Tuesday, January 20, 2015

Da pax romana à pax nuclear



Pedro J. Bondaczuk


Pela primeira vez desde a criação do Tribunal Internacional de Justiça de Haia, uma superpotência foi levada ao banco dos réus por interferir, de alguma forma, nos assuntos internos de outro Estado. E o queixoso foi um país espezinhado do Terceiro Mundo, cujos povos são tratados, ostensivamente, como sendo de uma sub-raça, numa odiosa discriminação manifestada, quase sempre, por insuportáveis pressões econômicas.

O réu, que acabou condenado por unanimidade, é, nada mais, nada menos, que a potência mais poderosa do Planeta. O queixoso? É um dos países mais pobres e atrasados, que se debate, após décadas de uma ditadura (imposta, financiada e mantida pelos EUA), para se organizar política e economicamente: a Nicarágua.

Perguntariam os senhores: “qual o efeito prático dessa condenação?” Certamente, nenhum! Mas os saldos políticos serão grandes e os pequenos países agredidos impunemente pelas superpotências (como o Afeganistão ocupado, a Checoslováquia , idem e tanto outros) têm, agora, um novo caminho a seguir.

A decisão do Tribunal coloca às claras aquilo que todos já sabem de há muito, mas que poucos tinham a coragem de trazer à luz. Ou seja, as seguidas interferências dos Estados poderosos nos assuntos internos dos pequenos países, transformando a palavra soberania em mera ficção.

Está claríssima a bipolarização ideológica. Se alguma sociedade, hoje em dia, consegue escapar da interferência norte-americana, cai nas garras soviéticas, e vice-versa. Dessa maneira, os países são usados como se fossem meras peças de xadrez, em uma mortal partida disputada pelos EUA e pela União Soviética, em busca de uma suprema hegemonia.

Embora se negue, a grande verdade é uma só. Existem, rigorosamente, apenas dois países independentes, de fato, em todo o Planeta. Os demais, de uma forma ou de outra, não passam de meras colônias, de meros vassalos, com a perpétua obrigação de render tributos a quem detém o poder. É a pax romana em nova versão: pax nuclear!  

(Artigo publicado na página 10, Internacional, do Correio Popular, em 11 de maio de 1984)


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