Rajiv consolida o poder
O primeiro-ministro
indiano, Rajiv Gandhi, de quem se dizia, na época em que assumiu a chefia do
gabinete na Índia, há cinco meses, que não tinha gosto pela política, vem se
revelando um exímio estadista e homem de partido.
Nas
eleições parlamentares de dezembro passado, quando obteve a maior vitória
eleitoral em seu país, sua performance foi atribuída, pelo menos em parte, ao
fator sentimental, já que na ocasião fazia apenas dois meses que sua mãe fora
assassinada.
Mas
o sucesso nos atuais pleitos estaduais deve-se, sem dúvida, exclusivamente à
eficiência de sua condução do Partido do Congresso, hoje o maior do mundo em
número de membros e, principalmente, de eleitores.
Quando
Rajiv assumiu o governo da Índia, na tarde de 31 de outubro do ano passado,
menos de quatro horas após o assassinato de Indira Gandhi, o país estava
convulsionado. Massacres indescritíveis registravam-se nas principais cidades,
tendo por vítimas os seguidores da seita “sikh”, e a situação parecia, aos
observadores locais e aos que estavam à distância, estar fugindo ao controle
das autoridades.
Atrocidades
de uma selvajaria brutal instituíam a baderna e o medo na Índia, causando
prejuízos quase irrecuperáveis, num país sabidamente pobre.
Rajiv,
entretanto, desmentindo sua auto avaliação, segundo a qual não levava jeito
para questões administrativas, em menos de 48 horas retomou as rédeas da
situação. Puniu severamente os chefes de polícia que fizeram vistas grossas à
agressão sofrida pelos “sikhs”. E, em menos de duas semanas após as trágicas
ocorrências posteriores ao assassinato de sua mãe, indenizou a comunidade
agredida pelos prejuízos que ela sofreu e garantiu sua reintegração na vida
indiana, prometendo castigos muito duros a quem a hostilizasse outra vez.
Agora,
passados cinco meses da sua subida ao poder, o apoio a Rajiv, na Índia, é quase
completo. Impressiona nele, não apenas a energia de quem sabe o que faz, mas
sobretudo a moderação com que age. Assim foi no lamentável incidente de Bhopal,
quando 2.500 indianos perderam a vida e mais de 50 mil sofrem, até hoje, os
efeitos terríveis provocados pelo isocianato de metila, que vazou da fábrica da
Union Carbide naquela cidade.
O
primeiro-ministro buscou os caminhos civilizados dos tribunais para resolver a
questão das indenizações pelos danos materiais e em vidas provocado pela
empresa. Moderado, e sobretudo imparcial, revelou ser, também, no incidente da
espionagem que vinha sendo feita (há anos) no gabinete da sua mãe. Sem muito estardalhaço,
pediu, apenas, que os diplomatas envolvidos, tanto o francês, quanto os
poloneses e checos, deixassem, incontinenti, o país.
Para
completar um elenco de medidas de grande sabedoria política e até de prudência,
demonstrando que, sobretudo aos estadistas, não cabe guardar inúteis rancores e
estéril espírito de vingança, abriu um recrutamento maciço aos “sikhs” (a seita
responsável pela morte de sua própria mãe) no Exército indiano, reconhecendo o
valor e o extraordinário espírito de disciplina de seus integrantes.
Muita
gente não entende como a Índia, com a multiplicidade de raças, línguas e
religiões e com o elenco de problemas que tem, consegue se manter coesa e
sobreviver. O segredo, certamente, não vem dos antigos “Vedas”, nem dos grandes
mestres hinduístas.
Vem
da saudável prática democrática de bem administrar os conflitos de sua
sociedade, extraindo deles a energia para a sua sobrevivência, ao invés de
extinguí-los, como fazem os regimes ditatoriais. Neste aspecto, a Índia, desde
a sua independência, segue dando preciosas lições aos demais países da
comunidade internacional.
(Artigo
publicado na página 11, Internacional, do Correio Popular, em 6 de março de
1985).
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