Culpa deve ser repartida
Pedro J. Bondaczuk
A natureza foi severamente
agredida no Golfo Pérsico com o derramamento de petróleo em suas águas e como
impera a censura ao noticiário, por decisão das duas partes em guerra, é
impossível de se saber objetivamente, sem que paire nenhuma dúvida, quem foi o
autor desse estúpido ato, que se somou à própria estupidez do conflito.
Até
uma criança, cujo tirocínio ainda não seja suficiente para tirar determinadas
conclusões, sabe que guerrear numa região como essa é a loucura das loucuras.
No correr de toda a crise, iniciada com a invasão iraquiana ao Kuwait, em
agosto de 1990, especialistas de todas as partes, da maior competência
possível, alertaram para o fato.
Todavia,
a época era a de ouvir os piromaníacos e não os bombeiros. A cada argumento
apresentado pelos pacifistas, no sentido da obtenção de uma solução negociada
para o problema, os defensores da guerra contrargumentavam com dois, três ou
dez motivos para o recurso às armas. Pois bem, o Golfo está em guerra.
Ocorre
que a natureza tem suas próprias leis, que nada têm a ver com a vontade, a
ambição ou a insensatez dos homens. A cada agressão que ela sofre, responde com
um determinado efeito. E este, poder humano algum tem condições de controlar.
No
futuro, quando catástrofes climáticas estiverem se verificando, não haverá
nenhuma relevância em saber se o derramamento de petróleo no Golfo Pérsico foi
culpa de Saddam Hussein ou de George Bush. Aliás, ambos são culpados, por sua
intransigência, com o contundente respaldo das Nações Unidas, cujo sistema de
votos no Conselho de Segurança é a antítese da democracia.
Somente
cinco países – embora com populações somadas representando um terço dos
habitantes do Planeta – têm poder de fato para resolver qualquer coisa, para o
bem ou para o mal. Se Estados Unidos, União Soviética, Grã-Bretanha, França e
China decidem travar uma guerra, em nome da ONU, mesmo que os demais 165 membros da organização não queiram arcar
com as conseqüências, não há quem consiga impedir.
Ora,
como democracia implica na preponderância das opiniões da “maioria”, as regras
do Conselho de Segurança são o protótipo do que há de mais antidemocrático que
se conheça.
Já
há setores mais radicais, norte-americanos e iraquianos, insinuando sobre o uso
de armas não convencionais, no atual conflito. No caso, subentende-se que estas
seriam as de caráter nuclear. Isto, porém, já é levar a loucura longe demais.
Se
esses grupos pretendem cometer suicídio, que o façam, mas não induzam a
humanidade ao desastre. Numa guerra, por si só a antítese da racionalidade,
tudo é possível. É preciso, portanto, que se detenha o mais rápido possível
essa escalada de irresponsabilidade. Pois como Gabriel Garcia Marquez lembrou,
em 1986, na reunião do Grupo dos Seis (países que se opõem à existência de
armamentos atômicos) na Cidade do México: “O monstro nuclear dorme com um olho
e vela com o outro”. E este outro é que se torna o grande problema, neste
momento particularmente dramático deste século.
(Artigo
publicado na página 15, A Guerra do Golfo, do Correio Popular, em 29 de janeiro
de 1991).
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