
pelo seu próprio clã familiar, que constitui o cerne da milícia cristã.
Um seu sobrinho e a própria
cunhada do presidente (esposa de Bachir Gemayel, assassinado em 1982, pouco
após ser eleito) questionam seriamente a liderança do mais jovem dos filhos do
outrora todopoderoso criador da Falange, o falecido Pierre.
O irônico, em tudo isso, é o fato
dos sírios, no início da guerra civil considerados os maiores inimigos dos
milicianos cristãos, estarem defendendo com tanto empenho um presidente da
comunidade maronita. É mais uma reviravolta de um conflito que poderia ser
considerado cômico, não fosse a tragédia de ter sido o responsável pela perda
de centenas de milhares de vidas e por prejuízos materiais impossíveis de
dimensionar, tal a sua proporção.
De uma guerra que transformou um
Líbano modelar, cuja convivência entre suas diversas comunidades era mencionada
como exemplo há menos de uma década atrás, num saco de gatos, onde as pessoas
se matam e se hostilizam entre si, sem sequer saberem a razão.
E o que fez o mundo durante o
desenrolar de toda essa tragédia? Assistiu passivamente, quando não colocou
mais lenha nessa fogueira, obtendo lucros incalculáveis com a venda de armas
para que essa luta fratricida atingisse proporções incontroláveis.
O que fez a ONU para que as
partes conflitantes se sentassem ao redor de uma mesa e resolvessem
civilizadamente suas pendências? Enviou meia dúzia de “gatos pingados” ao
Líbano, que jamais justificaram o por quê de suas presenças ali. E as
superpotências, perdidas em suas elucubrações hegemônicas e seus sonhos
megalomaníacos de domínio mundial, o que fizeram?
Os russos, através de seus fiéis
prepostos, os sírios, entupiram aquele país de armas e de tropas. E de
“slogans” e doutrinas, que nunca encheram a barriga de ninguém. Os
norte-americanos, embora perdendo centenas de vidas na região, poderiam ter
feito mais. Mas estão presos a compromissos conflitantes, na maioria das vezes,
com as aspirações libanesas, às quais jamais ligaram a mínima.
Parece que ninguém aprendeu coisa
alguma com os horrores da Segunda Guerra Mundial, que todos diziam, seria a
última que o mundo veria. É a história que, embora com outro cenário e outros
atores, repete a tragicomédia da estupidez humana.
(Artigo publicado na página 19, Internacional, do Correio Popular, em 17
de março de 1985).
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