Terrorismo de Estado
Pedro J. Bondaczuk
Os
seqüestros de aviões, que começaram a acontecer a partir de 1960, quando era
rotina jovens aventureiros (especialmente nos EUA) desviarem aviões para
Havana, haviam diminuído de uns três anos para cá. Entretanto, em 1984 esse
tipo de pirataria dos tempos modernos teve um dramático recrudescimento,
especialmente no segundo semestre, e o novo pólo de atração passou a ser Teerã.
Até
mesmo nós, brasileiros, tivemos neste ano um incidente dessa natureza, quando a
4 de fevereiro, o bancário cearense, Fernando Santiago, seqüestrou um
Airbus-300 da Varig, com 158 passageiros a bordo (libertados, posteriormente,
numa escala feita em Paramaribo, no Suriname), desviando-o para Cuba.
Em
todos os casos, entretanto, os respectivos governos onde os aparelhos
seqüestrados pousavam, mostravam grande empenho para coibir essa prática
delituosa e prender seus autores. Não foi assim, porém, que o regime iraniano
agiu no incidente do dia 4 passado, com o avião Airbus A-300 da empresa estatal
do Kuwait. Denúncias feitas por quase todos os reféns, tanto os que estão no
Paquistão, quanto os que retornaram à
capital kuwaitiana, comprometem seriamente as autoridades do Irã.
O
xeque paquistanês, Abdul Hafiz, por exemplo, garante que quando os
seqüestradores entraram no aparelho, no aeroporto de Dubai, nos Emirados Árabes
Unidos, portavam apenas uma pequena pistola prateada e uma granada de porte
reduzido.
Entretanto,
em Teerã, os piratas aéreos valeram-se de um grande "arsenal" de
torturas, tirado não se sabe de onde, composto, entre outras coisas, de cordas
de nylon e grossas algemas de ferro com que manietaram os reféns, antes das
várias sessões de selvageria que promoveram, espancando e queimando com pontas
de cigarro acesas suas indefesas vítimas.
Os
dois reféns funcionários da Agência Internacional de Desenvolvimento, do
escritório da entidade no Paquistão, os norte-americanos Charles Hegna e
William Stanford, foram friamente executados com tiros de um revólver calibre
38. Isto é, com uma arma de grande porte, impossível de ser escondida na
revista que se faz nos passageiros nos aeroportos.
Se
os seqüestradores levassem consigo as cordas, algemas e armas, quando
embarcaram em Dubai, seria extremamente improvável que não chamassem a atenção
das autoridades dos Emirados Árabes Unidos.
Portanto,
são verossímeis as acusações dos reféns, de que agentes iranianos teriam
fornecido todo esse instrumental para os terroristas. Caso tais denúncias se
confirmem, virão, apenas, demonstrar a irresponsabilidade de conduta de pessoas
que deveriam, na verdade, manter a ordem. Proteger a vida de cidadãos que
ficaram sob sua responsabilidade, a partir do instante em que foi permitido o
pouso do aparelho seqüestrado num aeroporto de seu território.
Atitudes
irresponsáveis como esta, ainda que não sejam aprovadas pelo governo do Irã,
comprometem a imagem (já bastante desgastada) do regime iraniano no Exterior.
Equivalem a cumplicidade no ato de seqüestro. Mais do que isso, até podem ser
caracterizadas como co-autoria, abrindo perigosos precedentes nas ações do
terror, em que um Estado signatário de vários acordos e compromissos
internacionais, consciente das responsabilidades que possui, não apenas faz
vistas grossas a um grave delito, como dele ainda toma parte diretamente. A
longo prazo, essa atitude pode servir como um autêntico
"boomerangue", vindo a atingir, fatalmente, o próprio Irã na sua
credibilidade externa.
(Artigo
publicado na página 10, Internacional, do Correio Popular, em 12 de dezembro de
1984)
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