Desnutrição
Infantil
Pedro J. Bondaczuk
O
Conselho de Segurança Alimentar acaba de divulgar um estudo, bastante
preocupante, sobre as conseqüências concretas da prolongada crise que o País
vem enfrentando e da qual está prestes a sair, de acordo com projeções de
economistas internos e externos.
Anos
e mais anos de desemprego crônico, de salários achatados e de instabilidade
econômica produziram um quadro social assustador, que vai requerer atenção
muito especial do presidente eleito Fernando Henrique Cardoso.
O
citado relatório do Consea constatou um aumento considerável da desnutrição
infantil no País. O drama, responsável pela elevada mortalidade de crianças de
0 a 5 anos de idade, tende a aumentar estas taxas, já compatíveis com países do
chamado Quarto Mundo, se algo não for feito com competência e urgência.
Inúmeras
vezes destacamos que o Brasil --- provavelmente recordista mundial em
desperdício --- está desperdiçando, sobretudo, entre tantos outros bens,
aquilo que tem de mais precioso: o futuro. Joga fora a infância do seu povo. A
cada menino ou menina que morrem precocemente, uma esperança também se vai.
Embora tal afirmação pareça frase de efeito, ou uma figura de retórica,
desgraçadamente, não é. Antes fosse.
É
indispensável desenvolver a mentalidade de valorização da vida. É preciso
alimentar, educar, instruir e dar oportunidades a milhões de brasileirinhos,
relegados à miséria e ao abandono, em decorrência de anos de omissão.
A
cada criança que morre, o Brasil fica mais pobre. O mundo fica. Trata-se de um
ser humano --- insubstituível, por ser único --- que deixa de existir. O estudo
do Consea estima, por exemplo, que dentre os 23,3 milhões de meninos e meninas
com até cinco anos de idade, 6,3 milhões vivem em estado de indigência. A renda
de seus pais é de menos de um mísero salário mínimo (R$ 70, um dos mais baixos
do mundo). Daí não ser de se estranhar que sejam desnutridos. A desnutrição,
antes restrita aos bolsões de miséria do Nordeste, avança rumo ao Sul do País.
Hoje, atinge áreas até prósperas, como Curitiba, Porto Alegre, São Paulo e Rio
de Janeiro.
A
tarefa de reverter essa situação vexatória não ér exclusivamente do governo,
embora dele é que devam partir as diretrizes de uma política de assistência
social consistente, não paternalista, e que não se limite à criação de um
ministério específico para o setor --- que fracassou rotundamente em sua função
--- ou entidades assistenciais oficiais que se revelem meras consumidoras de
verbas, muitas vezes desviadas de sua finalidade para bolsos vorazes de alguns
espertalhões.
A
comunidade tem meios e o dever de fazer alguma coisa. Quer através de
campanhas, como a que o sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, vem
desenvolvendo há algum tempo. Quer mediante cobranças às autoridades para que cumpram
seu dever. Quer de forma individual ou participando de entidades beneficentes,
que sejam honestas e atuantes.
O
que não podemos é assistir, passivamente, tantos irmãos brasileiros morrendo à
míngua, enquanto lhes damos as costas. Patriotismo é também fazer alguma coisa
pela nossa gente. Que Fernando Henrique Cardoso se sensibilize com o problema e
faça um governo voltado para essa faixa da população, que por sinal é
majoritária. Que a nossa "Belíndia", pelo menos a médio prazo, possa
se transformar apenas numa próspera Bélgica.
(Artigo
publicado no Correio Popular, em 30 de novembro de 1994).
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