Fúria e insensatez
Pedro J. Bondaczuk
As
manchetes dos jornais estampam os detalhes de mais uma chacina ocorrida no Rio
de Janeiro, desta vez na Favela do Vigário Geral, localizada num subúrbio da
cidade. As vítimas foram 21 pessoas, inclusive crianças, executadas por um
grupo de 40 homens encapuzados, sem a mínima chance de defesa.
Esse crime hediondo vem se juntar a outros tantos
com os quais a população já se acostumou a conviver nos últimos tempos. Como,
por exemplo, a morte de sete menores na Candelária. Ou o ainda não esclarecido
caso do massacre dos ianomâmis, de tantas e tão desencontradas versões.
Mais próximo de nós, temos o episódio do brutal
assassinato de dois taxistas em Campinas, que chocou e revoltou esta laboriosa
categoria. E há inúmeros pequenos delitos que sequer são noticiados, que
assustam as pessoas e instalam por toda a parte um clima de insegurança e medo.
O que estará acontecendo com o Brasil? Estaríamos
vivendo um quadro de guerra civil não declarada, como alguns se apressam a
afirmar? O problema da violência (urbana ou não) seria uma prerrogativa apenas
do Brasil? Estaríamos nos tornando insensíveis ao valor e à importância da
vida?
As notícias procedentes do Exterior nos autorizam a
afirmar que não. Esse retorno à barbárie é característico das grandes cidades
mundiais, quer sejam do Primeiro Mundo, quer do Terceiro. No fim de semana, por
exemplo, houve o massacre de 14 policiais na Colômbia.
Na semana passada, uma garotinha marroquina
afogou-se num lago de Rotterdam, na Holanda, perante o olhar indiferente de 200
pessoas que presenciaram a cena e nada fizeram para salvar a menina. A cena,
inclusive, foi filmada, como se não passasse de uma ficção, de um episódio
dramático de um filme. E, no entanto, uma jovem vida se perdeu.
No dia 21 de agosto passado, um universitário japonês,
que participava de um programa de intercâmbio estudantil internacional, foi
morto por uma bala perdida, que ninguém sabe de onde veio, em Los Angeles, no
mais rico e desenvolvido Estado norte-americano, o da Califórnia.
Tiroteios são freqüentes ali, por causa da guerra
entre as gangues juvenis. Ainda nos Estados Unidos, 160 pessoas haviam sido
mortas, de 1º de janeiro até a metade de julho, por tiros disparados a esmo na
cidade de Nova York. O mesmo aconteceu em Denver, no Colorado, onde foi montado
um esquema especial para a visita do papa João Paulo II, por temor de que o
Pontífice pudesse ser atingido por um projétil saído da arma de um desses
malucos.
E o que dizer da Rússia, onde quadrilhas de mafiosos
transformaram Moscou numa Chicago dos anos 30? E de Alemanha, França,
Grã-Bretanha, e vai por aí afora? A violência campeia por toda a parte. O
aumento do rigor das penas tem sido insuficiente para detê-la. Califórnia e
Nova York têm penas de morte, e mesmo assim a criminalidade apresenta espiral
ascendente.
Leis duras, nós possuímos com fartura no Brasil,
porém se todos os delinqüentes já condenados pela Justiça fossem presos, o
Estado brasileiro precisaria investir US$ 5 bilhões para encarcerar toda essa
gente.
O homem, que por alguma razão que caberia a
antropólogos, psiquiatras, juristas, sociólogos, psicólogos e cientistas
sociais explicar, está retroagindo à barbárie. Perdeu de vista o real e nobre
significado da vida. “Coisificou” seus objetivos, aferrado a um materialismo
estúpido e exacerbado. Daí esse quadro de fúria e insensatez em que se
transformou a decantada “civilização” da Era Tecnológica.
(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio
Popular, em 1º de setembro de 1993).
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