Terceiro erro seria fatal
Pedro J.
Bondaczuk
O ex-chanceler alemão-ocidental,
Willy Brandt, sempre foi tido como conciliador durante sua longa e brilhante
carreira política. Foi dele, por exemplo, a tentativa, feita em 1969, para
reunificar as duas Alemanhas e reaproximar a sociedade germânica do Leste
Europeu, no que foi chamado, na ocasião, de “Ostpolitik”.
Aliás, isso acabou lhe trazendo
contratempos, que interromperam, ou pelo menos desaceleraram, uma brilhante
carreira política. Por causa do seu empenho de reaproximação com os alemães
orientais, seus opositores não lhe perdoaram a ousadia e nem o fato de que seu
secretário particular, Günther Guillaume, fosse agente duplo e espionasse a
favor da outra Alemanha, a de regime comunista.
É evidente que Willy Brandt nada
tinha a ver com o fato, a não ser, somente, o erro de avaliação na escolha
desse assessor. E todos estamos sujeitos a esse tipo de equívoco, pois um
pilantra não traz estampada na face essa condição. O ex-chanceler foi
responsabilizado pelo ato de espionagem em si, como se fosse cúmplice do
celerado, e forçado a renunciar ao cargo, em 6 de maio de 1974, quando o degelo
político entre as Alemanhas já era mais do que mero desejo. Transformava-se, a
olhos vistos, em fato.
Nos últimos anos, todas as
grandes bandeiras do chamado Terceiro Mundo têm sido empolgadas, com coragem e
determinação, por esse visionário que, mesmo fazendo parte da minoritária parte
rica e privilegiada do mundo, não se cansa de “quixotear” (e vale aqui o
neologismo), pelas arenas políticas internacionais, em defesa de uma divisão
mais equânime da riqueza do Planet.
Ao receber, ontem, o prêmio de
que se fez merecedor, na sede das Nações Unidas, em Nova York, Willy Brandt fez
duas observações, que nos chamaram, em particular, a atenção. A primeira
refere-se ao fato de cinco bilhões de seres humanos estarem à mercê de um
pequeno grupo de pessoas, para poderem continuar, simplesmente, vivendo.
Com a acuidade política de quem
conhece, porque já esteve no meio dos notáveis, alertou para o perigo, por
demais evidente (e teimosamente negado, e até ridicularizado por alguns
inconseqüentes) de uma Terceira Guerra Mundial.
Sabedor da inutilidade de
conferências para tratar de desarmamento – como a pantomima que soviéticos e
norte-americanos encenam agora em Genebra –, Brandt constatou que apenas um
contato direto entre o presidente Ronald Reagan e o líder Mikhil Gorbachev pode
levar as superpotências a alguma espécie de acordo, que diminua o risco
(crescente) de um confronto nuclear.
O fato da guerrinha verbal entre
o Cremlin e a Casa Branca ter diminuído de intensidade, não quer dizer que as
duas partes abriram mão de suas estratégias, deixaram de lado suas
diverg6encias ideológicas, eliminaram o ódio mútuo e, subitamente, passaram a se
amar de paixão.
Não significa, portanto, que o
mundo esteja, finalmente, se encaminhando para um raro, e sempre desejável,
período de paz. Pode representar, até, um sintoma de perigo. Controvérsias,
entre os EUA e a URSS, é que não faltam para os lançar um contra o outro, quer
econômica, quer diplomática ou quer militarmente.
O segundo ponto do discurso de
Brandt que nos chamou a tenção foi o atinente aos riscos oriundos do
alargamento das desigualdades entre o Norte, miliardário, e o Sul, miserável,
do nosso Planeta. O ex-presidente norte-americano, Jimmy Carter, ainda na
década passada (quando o problema da insolvência da dívida externa do Terceiro
Mundo sequer tinha vindo à tona), sentenciava: “É muito provável que num futuro
próximo o problema da paz e da guerra estará mais relacionado com os problemas
econômicos e sociais entre o Norte e o Sul, do que com os problemas de
segurança militar entre o Leste e o Oeste, que dominaram as relações
internacionais desde a Segunda Guerra”.
Ambas as questões, contudo, podem
estar diabolicamente entrelaçadas. Os desníveis econômicos provavelmente serão
os estopins de um eventual (e impensável, pelas conseqüências), conflito
nuclear entre as duas superpotências.
Mas este somente será deflagrado
(se o for) porque EUA e URSS possuem o indispensável para que o seja: as
monstruosas bombas de destruição em massa. O mundo, que já conheceu duas
guerras neste século, não pode mais permanecer impassível, esperando que, a
qualquer momento, ocorra o pior, enquanto esse grupelho de “iluminados” decide
se devemos continuar vivendo ou não.
Precisamos fzer lgo para prevenir
a catástrofe pois, como diz um conhecido provérbio árabe: “Se um homem me
enganar uma vez, Deus o amaldiçoe; se me enganar duas vezes, Deus o amaldiçoe e
a mim também; mas se me enganar três vezes, Deus amaldiçoe somente a mim, por
cair tão facilmente em enganos”.
(Artigo
publicado na página 9, Internacional, do Correio Popular, em 26 de abril de
1985).
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