Wednesday, January 21, 2015

Jornalistas condenam censura


Pedro J. Bondaczuk


À medida em que a guerra do Golfo Pérsico se aproxima do primeiro mês do seu início, cresce a revolta entre os jornalistas, especialmente os mais veteranos, com a censura imposta ao noticiário pelos dois lados. As informações resumem-se a boletins oficiais, em tons triunfalistas, quase de delírio megalomaníaco, mostrando para a opinião pública não uma sucessão de batalhas, com todos os horrores que acompanham esse tipo de confronto, mas algo assemelhado a um simples jogo de vídeogame.

Esse procedimento é, sobretudo, perigoso, já que impede que os excessos cometidos sejam reduzidos, como os indiscriminados ataques que vêm sendo feitos contra objetivos civis no Iraque, especialmente em Bagdá.

Os poucos repórteres que permanecem em território iraquiano têm dado conta de uma realidade muito diferente daquela que os defensores de uma suposta guerra de “alta tecnologia” procuram pintar. Os “bombardeios cirúrgicos” ocidentais não passam de propaganda para ingênuos.

Fotos procedentes desse país mostram aldeias em ruínas, sítios históricos arrasados, hospitais em escombros e outras atrocidades mais, cometidas em nome da humanidade. Os aviões aliados, por exemplo, puseram no chão, a pretexto de estarem atacando uma fábrica de armas biológicas, a única usina processadora de leite do Iraque.

Condenaram, portanto, inúmeras crianças à fome. As autoridades de Bagdá, inclusive, solicitaram às Nações Unidas que enviem um grupo investigador para testemunhar que o complexo destruído não tinha qualquer caráter militar.

Se a presente guerra está sendo movida pelas razões que a aliança multinacional alega, ou seja, corrigir uma injustiça representada pela invasão de um país mais forte a outro mais fraco, e se o uso da força está nos limites da prudência, não há porque sonegar informações a respeito.

Até porque, os jornalistas veteranos, que cobriram outros acontecimentos com dramaticidade parecida, já estão vacinados contra os boletins oficiais divulgados pelos comandantes militares dos dois lados. Ocorre que os cidadãos, que financiam o esforço bélico com seus impostos, têm o direito de saber como se está agindo em seu nome.

Estranha-se, sobretudo, a passividade das Nações Unidas ao longo do conflito, travado sob seu patrocínio. A resolução do Conselho de Segurança, que previa a expulsão iraquiana do Kuwait, embora propositalmente redigida em termos dúbios que permitem múltiplas interpretações, em lugar algum autorizou os aliados a destruírem o Iraque, especialmente a sua população civil.

O povo iraquiano, neste episódio, está sendo vítima, portanto, duplamente: da ambição megalomaníaca de seu ditador, Saddam Hussein e do destempero dos que se arrogam o papel de justiceiros, mas que vêm agindo como carniceiros.

(Artigo publicado na página 17, “A Guerra no Golfo”, do Correio Popular, em 10 de fevereiro de 1991).


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