Do círculo vicioso ao
virtuoso
Pedro J. Bondaczuk
As
elevadas taxas de inflação de janeiro em pelo menos quatro dos muitos índices
que circulam por aí (IPC da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas da USP,
IGP da Fundação Getúlio Vargas, INPC do IBGE e ICV do Dieese), mostram que o
País continua naquele mesmo círculo-vicioso que sempre caracterizou sua
economia.
Se
tecnicamente ainda não mergulhou numa hiperinflação, percentuais superiores a
25% como os registrados no mês passado caracterizam, pelo menos, uma
"super". É claro que os problemas nacionais não se restringem ao
aspecto inflacionário. Sua questão mais grave é o crescimento da miséria, com
todas as seqüelas que isto traz.
O
agravamento da crise enfatiza que o caminho tomado desde a independência está
equivocado. As soluções requeridas nunca foram encontradas e estão aí os
arquivos de jornais para provar.
Inflação,
carestia, custo de vida são expressões que em momento algum, nem mesmo nos
períodos de ditaduras quando a imprensa era censurada, deixaram de freqüentar
as manchetes. O professor e deputado José Serra, num artigo publicado pela
revista "Imprensa" em novembro de 1991, destacou: Ficarmos livres da
superinflação não resolverá todos os problemas econômico-sociais do Brasil.
Permitirá, isto sim, que possamos começar a resolver esses problemas, que são
difíceis e que não serão resolvidos da noite para o dia. É fundamental,
crucial, compreendermos que quanto mais depressa a inflação alta for embora,
mais rapidamente um círculo virtuoso de desenvolvimento poderá substituir o
círculo vicioso da regressão econômica".
Todavia,
não é a "doença" que causa controvérsia a sociedade, mas a
"terapia" para debelar o mal. O que parece cada vez mais claro é que
os tratamentos estão pecando pela falta de continuidade. Desde 1979, por
exemplo, como ressaltou Serra, "nove políticas de estabilização ---
heterodoxas, ortodoxas, heteroortodoxas, orteheterodoxas --- fracassaram (...)
cada uma tornando a próxima mais difícil, ousada e custosa".
Nestes
13 anos, os brasileiros já tiveram que conviver com 20 alterações nas regras
referentes a salários, apenas para citar um exemplo mais próximo da realidade
de cada um.
Essa
persistência em andar no círculo vicioso vem desenvolvendo uma seqüela que é a
mais perigosa de todas: a cultura do "derrotismo". Os brasileiros
saíram da euforia ufanística dos anos 70, dos slogans bombásticos do tipo
"Ame-o ou deixe-o", para um desalento assustador, que raia as
fronteiras da catatonia.
O
cronista Antonio Torres, na crônica "Chega de Fracasso", publicada no
caderno "Idéias" (suplemento do "Jornal do Brasil"), em 11
de agosto de 1991, detectou muito bem tal comportamento. Observou: "Essa
'cultura' do fracasso é uma urdidura que vem de cima, de forma insidiosa, com
propósitos escusos, bem planejados. Desconfiemos disso. Ou melhor: é preciso, permanentemente, reagirmos
contra isso. Ao sucesso".
Será
que a sociedade ainda não entendeu que as pessoas e grupos a quem delegou a
tarefa de debelar a crise fracassaram? Não seria hora, portanto, de cada um,
lançando mão de sua criatividade --- e o brasileiro a tem de sobra --- fazer a
sua parte para, na soma das parcelas o País conseguir um todo mais promissor?
O
retrospecto dos quase 103 anos de República demonstra claramente que não será
nenhum governo que conseguirá romper o círculo vicioso do retrocesso e reverter
para o círculo virtuoso do desenvolvimento. Esta deve ser a missão de vida de
cada brasileiro, não importa de que maneira.
(Artigo
publicado na página 3, Opinião, do Correio Popular, em 16 de fevereiro de
1992).
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
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