Jornalistas condenam censura
Pedro J. Bondaczuk
À medida em que a guerra do
Golfo Pérsico se aproxima do primeiro mês do seu início, cresce a revolta entre
os jornalistas, especialmente os mais veteranos, com a censura imposta ao
noticiário pelos dois lados. As informações resumem-se a boletins oficiais, em
tons triunfalistas, quase de delírio megalomaníaco, mostrando para a opinião
pública não uma sucessão de batalhas, com todos os horrores que acompanham esse
tipo de confronto, mas algo assemelhado a um simples jogo de vídeogame.
Esse
procedimento é, sobretudo, perigoso, já que impede que os excessos cometidos
sejam reduzidos, como os indiscriminados ataques que vêm sendo feitos contra
objetivos civis no Iraque, especialmente em Bagdá.
Os
poucos repórteres que permanecem em território iraquiano têm dado conta de uma
realidade muito diferente daquela que os defensores de uma suposta guerra de
“alta tecnologia” procuram pintar. Os “bombardeios cirúrgicos” ocidentais não
passam de propaganda para ingênuos.
Fotos
procedentes desse país mostram aldeias em ruínas, sítios históricos arrasados,
hospitais em escombros e outras atrocidades mais, cometidas em nome da
humanidade. Os aviões aliados, por exemplo, puseram no chão, a pretexto de
estarem atacando uma fábrica de armas biológicas, a única usina processadora de
leite do Iraque.
Condenaram,
portanto, inúmeras crianças à fome. As autoridades de Bagdá, inclusive,
solicitaram às Nações Unidas que enviem um grupo investigador para testemunhar
que o complexo destruído não tinha qualquer caráter militar.
Se
a presente guerra está sendo movida pelas razões que a aliança multinacional
alega, ou seja, corrigir uma injustiça representada pela invasão de um país
mais forte a outro mais fraco, e se o uso da força está nos limites da
prudência, não há porque sonegar informações a respeito.
Até
porque, os jornalistas veteranos, que cobriram outros acontecimentos com
dramaticidade parecida, já estão vacinados contra os boletins oficiais
divulgados pelos comandantes militares dos dois lados. Ocorre que os cidadãos,
que financiam o esforço bélico com seus impostos, têm o direito de saber como
se está agindo em seu nome.
Estranha-se,
sobretudo, a passividade das Nações Unidas ao longo do conflito, travado sob
seu patrocínio. A resolução do Conselho de Segurança, que previa a expulsão
iraquiana do Kuwait, embora propositalmente redigida em termos dúbios que
permitem múltiplas interpretações, em lugar algum autorizou os aliados a
destruírem o Iraque, especialmente a sua população civil.
O
povo iraquiano, neste episódio, está sendo vítima, portanto, duplamente: da
ambição megalomaníaca de seu ditador, Saddam Hussein e do destempero dos que se
arrogam o papel de justiceiros, mas que vêm agindo como carniceiros.
(Artigo
publicado na página 17, “A Guerra no Golfo”, do Correio Popular, em 10 de
fevereiro de 1991).
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
No comments:
Post a Comment